D. Afonso Henriques nasceu em Viseu? (2)

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Da distracção da maioria se faz a profundeza de alguns.
(Vergílio Ferreira, Conta Corrente IV)

A propósito da tese de Almeida Fernandes, segundo a qual D. Afonso Henriques terá nascido em Viseu, lançada, sem grande impacto, em 1990, têm sido produzidas diversas apreciações em tempos recentes, desde que José Mattoso lhe deu alguma visibilidade, quando, na sua biografia de Afonso Henriques considerou aquela hipótese admissível (embora negando-lhe a indubitabilidade pretendida por Almeida Fernandes). Eis algumas opiniões, pescadas aqui:

“A demonstração feita por Almeida Fernandes alcança verosimilhança suficiente par se admitir como possível, ou mesmo a mais provável. É de facto admissível, com base nos documentos por ele invocados, que D. Afonso Henriques tivesse nascido em Viseu por meados do mês de Agosto de 1109”.
Professor Doutor José Mattoso, Professor Catedrático Jubilado da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade de Lisboa in “D. Afonso Henriques”, Círculo de Leitores, 2006.

“Com base em informações indirectas, sobre o paradeiro dos pais do monarca, creio que a hipótese de Viseu é a mais provável”.
Professor Doutor Bernardo Vasconcellos e Sousa, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade de Lisboa in Público, Ano XVII, nº 6184, 5 de Março de 2007.

“A doutrina encontrou silêncios, mais sintomáticos em quem pedira o estudo; mas não suscitou polémica à altura, muito menos capaz de a infirmar, por um argumento que fosse. Passado o tempo, verifica-se que, ao contrário, a hipótese colheu ecos, favoráveis”.
Professora Doutora Maria Alegria Fernandes Marques, Professora da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra in Prefácio, “Viseu, Agosto de 1109, nasce D. Afonso Henriques”, Fundação Mariana Seixas, Abril de 2007.

“Em 1993, segundo tese de Armando de Almeida Fernandes, no seu livro Viseu, Agosto de 1109, Nasce D. Afonso Henriques, deu-se início à hipótese, a mais credível, penso, de D. Afonso Henriques ter nascido em Viseu (05 de Agosto de 1109), contrariando princípios há muito tidos como assentes, pela tradição nacional”.
Professor Doutor João Silva de Sousa, Professor da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade de Lisboa.

“É de aceitar a tese de Almeida Fernandes. É de todas as teses sobre a data e o local do nascimento de D. Afonso Henriques a mais provável ”.
Doutor António Matos Reis, Investigador em História Medieval Portuguesa.

“Os documentos que falam de Viseu têm muita veracidade e é possível o nascimento de D. Afonso Henriques em Viseu, […].”
Professor Doutor Marsilio Cassotti, Historiador, autor da biografia de D. Teresa (mãe de D. Afonso Henriques), “D. Teresa - A Primeira Rainha de Portugal”, Esfera dos Livros, 2008. in entrevista Lusa, 3 de Julho de 2008.

“Viseu é, quase, com muita probabilidade, a terra de nascimento de D. Afonso Henriques […]”
Professor Doutor António Borges Coelho, Professor Jubilado da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, in entrevista RTP, 30 de Março de 2009.

Perante tais opiniões, produzidas por pessoas prestigiadas no nosso meio científico, será mesmo que se confirma que Afonso Henriques veio ao mundo em Viseu? Ou será que tão ilustres eruditos têm andado distraídos e se esqueceram de ler, com a atenção necessária, a obra sobre a qual emitem tais juízos? É a estas perguntas que vamos tentar responder a seguir.

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4 Comentários

Anónimo disse…
Tenho pena que tenha retirado a opinião do Professor Doutor Cónego Avelino de Jesus da Costa das opiniões que transcreve. Onde estavam essas escritas estava, também, a do Prof. Avelino. Fica-se com a sensação que por ser uma opinião anterior à do Prof. José Mattoso iria fazer cair por terra a sua afirmção que todos os outros historiadores vêm a reboque dele.
Aqui fica o que o Prof. Avelino escreveuem 1992:
“Quanto ao nascimento de D. Afonso Henriques em Viseu, os documentos apresentados por V.ª Ex.ª não permitem outra conclusão”.
Professor Doutor Cónego Avelino de Jesus da Costa
Professor Catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
in carta a Almeida Fernandes de 27 de Fevereiro de 1992
Se se fica com essa ideia, fica-se com uma ideia que não se pretendeu dar. Aquilo que se escreveu tinha a ver com o longo silêncio, entre 1990 e 2007, que a obra de Almeida Fernandes suscitou, e que contrasta com todo o ruído que rebentou depois da publicação da biografia escrita por Mattoso. Aquilo que Avelino de Jesus Costa terá escrito não teve qualquer ressonância pública, até porque foi dito em privado e só há pouco veio a lume. O que aqui se pretendeu mostrar foi, simplesmente, o facto de o assunto se ter tornado matéria mediática após a aparente legitimação por José Mattoso. Neste momento, há um caldo muito esquisito a formar-se e a passar para a opinião pública. Ainda na manhã do último dia 24, num programa de uma rádio nacional, ouvi dizer que em Viseu vai realizar-se uma exposição onde serão mostrados os documentos utilizados por Almeida Fernandes e (sic) José Mattoso para fundamentarem a sua tese. Pelos vistos, até já se acredita que ambos colaboraram na mesma obra. Não sei o que Almeida Fernandes diria de tal novidade...
Anónimo disse…
Tem razão numa "coisa".
Muitos disparates se têm dito a proposito das comemorações dos 900 anos do nascimento de D. Afonso Henriques, seja relacionados com a "doutrina" do nascimento em Viseu, quer seja com a contestação que provêm de alguns pessoas de Guimarães quer seja até vindas de alguns textos de entidades que deviam ser mais cuidadosas no que escrevem e subscrevem.
António José Coelho disse…
Dr.º Amaro das Neves penso que a tese do Dr. A. de Almeida Fernandes, "Viseu, Agosto de 1109, nasce D. Afonso Henriques" vai fazendo o seu caminho contra a tradição do nascimento em Guimarães. Todos temos consciência que o peso da "tradição" é grande, mas isso não nos deve deixar de reflectir ou turvar nos pensamentos. È uma tese com só com quase 20 anos contra a afirmação de uam tradição de quatro séculos.
Deixe-me lembra-lhe Séneca:
"Veniet tempus quo ista quae nunc latent in lucem dies extrahat et longioris aeui diligentia. Ad inquisitionem tantorum aetas una non sufficit, ut tota caelo uacet: quid quod tam poucos annos inter studia ac uitia non aequa portione diuidimus? Itaque per successiones ista longas explicabuntur. Viniet tempos quo posteri nostri tam aperta nos nescisse mirentur.”

Séneca
(Corduba, 4 a.C. – Roma, 65 d. C.)
in SÉNÈQUE – Questions Naturelles, texte établi et traduit par Paul Oltarmare. Tomo I/III, Paris, Société d’Édition Les Belles-Lettres, 1929, pp 326-327.

Tradução livre: “Virá o dia em que, através de um estudo continuado de muitos séculos, as coisas actualmente escondidas parecerão evidentes e a posteridade se espantará por coisas tão claras nos terem escapado.”

Saudações,
António José Coelho