O relógio do Toural, "curiosa máquina, que deve ser, depois da dos carrilhões de Mafra, a mais importante do País..."

 

O maquinismo do relógio-carrilhão do Toural e o seu  último zelador, Artur Silva. Fotografia de Armindo Cachada.

Para que se perceba melhor o valor patrimonial e histórico (para não falar na sua importância simbólica e afectiva) do relógio-carrilhão, inventado e construído por Manuel Francisco Cousinha e inaugurado nas Gualterianas de 1938, transcrevo do saudoso Notícias de Guimarães a notícia que lhe dedicou no dia 10 de Julho daquele ano, em que se reproduzem textos que saíram em dois jornais lisboetas de circulação nacional, O Século e o Diário de Notícias.


O futuro relógio-carrilhão da Igreja de S. Pedro é notabilíssima obra de um artista português


Como é do domínio público, a Câmara encomendou para a Igreja de S. Pedro, um relógio-carrilhão, que nos dizem será inaugurado nas Festas da Cidade. Acerca desse melhoramento que virá suprir uma lacuna há muito verificada, os jornais de Lisboa Século e Diário de Notícias publicaram informações tais que nos levam a crer jubilosamente tratar-se de uma obra digna do maior apreço.


Com efeito, assim se lhe refere O Século:

“A indústria nacional, o grande factor da economia e do progresso do país, tem os seus ignorados, esquecidos e modestos obreiros. Está neste caso o sr. Manuel Francisco Cousinha, um relojoeiro mecânico de Almada, cujo esforço e inteligência e, quantas vezes o sacrifício — é justo pôr em destaque.

Há relógios de torres e de igrejas semeados por esse País fora que muitos julgam ter sido construídos no estrangeiro. Afinal, silenciosamente, sem reclamos nem barulho, Manuel Cousinha, na sua oficina de Almada, ajudado por um grupo de bons operários, é quem faz esses relógios.

Agora, o industrial Cousinha acabou de construir mais uma maravilha de mecânica, a melhor e mais completa de Portugal, depois dos carrilhões de Mafra: um relógio famoso, para torre de igreja, um complicado sistema de relojoaria que espanta quem o vê. Este relógio-carrilhão, toca quatro músicas diferentes em dezasseis sinos — às Avé-Marias, três vezes por dia; aos quartos de hora, às meias horas e às horas.

Trata-se, na verdade, de uma obra admirável, exposta agora, durante alguns dias numa das montras da Casa Africana, que merece ser vista e admirada, não só pelo público como pelas entidades oficiais, premiando-se assim, moralmente, um homem de trabalho, um artista notável que, aliás, já foi galardoado com a medalha de ouro da Exposição Industrial Portuguesa.”


Não menos laudatória é a informação do Diário de Notícias:

“Numa das montras da Casa Africana encontra-se em exposição uma notável obra de engenharia, fabricada pelo sr. Manuel Francisco Cousinha, de Almada, o conhecido artista relojoeiro que tem fornecido já algumas centenas de igrejas de todo o País. Trata-se dum carrilhão adquirido pela Câmara Municipal de Guimarães para a igreja de S. Pedro, daquela cidade. A curiosa máquina, que deve ser, depois da dos carrilhões de Mafra, a mais importante do País, é um trabalho perfeitíssimo e cuidadosamente acabado. Destina-se a servir quatro mostradores, dando as Avé-Marias, quartos, meias horas e horas, tudo com música, para o que dá 157 toques em dezasseis sinos. Uma furação especial nos cilindros permite mudar as músicas.

O sr. Manuel Francisco Cousinha expôs outro carrilhão quando da exposição industrial do Parque Eduardo VII, tendo-lhe sido então conferida a medalha de ouro. Estão convidadas várias entidades oficiais para irem ver o magnífico engenho, entre os quais o sr. engenheiro Gomes da Silva, dos Monumentos Nacionais. Este senhor, que está encarregado de mandar reparar os carrilhões de Mafra, tencionava encomendar a obra no estrangeiro, decerto por ignorar que em Portugal existia um tão completo e competente artista naquele género.”

Resta-nos esperar ansiosamente que o relógio-carrilhão de S. Pedro marque as horas gloriosas de um progresso constante na vida da nossa Terra.

Notícias de Guimarães, 10 de Julho de 1938


  • Sobre a história do relógio municipal de Guimarães, em geral, e do relógio da basílica de S. Pedro do Toural, sugiro a leitura da séria de textos sobre  O Relógio Camarário.

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