É
terra “aprazível à vista e abundante de frutos, vinho verde, milhão, milho,
centeio, trigo e painço e frutas”. O nome vem-lhe das nascentes de água quente que
brotam no seu território. Assim o diz António Álvares, o abade de S. João das
Caldas de Vizela em 1758
É esta freguesia chamada das Caldas, tomando o nome de um banho de água quente sulfúrea e medicinal que nasce na mesma para a parte do Sul, numa alameda chamada Alameda da Água Quente, e nasce esta em diversas partes.
Segundo
o Abade de Tagilde, São Miguel das Caldas já era paróquia no tempo em que os suevos dominaram o
Noroeste da Península Ibérica. Na divisão estabelecida no concílio de Lugo
chamava-se Oculis, olhos, “em razão
de uns olhos de água medicinal”.
Actualmente, faz parte do concelho de Vizela.
São Miguel das Caldas de Vizela
Informação corográfica da freguesia de S.
Miguel das Caldas.
A freguesia de São Miguel das Caldas de Guimarães do Arcebispado Primaz de Braga,
dista daquela cidade quatro léguas, da de Lisboa cinquenta, da vila de
Guimarães, para o Sul, légua e meia. Está situada numa ribeira chamada das
Caldas, quer corre do Sul para o Norte e que faz conexão à ribeira do rio
Vizela, que corre do Nascente para o Poente, e está esta ribeira das Caldas
entre dois montes e um raso, para da parte do Poente chamado o monte de São
Domingos, tomando o nome de uma ermida do dito santo, que antigamente houve no
dito monte, no lugar do Calvário, e dela hoje somente se conserva a memória, e
outro, da parte do Nascente, chamado o monte de São Bento, tomando o nome de
uma ermida do glorioso patriarca que está edificada no cume do dito monte, à
qual concorrem de romaria diversas pessoas, nas festas do dito santo e nas da
Pascoa e Espírito Santo, e pertence aquela capela à igreja desta freguesia e à
do Salvador de Tagilde e serve de divisa e marco entre as duas freguesias e, o
monte em que está edificada, tem seu princípio, pela parte do Sul, no rio
Vizela e corre para o Norte, com o nome da serra de Santa Catarina, que fica
defronte da vila de Guimarães, para o Nascente.
É esta freguesia, e sua ribeira, aprazível à
vista e abundante de frutos, vinho verde, milhão, milho, centeio, trigo e
painço e frutas. Suas fazendas são quase todas foreiras ao reguengo da vila de
Guimarães, que pertence à Sereníssima Senhora Rainha. Tem a dita freguesia
cento e sessenta e cinco fogos e quinhentas pessoas de sacramento e os seus lugares
são tantos como as fazendas, e delas tomam o nome, e todas pertencem a esta
freguesia, e somente as fazendas do lugar de Lagoas que, pela parte do
Nascente, partem com o rio Vizela, são meeiras com esta freguesia nos dízimos e
com a igreja de Santo Adrião de Vizela, e seus moradores são de alternativa de
uma e outra freguesia.
A igreja desta freguesia está edificada no
meio dela. O seu padroeiro é o Anjo São Miguel. É igreja abadia e de
apresentação e jurisdição ordinária de Braga, ainda que antigamente foi do
padroado real e se desagregou da coroa por doação que do padroado desta igreja,
no ano de mil e trezentos e um, fizeram a um Pedro Salgado, tesoureiro-mor da
coroa, o Senhor Rei Dom Dinis, com a Sereníssima Senhora Rainha Santa Isabel e
o Sereníssimo Senhor Infante Dom Afonso. Tudo consta de instrumentos que se
conservam nesta igreja, tirados da Torre do Tombo, e sentenças que houve contra
a coroa. E dos mesmos instrumentos consta que esta freguesia, sendo hoje uma,
antigamente eram duas, ambas abadias e da coroa real, a saber, esta de São
Miguel e a outra de São Simão, de cujo assento se paga a esta, em cada um ano,
quatro alqueires de trigo, um carneiro e oitenta réis em dinheiro. A qual
igreja se São Simão estava edificada num alto que fica entre esta igreja e o
rio Vizela, chamado ainda hoje o monte de São Simão. Tinha esta freguesia de
São Simão por fregueses os moradores do lugar de Montesinhos, do lugar de
Lagoas e do lugar de Silvares. E porque os rendimentos das ditas duas
freguesias eram muito ténues, o Senhor Rei Dom Dinis uniu a freguesia de São
Simão a esta de São Miguel das Caldas, com declaração que os moradores e
dízimos do lugar de Montesinhos ficaram in
solidum pertencendo à igreja desta freguesia, e os moradores e dízimos do
lugar de Silvares ficaram pertencendo à igreja de Santo Adrião de Vizela, que
é, e sempre foi, da jurisdição ordinária, os dízimos do lugar de Lagoas ficaram
sendo meeiros com esta freguesia e com a de Santo Adrião do rio de Vizela e
seus moradores da alternativa de uma e outra freguesia. E poderão render os
frutos certos e incertos desta igreja, um ano por outro, quatrocentos mil réis.
