Da água e dos seus usos (2)



Fotografia de Eduardo Brito

No passado, as necessidades de água eram consideravelmente menores do que nos nossos dias. A água era usada para cozinhar, para lavar, para regar, mas, antes de qualquer outro uso, servia para beber. Todavia, não parecia ser a bebida favorita das gentes do Minho. No passado, a dieta básica da população minhota compunha-se de pão, caldo, papas de farinha, pescado seco, pouca carne e muito vinho, que nunca faltava e era o produto mais barato que se podia encontrar no mercado local (um litro de vinho custava, no século XVII, menos de metade de um quilo de broa e dez vezes menos do que um litro de azeite). Estas eram terras de grande abundância de vinho. Em 1620, intramuros, contavam-se sessenta tabernas (uma taberna por cada 100 habitantes da Vila e dos seus arrabaldes).

O pároco de S. João das Caldas de Vizela deixou, nas Memórias Paroquiais de 1758, um testemunho expressivo da secundarização da água. Dizia ele que, na sua freguesia, se encontram "copiosas perenes fontes de cristalinas saborosas águas, de que se utilizam os seus moradores, assim para a fecundidade dos campos como para refrigério dos corpos no tempo do calor, se bem que pela maior parte as apeteçam mais para o primeiro do que para o segundo ministério, por conta do continuado uso que dão ao vinho que aqui tem um grande consumo".

Na higiene corporal também não se gastava muita água. A partir do final da Idade Média, o banho quase que desaparece dos hábitos dos europeus. Acreditava-se que a água do banho, em especial quando aquecida, abria os poros por onde entravam as doenças. Uma boa camada de sujidade sobre o corpo funcionaria como barreira protectora contra as doenças. A higiene deu lugar ao asseio. Importava trazer limpo aquilo que se mostrava: o rosto, as mãos, a roupa. Os europeus da Idade Moderna tinham medo da água. Em vez da imersão ou da água lançada directamente sobre o corpo, inventou-se uma espécie de limpeza a seco, que se praticava esfregando a pele com panos. A higiene pessoal, ou a sua ausência, foi transferida para a roupa que se envergava. Andar limpo era sinónimo de vestir uma camisa limpa, mesmo que fosse por cima de um corpo recoberto por crostas de sujidade. Era isso o asseio.

A partir de: Mãe-d'água: centenário do abastecimento público de Guimarães, ed. Vimágua/Sociedade Martins Sarmento, 2007.

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