Da Vila Velha, ou do Castelo, de Guimarães, passámos para as memórias paroquiais da Vila
Nova, que cresceu mais a Sul, a partir do mosteiro duplex (misto) fundado no
século X pela Condessa Mumadona, em torno da oliveira miraculosa. Ficava, na
sua maior parte, dentro da muralha, que, numa pequena parte, partilhava com a
paróquia de S. Paio.
Nossa Senhora da
Oliveira
Extracto da freguesia de Nossa Senhora da Oliveira da vila de
Guimarães, na Insigne e Real Colegiada da mesma Senhora, feita por mim Manuel
dos Reis da Costa Pego e com a assistência de Francisco José Vieira de Pina,
ambos cónegos, curas da mesma Colegiada, em satisfação de uma ordem do Muito
Reverendo Senhor Doutor Provisor da Corte e cidade de Braga, Arcebispado onde
pertence, e é na forma seguinte.
Está esta freguesia de Nossa Senhora da Oliveira da vila de
Guimarães na Província de Entre-Douro-e-Minho e é a principal desta sobredita
vila, e na igreja da Insigne e Real Colegiada da mesma Senhora, e compreende
toda a circunferência de dentro dos muros da mesma vila, e alguma de fora
deles, e pertence ao Arcebispado Primaz de Braga e à comarca e termo da mesma
vila, por ser a cabeça de uma e outra coisa.
A sobredita vila, onde esta freguesia está, é de Sua Majestade
Fidelíssima, el-rei Nosso Senhor Dom José primeiro. Tem esta sobredita
freguesia seiscentos e oitenta e nove vizinhos e, pessoas de maior, mil e
novecentas e quatro, e, menores, noventa e uma, como consta do rol dos
confessados, excepto as que não andam no dito rol, por não terem idade
suficiente que os obrigue a deles se tomar conta.
Está situada numa baixa e na falda do monte, Serra de Santa
Catarina, e esta se vê de alguma rua da mesma freguesia ou campo, e quase os
muros da vila a circulam, e não a toda, pois também parte destes o fazem à de
São Paio, que fica na mesma vila, e não se descobre dela outra alguma serra ou
povoação, nem coisa notável.
Está na cabeça do termo e comarca, pois o é a mesma vila onde está
situada, e se compõe de ruas, campos e subúrbios da mesma vila, pois a todos
compreende. E fazem, entre todos, o número dos vizinhos acima declarados e o
termo se compõe de cento e uma freguesias, com as da mesma vila, que são estas:
a sobredita, a de São Paio, São Sebastião e São Miguel do Castelo.
Na mesma vila de Guimarães está situada esta sobredita freguesia
na forma referida. Seu orago é Nossa Senhora da Oliveira, da Insigne e Real
Colegiada da vila de Guimarães. Tem a sobredita igreja, que é bela e antiga do
tempo de muitos anos, sete altares dentro dela e, no claustro, outros sete, nos
quais alguns são capelas, como a do Santíssimo Sacramento, com sua confraria, a
do Senhor Jesus, que é da casa de Vila Pouca, com obrigação de missas, e a de
Nossa Senhora da Conceição, da casa do Proposto, também com obrigação de missas
e com administradores que moram nos subúrbios desta mesma vila, a de São Nicolau,
com irmandade, todas estas na igreja. No claustro, a de São José, a de Nossa
Senhora do Serviço, também com obrigação de missas. Os altares são o do
Espírito Santo, o do Senhor da Agonia, com irmandade que acompanha os irmãos
defuntos da mesma, o de Santa Ana, estes na igreja. No claustro, o de Nossa
Senhora da Pombinha, o de São Roque, o de São Cosme e São Damião, a capela de
São José acima dita, o altar do Senhor Descido da Cruz, a capela de Nossa
Senhora do Serviço e o altar de Santo André. Tem a igreja três naves e párocos
dois cónegos e juntamente curas, com obrigação de coro, e são da apresentação
do Dom Prior da mesma Insigne Colegiada, e à administração dos sacramentos são
obrigados e mais actos paroquiais, excepto aos enterros dos defuntos, que a
estes vão os padres da coraria que há na mesma Colegiada e vão aos de toda a
