A utilização saloia do inglês também é típica destes tempos: porque é que
escrevemos "on-line" quando
não dava trabalho nenhum escrever "em linha"? Olhem em volta para os
anúncios: ele é o "retail park",
o "express shopping",
as férias "low cost"
(esta é particularmente significativa: nenhum português faz férias de
"baixo custo" ou "baratas"; mesmo que as passem na Cova do
Vapor, passam-nas em inglês).
A melhor explicação para esta substituição do português pelo imbecilês é o
novo-riquismo.
Paulo Varela Gomes, “E falar
português, vai desejar”, in Público, 24 de Julho de 2010
O que vai aí acima é um pedaço de
uma crónica de Paulo Varela Gomes, com o título E falar português, vai desejar?, que saiu no Público em Julho de
2010. Quando a li pela primeira vez, lembrei-me de uma história que alguém me
havia contado algum tempo antes e que, contada por quem a contou, só podia ser
verdadeira. Conto-a como ma contaram: aí por 2009, aquando dos trabalhos
preparatórios da Capital Europeia da Cultural de 2012, numa reunião em que
participavam operadores turísticos, alguém bem-intencionado terá afirmado que
um dos entraves à afirmação de Guimarães no mercado turístico internacional resultava
do nome da terra, de articulação reconhecidamente arrevesada para os
falantes de línguas estrangeiras, avançando com a ideia de que se deveria
ponderar a mudança do nome da cidade para um formato mais acessível a
estrangeiros.
Por estes dias, retomei as
crónicas de Paulo Varela Gomes, agora em livro (Ouro e Cinza, da editora
Tinta da China, cuja leitura recomendo). Quando reli esta de que aqui falo,
percebi que todos os anos que já passaram desde que foi escrita não lhe
retiraram actualidade, muito pelo contrário. Nos últimos tempos, a moda de
substituir a língua Camões por barbarismos vem-se tornando numa monomania
nacional. Paulo Varela Gomes classificou-a como manifestação de novo-riquismo,
eu acrescentaria que se trata de uma demonstração de falta de auto-estima e de subserviência,
perfeitamente dispensável, mas de que não faltam exemplos.
Para não ir mais longe, basta
olhar para o que se vai passando em Guimarães, com uma frequência crescente.
Quando a polémica da Torre da Alfândega estava na ordem do dia, um partido da
oposição local avançou com uma proposta para instalação de um “welcome center” naquele monumento.
Passado um mês, foi inaugurado numa das lojas do antigo mercado um “welcome centre”… Eu bem sei que há um
oceano (o Atlântico) a separar um center
de um centre e que já muito se
escreveu sobre o assunto. Mas, seja center,
ou centre seja, será que havia mesmo necessidade
de baptizar o novo serviço de informação a turistas com nome alienígena? Eu sei
que centro de acolhimento é capaz de
não soar muito bem, por trazer à lembrança cenários de refugiados e de outras
catástrofes. Mas, sendo com um léxico tão rico como o nosso, seria assim tão
difícil encontrar-lhe um nome em português, e chamar-lhe centro, casa ou espaço
de boas-vindas? Ou, simplesmente, sala de visitas?
(e depois, vá lá, em letras mais
miudinhas, colocar welcome centre,
welcome center, centro de bienvenida, centre d'accueil, karşılama merkezi, markaz
alttarhib, dobro pozhalovat' tsentr e o mais que lá coubesse, das muitas possibilidades
que o tradutor do Google oferece)
Agora anuncia-se que Guimarães
vai acontecer um (ou uma?) “Green Weekend”.
Segundo a informação divulgada, será acompanhada por workshops e ateliers. Não
se diz se haverá coffee breaks, mas é
certo que não faltará street food. Anuncia-se
que a iniciativa tem o objectivo de “promover a sensibilização e a
consciencialização da comunidade para as questões ambientais”, e eu não tenho
motivos para duvidar que assim seja. Mas, perante tal título, gente que ainda
pense em português é capaz de supor que o “Green
Weekend” vai ser uma iniciativa para
inglês ver.
4 Comentários
Se não é, a iniciativa é grotesca e desprezível.
O docente universitário:"Péssimo o ‘sleeping’, sem lugar para o ‘dreaming’. Ainda envolto pelo ‘bedding’, já está tomado pelo ‘fast-thinking’, mesmo antes do ‘body washing’ e ‘building’. Qual será hoje o seu ‘doing’?
Um qualquer tipo de ‘expertising’, perhaps ‘coaching’ ou ‘scouting’, uma vez que ele detesta o ‘teaching’. E não sabe se terá tempo para o ‘eating’, o ‘fitting’ e o ‘jogging’, muito menos para o ‘reading’ e o ‘meaning’, tão pressionante é a necessidade do ‘paper publishing’.
Gostaria de aceder a algum ‘money saving’ nesta era de tanto ‘money laundering’. Eis o meu ‘feeling’: nunca acertará com o ‘timing’; e, no final, todo este frenético ‘living’ traduzir-se-á em ‘nothing’. Esta elegante achega veio de um meu eterno professor de ética e traduz bem o cotidiano nestas instituições...