No texto com que abre a obra que dedicou ao local de nascimento de Afonso Henriques, A. de Almeida Fernandes reconhece que ainda não está encontrada a “solução plausível” para o enigma do local de nascimento de Afonso Henriques. Porém, à medida que se avança na sua leitura, assiste-se à transfiguração da dúvida inicial em certeza “indubitável”: o filho de Henrique e Teresa nasceu em Viseu “à roda de 5 de Agosto de 1109”. A argumentação copiosa que Almeida Fernandes desenvolve na obra Viseu, Agosto de 1109 – Nasce D. Afonso Henriques apenas sustenta-se em breves passagens de três documentos, a saber:
a) Da Chronica Gothorum (ou Anais de D. Afonso Henriques, Rei dos Portugueses): “…siquidem mortuo patre suo comite domine Henrico cum adhuc ipse esset duorum aut trium annorum”.
b) De um documento de confirmação da doação do Mosteiro do Lorvão à Sé de Coimbra, incluído no livro Preto de Santa Cruz de Coimbra, onde Almeida Fernandes leu: “Ego Tarasia, Ildefonsi imperatoris filia, et Henrici comitis uxor; hoc scriptum confirmo, hanc cartam confirmatam in Viseo”.
c) Da carta de foral de Zurara (actual Mangualde), dada por D. Henrique e D. Teresa, com intervenção de Egas Moniz, na parte em que se escreveu: “Et ego Henrico et uxor mea Tarasia fecimus illam iurare ade ille Egas Moniz et domnus Rabaldus et Gunsalvus Petri in nostra vice”.
Propomo-nos aqui analisar os argumentos de Almeida Fernandes à luz dos documentos que os sustentam, avaliando a sua relevância para a demonstração ou negação da tese que coloca D. Afonso Henriques a nascer em Viseu no mês de Agosto de 1109.
É geralmente aceite como verosímil a indicação da Crónica dos Godos segundo a qual Afonso Henriques teria de dois para três anos (“duorum aut trium annorum “) aquando da morte de seu pai, o Conde D. Henrique, que ocorreu em Astorga, no dia 1 de Maio de 1112. Partindo desta indicação, Almeida Fernandes assevera, num primeiro momento, que o filho de Henrique e Teresa estaria então mais próximo dos três do que dos dois anos (ou seja, “com mais de dois anos e meio”), concluindo que “nasceu nos meados do Verão de 1109”, para acabar a afirmar, numa nota de rodapé (p. 48, n. 88), sem quaisquer reservas, que a Crónica dos Godos “postula uns dois anos e nove meses” (ou seja, que Afonso Henriques teria nascido dois anos e nove meses antes da morte de seu pai). Páginas volvidas, afirmará que Afonso Henriques nasceu entre Julho e Agosto de 1109, fixando o nascimento no início de Agosto e acabando a escrever que D. Afonso Henriques nasceu “à roda de 5 de Agosto de 1109”. Porém, durante esta evolução percurso argumentativa, não aduz novos elementos de prova: a única menção documental de que se socorre será, até ao fim, a referida transcrição da Crónica dos Godos que diz que o infante teria de dois para três anos no final de Abril de 1112.
Ora, em rigor, o que nos diz aquele documento é que, quando ficou órfão de pai, Afonso Henriques já teria dois anos completos, indo a caminho dos três, situando-se o seu nascimento no intervalo de tempo que decorre entre o início de Maio de 1109 e o final de Abril de 1110. Dentro desse período, pode ter nascido em qualquer dia. Em rigor, nada permite inferir que tenha sido no Verão ou, ainda menos, precisar que foi nos primeiros dias do mês de Agosto. Com base nas fontes disponíveis, qualquer fixação de data, mesmo aproximada, será sempre hipotética e impossível de confirmar.
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