Sermão da festa de S. Dâmaso, padroeiro de Guimarães, de 1648 |
21 de Agosto de 1725
Provisão régia para que aos vereadores se lhes levasse em conta 99$360 réis
que no ano próximo passado de 1724 despenderam nas festas e procissões que por
uso e obrigação a Câmara fazia e eram: Visitação de Santa Isabel, Anjo
Custódio, Corpo de Deus, S. Sebastião, S. Dâmaso, véspera do Espírito Santo, e
esta por voto antigo que o povo fez num ano de pestilência que houve na vila e
arredores fazendo um andor de cera que ofereciam a Nossa Senhora, que se chama
a Candeia, e ao altar do Espírito Santo, que se acha na Colegiada; procissão
pela aclamação de D. João IV e procissão pela vitória de D. João I em
Aljubarrota a 14 de Agosto, em cujas festas havia missa solene, sermão e
música, mas que nos anos seguintes não fizessem com tais actos maior despesa do
que a quantia de 70$000 réis, atendendo ao estado presente, e a não deverem
despender coisa alguma com a festa de S. Dâmaso, como até agora faziam, por ser
própria do Cabido e não da Câmara; e também não autorizando levarem em conta
algumas esmolas e despesas que a Câmara dizia mandava fazer em utilidade
pública e que todos os provedores lhe costumavam aprovar por ser uso
antiquíssimo.
(João Lopes de Faria, Efemérides
Vimaranenses, manuscrito da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, vol.
III, p. 167)
Antigamente, as Câmaras estavam obrigadas, por imposição régia, a
assegurar a celebração de diversas festividades religiosas, onde as solenidades
religiosas se misturavam com manifestações de carácter lúdico e recreativo. A
mais importante era a festa do Corpus Christi, que incluía missa solene, sermão,
música, uma procissão, danças, folias e touradas. Como se percebe pela leitura
da provisão de D. João V de 21 de Agosto de 1725, no final do primeiro quartel
do século XVIII, a Câmara participava, todos os anos, em oito festas religiosas
com missa, sermão, procissão e divertimentos para o povo: Visitação de Santa
Isabel, Anjo Custódio, Corpo de Deus, S. Sebastião, S. Dâmaso, véspera do
Espírito Santo (procissão da Candeia), além de procissões comemorativas da
aclamação de D. João IV e da vitória de D. João I na Batalha de Aljubarrota. A
estas, haverá a juntar, pelo menos, a festa da padroeira da vila, que acontece
a 15 de Agosto.
Guimarães tem como padroeira a Senhora da Oliveira ou Santa Maria de
Guimarães, que figura no brasão do concelho. No entanto, não faltam referências,
nos tempos que correm, a S. Gualter como o padroeiro de Guimarães. Para o
perceber, basta ler as notícias que saíram a propósito da última edição das
Festas Gualterianas. Em boa verdade, no passado, S. Gualter era assinalado
fundamentalmente com uma feira de gado e espectáculos. Em algumas alturas, como
sucedia entre finais do século XVI e meados do século XVII, havia também solenidades
religiosas que incluíam uma procissão. Note-se que S. Gualter é santo porque, como nota a . diocese de Braga,
foi canonizado pela tradição popular vimaranense. Nunca o foi pela Igreja, não tendo corrido qualquer processo de beatificação ou canonização
deste frade franciscano.
Se a Senhora da Oliveira é padroeira
de Guimarães e se S. Gualter tem a mesma condição, então Guimarães tem, não um,
como seria de esperar, nem dois padroeiros, mas sim três, porque S. Dâmaso
também o é. Jerónimo de Almeida, num texto sobre S. Dâmaso, refere-se à tradicional veneração dos
vimaranenses pelo seu amado Padroeiro.
S. Dâmaso viveu no século IV, foi o 37.º papa e, segundo a tradição,
era natural do território onde, mais tarde, nasceu Guimarães. Ao contrário de S. Gualter, a Igreja canonizou-o, declarando-o formalmente como santo. Em Dezembro de 1640, tendo como prior Dom
João Lobo de Faro, a Colegiada decidiu tomar S. Dâmaso para padroeiro da sua
igreja. Em 1647, o mesmo prior pediu ao rei que mandasse que os seus representantes
no concelho, assim como os membros da Câmara, passassem a assistir às solenidades
com que celebram S. Dâmaso, assim como o faziam nas outras festas a que estavam obrigados. O rei assim fez, através de um alvará emitido no
dia 18 de Dezembro de 1647, com a justificação de ser esta devoção mui devida à solenidade do dito Santo e conveniente
conservar-se por autoridade a provável opinião de ser a dita vila de Guimarães
a pátria do mesmo Santo.
A festa a S. Dâmaso do ano de 1648 foi promovida pela Câmara. O sermão
esteve a cargo de Frei Tomás Barreto, tendo sido publicado com a seguinte
inscrição no frontispício:
Sermão do glorioso S. Dâmaso, Papa
natural e padroeiro da mui nobre Vila de Guimarães: na festa, que a Câmara da
mesma vila lhe fez por ordem de Sua Majestade, como padroeiro seu no Ano de
M.DC.XXXXVIII [1648], que pregou o
padre Frei Tomás Barreto religioso da Ordem dos Pregadores, e leitor de Teologia
moral na Magistral da Real Colegiada da mesma Vila. Dedicado ao Ilustríssimo e Reverendíssimo
Senhor Dom João Lobo de Faro digníssimo Dom Prior da Insigne, Real Colegiada de
Guimarães. Impresso por ordem de Manuel Ribeiro Botelho Escrivão do Armazém de
mantimentos de Sua Majestade, Tio do dito Religioso. Em Coimbra: na oficina de
Manuel de Carvalho Impressor da Universidade Ano de M.DC.XXXXXI [1651].
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