vila, e estes padres apresenta o mesmo Dom Prior. E terá de renda cada um dos
cónegos curas, com certos e incertos e emolumentos paroquiais na forma que
foram votados, cada um ano, duzentos e cinquenta mil réis, pouco mais ou menos,
os quais dois cónegos da meia prebenda são da apresentação in solidum do Dom Prior da mesma Colegiada, o qual, quando sucede
vagar algum dos ditos benefícios, o dá a quem lhe parece, e cola e dá jurisdição
paroquial sem dependência do ordinário, por posse antiquíssima e sentenças
alcançadas contra o ordinário deste Arcebispado, porque o dito Dom Prior tinha
e ocupava uma prebenda com a obrigação de a paroquiar e, por súplica que fez ao
Papa, alcançou o poder de dividi-la em dois meios prebendados com a dita
obrigação de administrar os sacramentos e todas as mais declaradas. E a
apresentação do dito Dom Prior desta mesma Colegiada pertence a Sua Majestade
Fidelíssima, quando sucede vagar, e ao ordinário de Braga Primaz apresenta o
dito Dom Prior o provimento que Sua Majestade é servido passar-lhe e este o
manda examinar e cola no dito benefício, de onde lhe resulta a jurisdição que
confere aos ditos cónegos curas, quando os apresenta e cola nos tais benefícios
que, como já disse, antigamente eram uma só prebenda. E o dito Dom Priorado tem
de renda em cada um ano, com certos e incertos, dez mil cruzados, cem mil réis
mais ou menos, com obrigação de pagar e satisfazer as obras meeiras das
igrejas, que apresenta simultaneamente com o reverendo Cabido, e, além disso, a
fábrica das igrejas de São Martinho de Fareja e Santa Eulália de Fermentões,
ambas do termo desta vila, por serem da sua apresentação in solidum. E, também, metade do partido dos músicos da capela desta
Colegiada e, na mesma forma, a seis capinhas que apresenta in solidum para o serviço do clero desta Colegiada, além dos quais
há três capelas das quais apresenta duas e se lhe paga por legado especial que
se deixou ao dito Dom Prior, e a terceira apresenta o reverendo Cabido. E
também é paga por legado que administra a fábrica da mesma Colegiada e também
há no mesmo coro um sub-chantre que apresenta o chantre e lhe satisfaz como
ajusta. Nesta mesma Colegiada há vinte e oito prebendas, as quais ocupam, a
saber, o reverendo chantre, uma, o reverendo tesoureiro-mor, uma, o reverendo
doutor mestre-escola, duas, o reverendo arcipreste, duas, o reverendo
arcediago, uma, e mais quinze cónegos prebendados e oito meios-prebendados, que
todos fazem vinte e seis prebendas, com a obrigação do coro e tudo o que mais
pertence ao ministério dele. Ficam sobejando duas prebendas para a conta de
vinte e oito, as quais uma é da fábrica desta igreja e outra do prebendeiro do
reverendo Cabido, pelo seu trabalho. E rende cada uma delas, em cada um ano,
com certos e incertos, quatrocentos mil réis, pouco mais ou menos, e o
reverendo chantre, além da prebenda declarada, tem anexas ao seu benefício duas
igrejas, que apresenta e de que tem os dízimos, a saber, São Miguel de
Creixomil, subúrbio desta vila, e São Paio de Moreira dos Cónegos, termo da
mesma vila, que ambas renderão, em cada um ano, novecentos e tantos mil réis,
pouco mais ou menos. E o reverendo tesoureiro-mor tem outras duas igrejas
anexas ao seu benefício, que ele também apresenta, a saber, Santa Maria de
Matamá e Santa Eulália de Nespereira, ambas também no termo desta vila, e
renderão, pouco mais ou menos, em cada um ano, seiscentos e tantos mil réis. E
o reverendo mestre-escola tem mais uns foros, que pertencem à capela de São
Tiago, situada na Praça, que renderão, pouco mais ou menos, cada um ano,
cinquenta mil réis. Há mais, nesta Colegiada, seis coreiros para o serviço do
clero, que apresenta o reverendo chantre, como presidente do mesmo reverendo
