Apesar dos relatos das aparições
datarem de 1917, o culto da Nossa Senhora de Fátima, só começou a
ser notícia nos jornais Guimarães, na sua maioria assumidamente
católicos e conservadores, mais de uma década depois. A partir da
década de 1930, o culto de Fátima foi ganhando relevância e
dimensão. A imagem da Virgem de Fátima, tal como a conhecemos hoje,
só foi criada em 1947 e dela foram tiradas várias cópias, entre as
quais a da Virgem Peregrina que, na meia dúzia de anos que se
seguiram, pisou terras de todos os continentes. Em 1951 esteve em
Guimarães, numa passagem que está documentada nas fotografias que
Nuno Saavedra encontrou à venda na página de coleccionismo
delcampe.net e que aqui se partilham.
Anunciada a visita, que aconteceria nos
dias 8 e 9 de Setembro, a cidade preparou-se para a receber,
vestindo-se de gala e confeccionando
o programa, que aqui se transcreve:
o programa, que aqui se transcreve:
— Com o Snr. Presidente da Câmara e
demais representantes do elemento oficial, colectividades civis,
religiosas e militares, será organizado o cortejo automóvel no
limite do concelho em Lordelo, onde a Milagrosa Imagem chegará pelas
17 horas de amanhã, dia 8.
— Chegando a V. Imagem ao lugar do
Castanheiro deve organizar-se imediatamente a Procissão de Velas,
desde o Minhoto e Av. D. Afonso Henriques, pelas 20,30, devendo todos
munirem-se da respectiva vela, sem o que a Procissão não terá
brilho.
— Retirada a V. Imagem do carro, será
o andor conduzido aos ombros de Oficiais da Legião Portuguesa até
ao meio da Av. D. Afonso Henriques, sendo a guarda de honra durante
todo o percurso feita pela L. P. Desde o meio da Av. até ao trono
erguido em frente à muralha (antiga entrada da cidade) será o andor
conduzido por Oficiais do Exército.
— Junto à tribuna estará o elemento
oficial e representações das colectividades. A Virgem avançará
por entre as alas da multidão, sempre com suas velas acessas, e será
conduzida ao trono onde o Exmo. Snr. Presidente da Câmara a saudará.
— Após a saudação, continuará a
Procissão de velas pelo Toural (poente), R. de Paio Galvão, R. Gil
Vicente, R. de St.° António, Toural (nascente), Largo 28 de Maio,
R. de S. Dâmaso, Senhora da Guia e Oliveira.
— Neste percurso, o andor será
conduzido, em turnos, por mesários da Misericórdia, da V. O. T. de
S. Francisco, da V. O. T. de S. Domingos, da V. O. T. do Carmo, da
Irmandade dos Santos Passos, e juízes das Confrarias do Santíssimo
Sacramento e das Irmandades de N.ª S.ª.
Estes turnos conduzem o andor até à
Senhora da Guia. O último turno será feito por Vereadores
Municipais, que conduzirão Nossa Senhora até à Colegiada.
São encarregados da organização destes
turnos, e sua substituição, os Senhores: Domingos Mendes Fernandes,
Eleutério Ramos Martins Fernandes, José Luís Pires e Fernando
Gilberto de Sousa Pereira, a cargo de quem está também a
organização de Procissão de Velas.
— Junto ao trono, uma Comissão
composta pelos Senhores José Mendes Ribeiro, Casimiro Martins
Fernandes, João Martins da Costa (Aldão), Bráulio Teixeira
Carneiro, Padre Carlos Simões de Almeida e Padre Avelino Borda
disporá o elemento oficial e ordenará o acesso à mesma.
— Na Colegiada, durante a noite haverá
turnos de Adoração Eucarística.
— No dia 9, Domingo — Às 7 horas,
far-se-á a concentração no Largo do Campo da Feira, onde a
Veneranda Imagem será recebi da em grandiosa homenagem t conduzida
para altar próprio, celebrando a Santa Missa Sua Excelência
Reverendíssima o Sr. D. Domingos Gonçalves, sendo distribuída a
Sagrada Comunhão aos peregrinos.
