O altar do Padrão da Oliveira

O Padrão da Oliveira na década de 1830. Litografia n.º III da obra  George Vivian Scenery of Portugal & Spain (1839). Da colecção da Biblioteca Nacional de Portugal)

[Com Nuno Saavedra]

Depois da Batalha de Aljubarrota, em data incerta, foi colocado no Padrão da Praça da Oliveira um altar onde se celebrava a vitória do Mestre de Avis, dedicado a Nossa Senhora da Vitória. Desse altar temos diversas descrições.

No inventário mandado fazer em 8 de Agosto de 1665 pelo D. Prior Diogo Lobo da Silveira, lemos:

Tem esta igreja da banda de fora da porta principal dela um pátio lajeado levantado com seus assentos ao redor e logo se lhe segue o lugar onde tem o padrão e cruzeiro e por cima se cobre de abóbada e no alto dele está Nossa Senhora da Oliveira que também tem a invocação de Senhora da Vitória e se lhe segue mais ao diante uma antiga Oliveira cercada de socalco de pedra e com assentos ao redor delas...

No auto que se lavrou depois da medição da igreja, do claustro, do adro e da sacristia da Oliveira, datado de 12 de Março de 1682, ficou registado, em relação ao Padrão:
Item defronte da porta principal tem seu pátio saída da Igreja e lajeado de pedra de esquadria com suas escadas para ambas as partes de sua serventia, e logo pegado nele para diante o Padrão de abóbada armado em quatro pilares que o sustentam com quatro arcos e em cima está nele a Imagem de Nossa Senhora da Oliveira com algumas pinturas de seus milagres e no meio dele um cruzeiro de pedra muito antigo, e sendo medido o dito pátio e padrão juntamente, que é lugar sagrado, tem desde ele até à porta principal da Igreja de nascente a poente de comprido doze varas e o pátio de largo desde a torre até à escada tem de norte a sul dez varas e meia.

No livro Guimarães – Apontamentos para a sua história, publicado em 1881, o Padre Ferreira Caldas escreveu:

[…] no arco do fundo a principiar na linha dos capitéis, em que se estriba a abobada, fez-se mais tarde um altar de estuque, envidraçado pela frente, dedicado à imagem de Nossa Senhora da Vitória, que ali se venera, em comemoração da gloriosa batalha de Aljubarrota.

Duas décadas mais tarde, na Arqueologia Cristã, publicada em 1903, Albano Belino registou:

Num dos quatro arcos ogivais deste padrão fez-se de estuque, à altura dos capitéis das colunas, um pequeno oratório envidraçado, com a imagem de Nossa Senhora da Vitória. Aos lados da referida imagem havia estas duas tábuas com escultura antiga, em relevo, que actualmente existem expostas no museu.
A primeira representa D. João I ajoelhado junto do padrão a agradecer à Virgem o vencimento da batalha de Aljubarrota; e a secunda o advogado Pedro de Oliva, que se propunha, como na ocasião dissera, destruir os privilégios do Cabido e dos seus caseiros, o qual caiu repentinamente “com a língua fora da boca, a fala perdida e o rosto disforme” aos pés dos cónegos Luís Gonçalves e Abade de Freitas […].

Do altar, conhecem-se as tábuas esculpidas e pintadas de que fala Albano Belino e que actualmente estão no Museu de Alberto Sampaio.

A da maldição de Pedro de Oliva (ou Ulivão, ou Lobão, conforme os autores):


E a tábua que Belino diz representar D. João I ajoelhado junto ao padrão e que outros autores dizem ser uma representação do miraculoso reverdecimento da oliveira:

Do altar propriamente dito, que seria um armário de madeira com estuque, envidraçado da parte da frente, apenas conhecíamos descrições, que nos permitiram imaginá-lo pelo espaço que ocupava, como fizemos no seguinte esquema (imagem da direita), enxertado por cima de um desenho da antiga DGEMN, como um arco cego na parte situada acima dos capitéis:
Mas, se não o conhecíamos, era só porque não olhávamos com olhos de olhar, para as imagens de que dispúnhamos, como há dias verificou o incansável pesquisador e divulgador da memória visual de Guimarães Nuno Saavedra na gravura de Vivian que encima este texto, como se percebe com maior aproximação no recorte seguinte:



Lá está, o altar do Padrão, iluminado por dois candeeiros com lâmpadas de azeite, na parte superior do arco que se abre para o lado do Nascente.
Tal como estava nesta fotografia de Frederico de Seabra, provavelmente de 1858, onde são bem visíveis as costas, que fecham o arco do padrão que está voltado para a igreja da Colegiada:
O Padrão da Oliveira. Pormenor de estereoscópia de Antero Frederico de Seabra, de c. 1858. É bem visível a face posterior do altar, na parte fechada do arco da direita.
O Padrão da Oliveira. Pormenor de estereoscópia de Antero Frederico de Seabra, de c. 1858. No arco que fica por tras da cruz, o altar.

Ou em várias clichés do Padrão, do fotógrafo francês J. Laurent, como se percebe no seguinte pormenor:

O Padrão da Oliveira em 1869. Pormenor de fotografia de J. Laurent.

Ou neste cliché de Carlos Relvas, que mostra a parte posterior do altar:

O Padrão da Oliveira. Fotografia de Carlos relvas de c. 1875, onde é bem visível a face posterior do altar.
O altar de Nossa Senhora da Vitória, que é Santa Maria de Guimarães, ou seja, Nossa Senhora da Oliveira, foi removido do Padrão no dia 19 de Junho de 1913. Dessa remoção reza a seguinte nota, publicado no mesmo dia no jornal vimaranense Alvorada:

O padrão
O armário que fazia de nicho a uma imagem, desfeando aquele monumento histórico que é o padrão junto do templo da Oliveira — foi abaixo. A beata ignorância faz chiada e houve até ilustres e preclaros cidadãos que tendo-lhe dado ouvidos, correram pressurosos a saber se era o próprio padrão que ia ser arreado. Assegurados, porém, de que não era como diriam, uma coisa lhes esqueceu fazer: pedir desculpa à Câmara de a haverem julgado capaz de arrear monumentos históricos!
Recorte do jornal Alvorada, de 19 de Junho de 1913.

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2 Comentários

Unknown disse…
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Tenha paciência estimado Amigo. No nosso pequeno mundo, há quem goste de passar por aquilo que nunca foi e por certo não chagará a ser …
Quero deixar aqui o meu agradecimento, nesta forma pública de testemunho, pois há muito lhe sou devedor do prazer de ler - consultar e aprender - factos histórico/culturas relevantes da nossa cidade e das suas ilustres gentes. Pelas horas que tenho dedicado às “suas” Memórias de Araduca, tenho sido manifestamente recompensado pelo enriquecimento e prazer obtidos.
A sua dedicação ao bem comum, pela oferta cultural disponibilizada, merecia uma forma de reconhecimento público dos poderes eleitos da nossa cidade. Se alguma vez isso vier a acontecer, estarei lá, de certeza.
Melhores cumprimentos,
António Oliveira Antunes
Subscrevo na íntegra o comentário anterior. Já era tempo de alguém reconhecer o serviço público.
Da minha modesta parte, o Amaro sabe que lhe sou agradecido por tudo o que me vem ensinando e ainda vai ensinar.
Eduardo Magalhães