Tem esta igreja uma irmandade da Senhora das
Candeias e outra do Santíssimo Sacramento e cinco altares. No altar-mor se
venera a sagrada imagem do seu padroeiro, o Anjo São Miguel, e o Augustíssimo
Sacramento. No altar colateral, da parte do Sul, se venera a sagrada imagem da
Senhora do Rosário. E, no que está no corpo da igreja, da mesma parte, se
venera a Senhora da Vidraça e, no mesmo altar, se veneram as sagradas imagens
do nascimento e Santos Reis, metidas em dois repositórios. E no altar colateral
da parte do Norte, se veneram as sagradas imagens do Menino Deus e da Senhora
das Candeias ou Purificação. E, no altar que está da mesma parte, no corpo da
igreja, se veneram as sagradas imagens do Senhor da Boa Morte, a da Senhora da
Piedade, a do Evangelista S. João e a de São Sebastião.
É esta freguesia chamada das Caldas, tomando
o nome de um banho de água quente sulfúrea e medicinal que nasce na mesma para
a parte do Sul, numa alameda chamada Alameda da Água Quente, e nasce esta em
diversas partes. E a principal e mais cálida de que se usa para os banhos,
nasce num tanque feito de cantaria assentada em betume, o qual tem sete palmos
de alto, trinta e dois de largo e quarenta e cinco de comprido, do Sul para o
Norte. É lajeado de seixos assentados em betume argamassado e, no meio, tem uma
pedra quadrada furada no meio, pelo qual buraco, estando limpo o tanque, nasce,
junta em grande quantidade, a água quente, sulfúrea e medicinal, a qual,
estando o tanque entupido, nasce em diversas partes pela circunferência e à
roda do tanque que, pela parte interior, em toda a roda tem banqueta, que serve
de assento. Não havia memória do referido tanque e casualmente foi descoberto
no ano de mil e setecentos e nove. E, mandado limpar pelo senado da vila de
Guimarães, se achou formado na forma dita, e na mesma Alameda e fora do dito
tanque, em diversas partes, nasce água quente da mesma qualidade da que nasce
no tanque e somente duas fontes, menos quentes e só tépidas. E também na
freguesia vizinha a esta, chamada a freguesia de São João das Caldas, nasce em
diversas partes água quente, somente tépida, excepto uma fonte que nasce no
meio do rio Vizela, que corre por aquela freguesia, que é muito quente.
São as caldas desta freguesia mui medicinais
e a elas concorrem muitas pessoas e, sendo a doença estupor ou reumatismo,
cobram muitos doentes perfeita saúde. E tomam estes os banhos em casa dos
lavradores e em tinas, conduzindo a elas água, em pipas, do referido tanque a
água para os banhos. E também em pipas e para o mesmo efeito dos banhos, é
levada água a diversas e remotas partes, como à cidade do Porto, distante sete
léguas, à de Braga, vila de Guimarães e de Amarante, distante quatro léguas. E,
pelos efeitos que causam os banhos das referidas águas, não mereciam tão pouco
asseio com que se acham. Porém, tem desculpa no sítio baixo em que nascem, pois
o referido tanque está situado onde os dois regatos da Portela e Espadanos
juntam suas águas e, quando estas crescem, inundam o dito tanque, por estar
mais baixo que os ditos regatos, e o enchem de lodo e areia. Consta de
geografias antigas que as caldas desta freguesia eram pelos seus efeitos das
melhores de Portugal.
Não tenho mais de que possa informar, ao
predito o certifico e assino com o reverendo Abade de São João das Caldas e o
reverendo vigário de São Martinho de Conde, párocos vizinhos.
São Miguel das Caldas e Maio 17 de 1758 anos.
O abade António Álvares.
Domingos de Sá e Cunha.
João Veloso da Praça, abade de S. João das
Caldas.
“Caldas
de Vizela, São Miguel das”, Dicionário Geográfico de Portugal (Memórias Paroquiais), Arquivo
Nacional-Torre do Tombo, vol. 8, n.º 39, p. 225 a 228.
[A
seguir: São João das Caldas de Vizela]
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