Olhar de fora para dentro



No final do último Conselho Geral da Fundação Cidade de Guimarães, um jornalista perguntou-me quem eram os vencedores do processo que parecia fechar-se naquele dia, com a saída de cena da até então Presidente da Fundação. Percebi que o que respondi não correspondeu ao que seria esperado: não há vencedores, saímos todos derrotados. O saldo não era o resultado daquela reunião, mas sim o acumulado de dois anos perdidos numa floresta de enganos.


O processo de construção da Capital Europeia da Cultura tem sido de tal modo conturbado e desgastante, que foi acumulando desencanto e desânimo naqueles que, genuinamente, acreditavam que a distinção que Guimarães recebeu serviria para projectar uma imagem ainda mais positiva da cidade. Não foi isso que aconteceu até agora, antes pelo contrário, apesar do New York Times. Guimarães passou a ter o que não tinha antes: má imprensa e má imagem, por exclusiva responsabilidade de quem tomou o encargo de preparar 2012, mas ignorou a realidade da cidade, dos seus cidadãos e das suas instituições. Esperava-se, de quem chegava para dirigir o processo, que fizesse melhor do que aquilo a que estávamos habituados. Seria difícil fazer pior do que aquilo que se fez. E não se caia na ilusão de acreditar que a saída da anterior Presidente da Fundação Cidade de Guimarães seria a solução para todos os males que  corroem o processo de construção da CEC. Os problemas persistem. O tempo, esse, não pára.

Hoje, longe de Guimarães, ao ler as notícias, dou-me conta de que vai fazendo caminho a ideia de que o que aconteceu nas últimas duas semanas seria o resultado de intriga palaciana – a que nem sequer falta o palácio – conjugada com um enredo de disputa política que aponta, não para 2012, mas sim para as eleições autárquicas de 2013. Acredito e sei que não foi assim. Aquilo a que se chegou resultou da evidência da necessidade de pôr termo a um profundo mal-estar que se tornou insustentável, resultante da manifesta inadequação do Conselho de Administração da FCG, e da estrutura que montou, para o desempenho da missão exigente que lhe estava atribuída. Vai sendo tempo de mudar o estado de coisas, o que também terá que passar por uma estratégia de comunicação capaz de se sobrepor à especulação, sob pena de não se ver o fim da instabilidade que tem dispersado a atenção, impedindo a mobilização de energias para o essencial: fazer com que 2012 tenha a grandeza que se exige.

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6 Comentários

Anónimo disse…
"Guimarães passou a ter o que não tinha antes: má imprensa e má imagem, por exclusiva responsabilidade de quem tomou o encargo de preparar 2012": Câmara Municipal incluída, porque escolheu as pessoas e as defendeu até bem para além do razoável e admissível.
Cidadão com dúvidas disse…
Caro Amaro,
parabéns pelo post.
Do passado, todos conhecemos os culpados. Destes e até ao momento, apenas saiu um, a Presidente do CA. Os protagonistas que hoje e amanhã se apresentarão como lideres deste processo, não estão isentos de culpas no que se passou, mas têm nas mãos a possibilidade de transformarem a imagem que actualmente existe da CEC, através de uma dinâmica que concretize as ideias, frases e palavras que ao longo do último ano e meio foram sendo escritas e apresentadas. E, se assim for, contarão com todo o nosso apoio. Apesar de discordar da escolha para a sucessão, entendo que se deve dar espaço e tempo para que as pessoas demonstrem das suas capacidades e competências para os lugares que são escolhidas.

Um último reparo. O artigo do NYT é de facto elogioso para Guimarães e para a cidade, mas parece-me redutor e com pouca investigação. É fruto de uma estadia de poucos dias em Guimarães e resultado de visitas guiadas nem sempre efectuadas por vimaranenses. Em 30 segundos podemos nomear 10 óptimos restaurantes, dentro da zona urbana. Não há menções aos Museus, às pastelarias, às cervejarias além da Martins, ao facto de termos na cidade uma das Galerias de arte mais antigas do país, à Penha e ao Teleférico.