— Às 9 horas — Será dada a bênção
aos peregrinos e seguirá imediatamente a Peregrinação para a Penha
pelas ruas: S. Dâmaso, L. 28 de Maio, Toural, R. de St.º António,
Av. Duarte Pacheco, R. de Serpa Pinto, Av. dos Combatentes, Hortas,
pela Costa até à Penha.
— Durante o percurso o andor da Virgem
Nossa Senhora de Fátima será conduzido por delegações de todas as
paróquias do concelho,conforme indicação fornecida pelos
respectivos párocos.
Fica a cargo dos Senhores ; Joaquim da
Silva Eugénio e João Augusto Passos, a distribuição do percurso
pelos representantes das paróquias, cujos nomes serão fornecidos
oportunamente.
— Como é sabido, na Procissão das
Velas, todas as Senhoras e meninas se devem apresentar de cabeça
coberta, e modestamente vestidas.
O
programa foi integralmente cumprido. Foi, inegavelmente uma
manifestação de religiosidade popular, mas também um mconjunto de actos de pendor marcadamente político, desde o seu primeiro momento, com a entrada da imagem no concelho de
Guimarães, em Lordelo, onde foi aguardada pelas autoridades
locais, pessoas de representação, representantes de colectividades
civis e religiosas, representantes da Imprensa, etc.
A
entrada na cidade fez-se pela Avenida D. Afonso Henriques. Junto à
torre da Alfândega, com o povo espalhado pelo Toural e pelo terreiro
de S. Sebastião, erguia-se uma tribuna, para onde a imagem foi
conduzida por oficiais do Exército Português, com guarda de honra
de membros da Legião Portuguesa. Houve discursos e J. M. Pinto de
Almeida leu uma “Saudação à Virgem Peregrina de Fátima”,
escrita em verso e publicada num opúsculo que foi distribuído na
altura. No domingo, a imagem foi levada em peregrinação à Penha,
de onde seguiria viagem, em direcção às terras de Fafe.
No
final do artigo sobre passagem da Virgem Peregrina por terras de
Guimarães, publicado na edição de 14 de Setembro 1951 do jornal
O Comércio de Guimarães lemos um conjunto de notas de
reportagem que ajudam a perceber a grandiosidade da peregrinação à
Penha:
Apesar da enorme afluência de povo, não
se registaram desordens nem presenciamos actos dignos de censura.
— Foram presos alguns gatunos, havendo
alguns furtos.
— O serviço de policiamento, no alto
da Penha, entregue à G. N. R., foi bom, mas os guardas eram muito
poucos, e mal chegavam para a regulamentação do trânsito, que era
extenuante.
— É pena que não possa haver ligação
dos altos falantes do alto da montanha, para o princípio desta, pois
que, sendo reclamados os serviços da Guarda, esta, nada ouvia.
— E pena foi que se não tivesse pedido
polícia de trânsito, para a chegada da Virgem e durante o percurso
da Cidade à Penha, como o fez, ultimamente, a Irmandade de S.
Torcato, por ocasião da Romaria Grande.
— Estando os Parques destinados ao
estacionamento de automóveis, repletos, estes, espalharam-se pela
Penha, acondicionando-se, onde pôde ser.
— Não faltou na Penha, e em lugares
apropriados, pão, uvas, melões, melancias, vinho, etc.. Quem ali
foi e quis comer, nada lhe faltou.
— Havia bastantes camionetes a fazer
carreiras para a Penha, mas insuficientes para a enorme quantidade de
pessoas que ali quis subir. O facto do trânsito ser feito só por
uma estrada, ocasionava grande atraso, que, aliás, se não podia
evitar.
— Devido à enorme aglomeração de
povo, registaram-se alguns casos de insolação, que foram
prontamente atendidos, pelos médicos ali em serviço. Também houve
pessoas que necessitaram dos serviços clínicos, sendo aplicadas
injecções e outros medicamentos.
Vem a propósito dizer que, pessoas que
têm acompanhado a peregrinação da Virgem através o Minho,
disseram que em parte alguma o serviço de doentes estava tão
impecavelmente montado.
Vai o nosso louvor, sincero, para todo o
pessoal turístico, pelos bons serviços prestados na Penha.
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