Cabido e coro. E também há um sacristão que é da apresentação in solidum do reverendo tesoureiro-mor,
a quem paga o ordenado que com ele ajusta, que tem mais, de rendimento, as
ofertas dos defuntos e o rendimento dos sinos que lhe mandam tocar e o folar da
Páscoa, isto por arrecadar e lançar a água benta nessa ocasião. Tem mais esta
Colegiada um benefício simples, chamado arcediago de Santa Maria do Souto de
Sobradelo, que renderá, em cada um ano, quinhentos mil réis, pouco mais ou
menos, e é apresentação sua vacatura de Sua Majestade Fidelíssima e outra do
reverendo Cabido, e as apresentações dos mais benefícios desta Colegiada, são a
saber, o chantre do reverendo Cabido in
solidum, e as mais prebendas são de apresentação simultânea o Dom Prior,
com o reverendo Cabido, alternativamente com o Papa, oito meses deste e quatro
do reverendo Cabido, com o seu Dom Prior. Tem o mesmo reverendo Cabido igrejas
e beneficiados simples, a que chamam raçoeiros, que apresenta in solidum que constarão melhor dos
apresentados, que tudo são no arcebispado e nos seus interrogatórios
responderão. Os padres chamados da coraria, antes declarados, que são da
apresentação do Dom Prior, são o número de trinta, nos quais doze são títulos
assim chamados e entram na isenção da jurisdição desta Colegiada, os quais
ocupam desde o coro, e ordens, e sacristia, e o que servir de prioste, que é o
seu presidente, e estes vão aos ofícios e enterros de toda a vila, tem legados
que satisfazem a fazenda que administram, de caseiros que lhes pagam rendas,
que entre si repartem. E renderá a cada padre com missas e mais assistências,
cada um ano, sessenta mil réis, pouco mais ou menos, com os incertos. É o que
pude alcançar desta Colegiada. Tem mais a confraria de Nossa Senhora da
Oliveira, onde sempre pessoa real é juiz, e os mais da mesa dos principais da
terra e, como serventuários, pessoas ordinárias com honra. Esta tem missas
pelos irmãos defuntos, e também a do Santíssimo Sacramento e as mais
irmandades, conforme seus estatutos e termos.
No distrito desta freguesia estão dois conventos de religiosas, a
saber, o de Santa Clara, de que é padroeiro o morgado de Torrados e são da
jurisdição ordinária suas súbditas, e o de São José do Carmo mais moderno, sem
padroeiro, e lhe deu princípio um mercador chamado Francisco Antunes Torres,
concorrendo com sua fazenda, e as primeiras religiosas foram de um recolhimento
que também está situado nesta freguesia, de recolhidas da Santíssima Trindade,
as quais daí foram, e ainda existem na mesma forma. As religiosas do Carmo,
acima ditas, também são da jurisdição ordinária e no meu tempo o foram dos
religiosos calçados.
Nesta mesma freguesia está a igreja da Misericórdia com seu
hospital. Este está no distrito do de São Paio, ele descreverá suas rendas e
mais particularidades.
Tem no distrito da freguesia capelas, a saber, a de Nossa Senhora
da Graça com irmandade que administra, a de Santa Cruz, com irmandade que
administra, a do Salvador, que é do reverendo Cabido, onde têm os padres da
coraria legados, a de Nossa Senhora do Pilar, mista a umas casas dos
possuidores da comenda em Garfe, a da Senhora da Boa Morte, mista às casas que
hoje são de José Luís de Távora, e têm legado os padres da coraria, a da Embaixada,
mista às casas onde hoje mora o reverendo arcipreste, com legado de missas, a de
Santo Estêvão, com administração de foros e pensões e obrigação de missas, e
hoje é administrador, por graça de Sua Majestade Fidelíssima, Luís António da
Costa Pego de Barbosa, a de São Tiago, da administração do reverendo
mestre-escola desta Colegiada, a do Anjo, com irmandade, que administra, e a do
Menino Deus, mista às casas do Lamelas, de Manuel Peixoto, com legados que
satisfazem os padres da coraria, e também na de São Tiago satisfazem algum.