Nem sempre a realidade acontece segundo as nossas expectativas. No entanto, concordo que este tipo de reportagens são o que melhor poderia acontecer para a projecção de Guimarães.
Cidadão (ainda) perplexo disse…
Caro Amaro das Neves,

Li declarações suas ao Guimarães Digital em que dizia que João Serra poderia ser uma boa escolha para assumir o cargo de Presidente da Fundação Cidade de Guimarães. De facto, o homem sempre chegou a Presidente, mas não concordo consigo: João Serra não é uma boa escolha. Explicarei porquê, esperando que tenha paciência para me ler.
João Serra aterrou de pára-quedas em Guimarães, juntamente com os outros membros do Conselho de Administração (excepto a vereadora da Cultura, que já por cá andava). O que o recomendava especialmente para aquele cargo? Que eu saiba, absolutamente nada, excepto ser um dos homens de Jorge Sampaio. Tem currículo na área da Cultura, ao contrário daqueles que o acompanhavam no CA (esses, a cultura deles era a cultura da especulação bolsista), mas nada de particularmente notável. Já no campo da programação cultural, as suas competências demonstradas são pouco mais do que nenhumas.
Esteve quase dois anos no CA com Cristina Azevedo e Carla Morais. Que se saiba, porque nunca se soube o contrário, foi parte nas decisões daquele órgão. Nunca se lhe conheceram, publicamente, palavras dissonantes em relação às decisões do CA, algumas delas controversas e discutíveis. Alguém sabe, por exemplo, qual foi a sua posição relativamente à investidura de Bernardina Ribeiro nas funções de Directora de Comunicação da FCG, para as quais não tinha, como demonstrou rapidamente, as competências mínimas exigíveis? Alguém sabe, por exemplo, qual foi a posição que assumiu aquando da estranhíssima adjudicação a uma associação de estudantes do Porto do concerto de Bobby McFerrin? Eu não sei, mas gostava de saber. Mas sei que foi João Serra quem apareceu publicamente a defender a FCG, aquando das sucessivas controvérsias que foram ocorrendo.
Como “programador” do “cluster” do pensamento, João Serra foi um desastre completo, como o Amaro sabe. Eu não comungo de certo unanimismo quanto às supostas virtudes do que tem sido programado para 2012. Tenho, aliás, muitas reservas em relação à acção de vários programadores, mas nenhuma das áreas de programação se aproxima do nível de indigência da que tem estado a cargo de João Serra, que não tem uma linha mínima de coerência. É tudo desgarrado e de uma displicência insuportável. A área do pensamento não foi pensada. Para quem chegou a embandeirar com a figura de Vargas Llosa como programador, é desconcertante que o ”escritor” escolhido para fazer uma “residência artística” em Guimarães seja o “marqueteiro” que foi responsável pela campanha do Guterres. Edson Athaide? Valha-nos Santa Engrácia.
Se João Serra não soube programar, também não deixa uma grande imagem no que toca à escolha de quem com ele trabalha. Sabia o Amaro que João Serra tem um assistente para a programação do Pensamento que ninguém percebe o que anda a fazer. Pelo que ganha, deveria trabalhar a tempo inteiro, mas lá por Vila Flor não é fácil pôr-lhe os olhos em cima. E circula de boca em boca a solução que encontrou para não criar nem defraudar expectativas a quem apresentou propostas de iniciativas para 2012: simplesmente, não responder aos interessados.
João Serra não serve para programar, não serve para escolher as pessoas que deveriam trabalhar com ele. Quem é que se convenceu de que servia para presidir a uma Fundação?
Aquilo que o homem faz bem, são jogos de bastidores. Foi ganhando aliados, confidenciando-lhe as suas diferenças em relação a quem de facto mandava na FCG, mas sempre por baixo da mesa. Mas nunca teve a frontalidade para assumir publicamente as discordâncias que ia revelando em privado. Não se percebia bem qual seria a sua intenção. Se tinha divergências tão insanáveis como as que segredava, o que se poderia esperar era que batesse com a porta, Agora, julgo que já percebi qual era o seu objectivo. Já o atingiu.
Não estou nada convencido de que tivéssemos ficado a ganhar com a dança de presidentes na FCG.
Cidadão (ainda) perplexo disse…
Caro Amaro das Neves,

