O Comércio do Minho. — Este faz estilo, como decerto se notou já nas transcrições que dele demos, e decerto por tratar mais de pentear os períodos do que de pôr-se de acordo com a Voz do Distrito, embora as duas folhas saíssem no mesmo dia, anda de tal sorte às turras com ela, que, passando duma à outra, fica com os miolos em água quem quer que deseje formar uma ideia nítida do que ocorreu na Roma Portuguesa no memorável dia 28.
Esperava-se, diz o Comércio, que a questão do liceu fosse definitivamente resolvida na sessão de 28; mas não aconteceu assim. Um dos procuradores de Guimarães começa a falar acerca da acta da sessão anterior e sobre outros assuntos de somenos importância (tratava-se apenas da bagatela da legalidade duma acta). Daqui o desagrado de alguns procuradores e dos espectadores. Narra um conflito entre os membros da junta e “os inimigos do projecto desmascararam-se e patentearam todo o seu ódio contra tudo o que tenda a melhoramentos nesta cidade”. O desagrado transforma-se em exaltação. Alguns procuradores, como o snr. Luís do Vale, Cunha Reis, Vasco Jácome, etc, “apresentam o peito às flechas” em defesa do projecto. Em consequência do conflito (não precisa qual) alguns membros da junta (não diz quantos, nem quais) abandonam os seus lugares e a sessão é interrompida.
O desagrado, transformado primeiro em exaltação, depois em indignação, rebenta em apupos, logo que os procuradores de Guimarães e outro de Braga saem do governo civil. Lá começa a esboroar-se o edifício tão laboriosamente engenhado pela Voz do Distrito. O cronista do Comércio não viu o snr. Meira a sorrir desdenhosamente para a multidão, nem o snr. José Minotes a fazer provocações de bengala em punho. É verdade que também viu o que ninguém podia ver, porque na primeira apupada, à saída do governo civil, nem o snr. conde de Margaride, nem o snr. José Minotes podiam ser apupados em baixo, pela simples razão de não terem ainda descido. Isso não tira que a Voz do Distrito não fique em maus lençóis, porque aqui temos um seu colega braguês, que em toda a sua narrativa, aliás muito pitoresca, não deixa transparecer uma só vez que as três assuadas fossem motivadas pelas provocações dos nossos procuradores. Dá-nos também a certeza que a primeira e segunda apupada eram coisas muito premeditadas. A primeira deu-se cerca da uma hora da tarde. A terceira... Copiemos textualmente:
“Cerca das quatro horas da tarde entre os diversos grupos reunidos aqui e ali no largo da Lapa e campo da Santana passa de boca em boca este grito: – aí vem o homem! aí vem o homem! “
Era o snr. conde de Margaride, “que acabava de tomar lugar na carruagem, a fim de se dirigir para sua casa, em Guimarães.”
Lá vão pela água abaixo os anjinhos da Voz do Distrito.
Segue a grande cena da correria selvagem, que saiu romanesca de mais - o que se desculpa a quem “faz estilo”. Se a carruagem “voasse como um relâmpago”, consoante afirma o Comércio, “rua das Águas abaixo” (em prosa, rua d'Água) a chuva das batatas e panelas velhas era, salvo o erro, impossível.
De resto ele não vê que haja razão para culpar Braga. Em que? Por algumas “manifestações, em que acaso possa ver-se um poucochinho de excesso?” Mas “na efervescência louvável da sua indignação, Braga protestou energicamente contra a guerra mesquinha e desleal, de que tem sido vítima”, contra aqueles que “com o seu conhecido ódio, e com a sua mesquinhez aviltante, deram razão ao povo para manifestações, cujas consequências fossem ainda mais lamentáveis do que felizmente se presenciaram.”
Então? em Braga pensa-se assim. Correr os estrangeiros à pedra e à batata, se não é, como dava a entender a Voz do Distrito, um bota-fora sui generis, não é uma despedida tão alarve, que permita ver nela outra coisa mais que um poucochinho de excesso. A Voz do Distrito que dessorou o miolo e não atinou com aquilo, ainda é de bom tempo.
Quanto às causas do poucochinho de excesso, o Comércio do Minho é muito claro: foi o obstrucionismo, pouco importa para o caso que fosse odiento ou não.
* *
Correspondência do Norte. — Salta por cima dos factos, como gato por brasas e atribui vagamente a um só dos procuradores, o snr. conde de Margaride, e ao seu obstrucionismo, o “desgosto” dos espectadores, que deram alguns “sinais de desagrado”, apupando todos os três vimaranenses, provavelmente para que nenhum deles ficasse descontente. À grande arruaça final dá por motivo os gestos indecentes dum dos procuradores. Falaremos a seu tempo dos tais gestos indecentes; poderíamos dizer por agora, sem o menor receio de desmentido, que eles não podiam provocar a infernal apupada, simplesmente porque a apupada rebentou antes; mas preferimos deixar as folhas braguesas a bulhar umas com as outras. Viu-se, há pouco, o Comércio do Minho mostrar-nos os arruaceiros, pelo largo da Lapa e campo de Santana, passando palavra uns aos outros com o grito: – aí vem o homem! aí vem o homem! – quando o homem acabava de tomar lugar na carruagem. A carruagem larga e a apupada esfuzia. Então aquela boa gente, que teve tanto trabalho em reunir, para despedir-se de um dos “mais acérrimos procuradores” contrários, cuida a Correspondência que necessitava de provocação para cumprir o seu dever, dar vazão à sua “louvável efervescência” etc.? O Constituinte dar-lhe-á um desmentido ainda mais redondo.
Mas a Correspondência lá vai sempre o seu caminho; afirma que tudo aquilo foi “rápido” e uma “verdadeira surpresa”, e está convencida de que “este acontecimento nasceu dum movimento espontâneo, e que não foi proveniente de combinação alguma". Oh! mas então a coisa passou-se na terra, em que o dr. Ox fez as suas experiências. Aí, como se sabe, eram precisas quatro horas para despachar um negócio, que em qualquer outra parte se aviava num minuto. As apupadas braguesas do dia 28 repetem-se três vezes, durante o espaço de quatro horas, conforme se pode provar com os próprios periódicos da terra. E tudo isto foi rápido e uma verdadeira surpresa! Onde está o gato? Façam favor de notar que a Correspondência defende o supremo magistrado do distrito, acusado pelo Constituinte, pela Junta Geral, pela Câmara Municipal de Braga, de ter tolerado, se não instigado, a anarquia das quatro horas, tendo tempo sobejo para a prevenir.
Uma babel.
continua aqui...
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