As Gualterianas de 1910 na revista O Ocidente


Das Festas Gualterianas de 1910 reza a reportagem da revista O Ocidente, ilustrada com fotografias de Pereira Cardoso. Aqui fica.

Festas gualterianas em Guimarães
Continuam as romarias do Minho a movimentar e a alegrar aquela, já de si, risonha província, a região mais linda do nosso Portugal, pela beleza dos seus campos, pelo pitoresco de suas povoações, pelo caprichoso e colorido dos trajes das suas mulheres airosas, de boas formas, cheias de vivacidade e de energia.
Ontem era a romaria de S. Torquato, a que nos referimos no penúltimo número, hoje são as festas gualterianas em Guimarães, uma festa mais profana do que religiosa, apesar de ser em honra de S. Gualter, o santo frade franciscano, que para ali veio residir em tempos de D. Afonso II (século XIII), e cujas relíquias se guardam em túmulo, na sua capela do convento de S. Domingos*.
O venerando burgo, berço da monarquia portuguesa, nunca, porém, se engalanara em tão ruidosas e luxuosas festas, como nos últimos anos, para comemorarem o santo franciscano, festas que de ano para ano, têm aumentado em brilhantismo e riqueza, como outras se não fazem em todo o Minho, e de toda a província e mais terras ali acode gente, de tal forma, que a cidade perde a sua pacatez habitual e adquire extraordinária animação, que muda completamente seu aspecto, tornando-se mais bela com as pompas da festa, que este ano atingiram o maior entusiasmo. As ruas e largos encheram-se de forasteiros, atraídos pelo programa da festa que lhes oferecia os maiores atractivos, e que, diga-se em verdade, excedeu toda a expectativa.
A comissão promotora destas festas, em que boa parte cabe à Associação Comercial, caprichou em lhes imprimir o maior brilho, muito principalmente com a Exposição Industrial e Agrícola, que tinha a vantagem de reunir o útil e o agradável.
De facto nada mais digno de se apreciar do que os produtos da indústria local, em que se estacava a moderna marcenaria a par dos tradicionais linhos de Guimarães com os seus atoalhados de primeira ordem e das afamadas cutelarias e outros artefactos de apreço. Os produtos agrícolas, espécimes preciosos que abonam o abençoado solo em que são criados e cuidado do agricultor, observando-se em tudo isto notável progresso e dedicação pelo trabalho.
Outra exposição havia para visitar no grande salão da Sociedade Martins Sarmento, o dedicado e sábio arqueólogo que deixou seu nome ligado a uma das mais belas instituições científicas do país e de Guimarães. Era uma exposição de valiosos quadros a óleo, carvões e aguarelas existentes naquela cidade, figurando entre outras, obras de Vieira Portuense, Domingos António Sequeira, artistas portugueses de reputação em todo o mundo civilizado.
Se isto eram já suficientes atractivos para convidar o forasteiro, não menores eram aqueles que a cidade toda em festa oferecia a quem a visitava. As ruas, decoradas com muito gosto, apresentavam o mais agradável aspecto, realçado pelas senhoras de Guimarães, bem conhecidas por sua proverbial formosura, que apareciam pelas janelas, donde pendiam ricas colchas de custosas sedas antigas e bordadas, que bem iam com a beleza das damas que sobre cilas se debruçavam donairosamente.
Os festivais no jardim, pela tuna dos Empregados do Comércio do Porto; o exercício dos bombeiros; as touradas; a marcha milanesa, uma novidade de efeito fantástico, pelo bem combinado da composição, em que pela primeira vez apareciam entre os carros alegóricos de grande fantasia e surpresa, figuras com movimentos e interiormente iluminadas, uma inovação surpreendente; os concertos por bandas regimentais e outras; os fogos de artifício de lindo efeito, como só em o norte os fazem; as iluminações à moda do Minho, cuja fama chegou até ao sul, onde também já se apreciam; finalmente uma festa esplêndida que teve a cidade de Guimarães três dias em regozijo público e lhes trouxe um movimento extraordinário para o seu comércio, que é sempre a principal mira e lado prático a que se aspira, e cremos que desta vez com óptimos resultados, em vista da extraordinária concorrência de forasteiros na cidade como há muitos anos não sucedia.
No ultimo dia dos festejos, realizou-se a distribuição dos prémios aos expositores, no Campo da Feira, e a batalha de flores, em que apareceram bastantes carros e automóveis lindamente enfeitados, destacando-se a riqueza de muitas toiletes que mais fazia realçar a beleza das damas que, com sua extrema elegância e grande animação, deram a este número do programa um completo êxito.
As festas gualterianas marcam, indubitavelmente, uma nova fase na histórica cidade de Guimarães, que se sente rejuvenescer aos impulsos do progresso, no grande desejo de se modernizar como o vai provando com as suas esplendorosas festas.
O Ocidente, n.º 1139, 20 de Agosto de 1910, pp. 187-189
*É lapso. Deve ler-se S. Francisco.
1. A cidade de Guimarães

2. A exposição

3. Galeria do pavilhão da indústria

O Campo da Feira

A batalha das flores
 Fotografias de Pereira Cardoso

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