Misto e pegado à capela do Anjo, há um albergue onde se recolhem os pobres
passageiros três dias e lhes dão agasalho os administradores e sua irmandade,
que são os sapateiros, dando-lhes, naquele, palha para descansarem. E,
falecendo naqueles dias, como também sete mulheres, já de idade, que sempre
estão no mesmo albergue recolhidas com suas casas, o reverendo Cabido os vai
buscar em comunidade, com o cónego cura e os acompanha até à sepultura, por
caridade, e se enterram no claustro desta igreja com o reverendo Cabido e
irmandade.
A estas capelas ou ermidas não há concurso ou romagem, só sim
alguns chamados clamores à de São Tiago e a esta igreja da Insigne Colegiada,
vindo algumas freguesias, com os seus párocos, em vários dias do ano.
Os frutos na freguesia: há algumas terras que ficam nos subúrbios
onde se colhem trigo, milho grosso e miúdo, vinho e legumes de hortaliças.
Tem Paço de Concelho junto a esta Insigne Colegiada ,onde se fazem
as audiências do juiz de fora, juiz dos órfãos e almotacés, e tem Senado de
vereadores e o mais de que se compõe. E tem a vila provedor, corregedor, juiz
de fora e dos órfãos e superintendente dos tabacos. É a vila cabeça da comarca
e termo, como já disse. E desta têm florescido pessoas notáveis em santidade,
letras e armas, o que melhor constará do Estaço, que as escreveu. Nesta
freguesia há uma feira chamada de São Gualter, franca, no Domingo primeiro de
Agosto até à segunda-feira e juntar de bestas. Tem a vila correio que vem ao
Domingo e sai à sexta-feira. Dista esta freguesia da cidade de Braga, cabeça do
Arcebispado, três léguas e da de Lisboa sessenta léguas. Tem esta Insigne
Colegiada aqueles bem conhecidos privilégios das Tábuas Vermelhas, que sempre
os Senhores Reis Fidelíssimos mandaram se guardassem e cada vez mais se ampliam
na mesma vila. Há muitas mais antiguidades e coisas notáveis, que não pude
alcançar para poder com mais individuação dizer, de que o mesmo Estaço dará
cópia.
Não me parece tenha que descrever dos mais interrogatórios, só sim
que os muros de que faço menção que circulam a freguesia são antigos e seguros
e de cantaria e, no distrito da mesma freguesia, ficam algumas torres e uns e
outros não padeceram coisa alguma no terramoto do ano de setecentos e cinquenta
e cinco. Tem nesta freguesia mais a fonte de águas que se encaminham da serra
de Santa Catarina e lançam na Praça de Nossa Senhora, num grande tanque pegado
a esta mesma igreja da Insigne e Real Colegiada. E esta é do padroado do
Fidelíssimo Senhor Dom José Primeiro, Nosso Rei, e foi de seus antecessores. E
sempre veneraram a mesma Senhora e seus privilégios, lhe concederam com mão
liberal rendas e honras, donativos e favores.
E nesta forma satisfiz como pude à ordem de que faço menção no
princípio deste. Mais me ocorre é dizer que na igreja desta freguesia da
Insigne Colegiada existe ainda, metida na parede da nave direita, com umas
grades de ferro, uma pia de pedra tosca, em que foi baptizado o Senhor Dom
Afonso Henriques, primeiro Rei deste Reino de Portugal. E nesta forma, na
companhia de meu companheiro acima declarado, fiz este extracto que ambos assinámos.
Guimarães de Maio 20 de 1758.
Francisco José Vieira de Pina, cónego cura da Colegiada de
Guimarães.
Manuel José Reis da Costa Pego, cónego e cura da Colegiada de
Guimarães.
Oliveira do Castelo, Guimarães Dicionário
Geográfico de Portugal (Memórias Paroquiais), Arquivo Nacional-Torre do
Tombo, vol. 18, n.º 134, p. 745 a 751.
[A seguir: S. Paio]
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