Li declarações suas ao Guimarães Digital em que dizia que João Serra poderia ser uma boa escolha para assumir o cargo de Presidente da Fundação Cidade de Guimarães. De facto, o homem sempre chegou a Presidente, mas não concordo consigo: João Serra não é uma boa escolha. Explicarei porquê, esperando que tenha paciência para me ler.
João Serra aterrou de pára-quedas em Guimarães, juntamente com os outros membros do Conselho de Administração (excepto a vereadora da Cultura, que já por cá andava). O que o recomendava especialmente para aquele cargo? Que eu saiba, absolutamente nada, excepto ser um dos homens de Jorge Sampaio. Tem currículo na área da Cultura, ao contrário daqueles que o acompanhavam no CA (esses, a cultura deles era a cultura da especulação bolsista), mas nada de particularmente notável. Já no campo da programação cultural, as suas competências demonstradas são pouco mais do que nenhumas.
Esteve quase dois anos no CA com Cristina Azevedo e Carla Morais. Que se saiba, porque nunca se soube o contrário, foi parte nas decisões daquele órgão. Nunca se lhe conheceram, publicamente, palavras dissonantes em relação às decisões do CA, algumas delas controversas e discutíveis. Alguém sabe, por exemplo, qual foi a sua posição relativamente à investidura de Bernardina Ribeiro nas funções de Directora de Comunicação da FCG, para as quais não tinha, como demonstrou rapidamente, as competências mínimas exigíveis? Alguém sabe, por exemplo, qual foi a posição que assumiu aquando da estranhíssima adjudicação a uma associação de estudantes do Porto do concerto de Bobby McFerrin? Eu não sei, mas gostava de saber. Mas sei que foi João Serra quem apareceu publicamente a defender a FCG, aquando das sucessivas controvérsias que foram ocorrendo.
Como “programador” do “cluster” do pensamento, João Serra foi um desastre completo, como o Amaro sabe. Eu não comungo de certo unanimismo quanto às supostas virtudes do que tem sido programado para 2012. Tenho, aliás, muitas reservas em relação à acção de vários programadores, mas nenhuma das áreas de programação se aproxima do nível de indigência da que tem estado a cargo de João Serra, que não tem uma linha mínima de coerência. É tudo desgarrado e de uma displicência insuportável. A área do pensamento não foi pensada. Para quem chegou a embandeirar com a figura de Vargas Llosa como programador, é desconcertante que o ”escritor” escolhido para fazer uma “residência artística” em Guimarães seja o “marqueteiro” que foi responsável pela campanha do Guterres. Edson Athaide? Valha-nos Santa Engrácia.
Se João Serra não soube programar, também não deixa uma grande imagem no que toca à escolha de quem com ele trabalha. Sabia o Amaro que João Serra tem um assistente para a programação do Pensamento que ninguém percebe o que anda a fazer. Pelo que ganha, deveria trabalhar a tempo inteiro, mas lá por Vila Flor não é fácil pôr-lhe os olhos em cima. E circula de boca em boca a solução que encontrou para não criar nem defraudar expectativas a quem apresentou propostas de iniciativas para 2012: simplesmente, não responder aos interessados.
João Serra não serve para programar, não serve para escolher as pessoas que deveriam trabalhar com ele. Quem é que se convenceu de que servia para presidir a uma Fundação?
Aquilo que o homem faz bem, são jogos de bastidores. Foi ganhando aliados, confidenciando-lhe as suas diferenças em relação a quem de facto mandava na FCG, mas sempre por baixo da mesa. Mas nunca teve a frontalidade para assumir publicamente as discordâncias que ia revelando em privado. Não se percebia bem qual seria a sua intenção. Se tinha divergências tão insanáveis como as que segredava, o que se poderia esperar era que batesse com a porta, Agora, julgo que já percebi qual era o seu objectivo. Já o atingiu.
Não estou nada convencido de que tivéssemos ficado a ganhar com a dança de presidentes na FCG.
Ao Cidadão com Dúvidas,

Os que agora lideram o processo "têm nas mãos a possibilidade de transformarem a imagem que actualmente existe da CEC, através de uma dinâmica que concretize as ideias, frases e palavras que ao longo do último ano e meio foram sendo escritas e apresentadas" - não podia estar mais de acordo.


Ao Cidadão (ainda) perplexo,

Acredite que o que agora menos me importa é discutir o que se passou para se chegar onde se chegou (dizer isto não é o mesmo que dizer que devemos ignorar o passado - bem pelo contrário, o passado serve como lição para que não se reincida nos mesmos erros). O que agora faz falta é recuperar a auto-estima e o entusiasmo, olhar em frente e acreditar que ainda é possível (só pode ser possível!)construir-se um 2012 que não nos desiluda. Tudo o mais é, hoje por hoje, irrelevante.

Como eu já disse repetidas vezes, as contas não se fazem agora, fazem-se no fim.
Cidadão com dúvidas disse…
Caro Amaro,
é um privilégio perceber que partilhamos do mesmo conjunto de expectativas.
Obrigado e um abraço