O
que está em causa, no que agora se discute por aí, não é o direito de alguém ganhar a vida com o seu trabalho ou
a faculdade de um cidadão se candidatar em eleições ao exercício de um cargo
político. Esses são direitos inalienáveis. O que está em causa é um processo
que deixa no ar muitas dúvidas que carecem de elucidação urgente, porque
tem a ver com o modo como se dispõe de dinheiros públicos. A demora nos esclarecimentos
que se impõem, em especial no contexto em que estaremos até Outubro, não é saudável.
Até hoje, ainda não consegui entender o racional de se ir
contratar fora, para fazer um estudo, uma entidade da qual não se conhece
especialização nem experiência de relevo na matéria a estudar, quando se tem
dentro de portas quem tenha essas competências, há muito reconhecidas e
demonstradas por longos anos de experiência. Admiti que pudesse estar enganado,
mas o resultado do tal estudo apenas serviu para consolidar o meu
pasmo. Sobre isso já escrevi aqui ("Podendo indicar", indica ou não indica? e Do estacionamento automóvel na área urbana central de Guimarães - contributo para o debate).
As
razões da minha perplexidade vão um pouco para além do que até agora tem sido
dito sobre este assunto. Não têm a ver com o resultado, pobre no conteúdo e
algo descuidado na forma, mas com o processo da encomenda. Isto poderia ser um
desenho (até dava uma infografia muito sugestiva), mas vai no registo mais
simples de uma cronologia. Atente-se nesta sequência, temporalmente contínua,
mas sinuosa nos factos:
17
de Janeiro de 2017 – Constituição da empresa SAM Arquitectos, Lda (informação colhida no jornal online Duas Caras). Um dos seus sócios
é o arquitecto Fernando Seara de Sá , autor do projecto do parque de estacionamento
de Camões-Caldeiroa.
23
de Janeiro de 2017 – O Presidente da Câmara de Guimarães anuncia, em conferência de
imprensa, que
encomendou ao arquitecto Seara de Sá, um estudo de viabilidade para a
instalação de um parque de estacionamento subterrâneo no Largo República do
Brasil e Alameda
Maio
de 2017 – Fica concluído o documento intitulado Estudo
sobre o estacionamento na área urbana Central de Guimarães, pela empresa
SAM Arquitectos.
18
de Maio de 2017 — Governo aprova novas regras para a contratação pública, que tornam
obrigatória a consulta a três entidades para ajustes directos superiores a
20.000 euros
1
de Junho de 2017 — Data da assinatura pelo Presidente da Câmara Municipal de
Guimarães, e pelos sócio da empresa SAM Arquitectos de um contrato de ajuste
directo para a aquisição de serviços designada por “Realização de estudo sobre
estacionamento automóvel na área urbana central de Guimarães”, pelo preço
contratual de 19.750 euros.
5
de Junho de 2017 — Publicitação
do contrato de ajuste directo no portal Base: Contratos públicos online.
22
de Junho de 2017 — A Câmara Municipal de Guimarães divulga e coloca
em discussão pública o estudo sobre o estacionamento na área urbana Central de
Guimarães.
Em
resumo, em 23 de Janeiro de Janeiro, o Presidente da Câmara de Guimarães informou que já tinha
encomendado (sem precisar quando), ao arquitecto Seara de Sá, um estudo, que
ficou pronto em Maio, a que se refere um contrato entre a Câmara e a empresa
SAM Arquitectos (constituída em 17 de Janeiro), datado de 1 de Junho e publicitado
a 5 do mesmo mês no portal BASE (esta publicitação é condição de eficácia para
qualquer contrato desta natureza).
Haverá por aí alguém que, a bem da transparência, nos faça um desenho que nos oriente neste labirinto?
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