S. Nicolau |
Não temos notícia das festas a S. Nicolau de 1939.
1940 foi o ano da celebração dos centenários da Fundação de Portugal e da
Restauração da Independência. Guimarães foi um dos principais centros das
celebrações nacionais, tendo-se aformoseado
para as festas. Entretanto, a Europa estava em guerra. De tudo isto falava
o pregão de 1940, escrito, uma vez mais, por Delfim de Guimarães e recitado por
Augusto Maria Peixoto Sampaio de Bourbon da Cunha e Castro.
BANDO
ESCOLÁSTICO
Recitado em 5
de Dezembro do Ano Áureo de 1940
pelo Académico
do 5.° ano
Augusto Maria
Peixoto Sampaio de Bourbon da Cunha e Castro
No mundo há a
expressão vincada do terror!
É a Terra, Mar
e Céu batidos do fragor
Das bocas dos
canhões, hiantes, colossais,
Que vomitam a
morte em uivos infernais!...
É o Invento do
Homo, a Ideia, a Inteligência,
É o Estudo
profundo, o Génio e a Ciência,
É tudo em
vagalhões de raiva desmedida,
É tudo em
convulsões — destruição da Vida!...
Quando é que a
voz de Deus nos bradará: — Parai,
Ó loucos da
ambição!?... Já basta!... Recuai,
Petrificai o
ódio, ó gentes sanguinárias,
Esse ódio que
já vem de entranhas milenárias!?...
Ó olhos que
chorais, ó lágrimas ardentes
Das Viúvas,
das Mães, das Noivas e Inocentes
Crianças da
Orfandade: onde virá a Hora?!...
Quando é que
surgirá no mundo inteiro a Aurora
Do Sentimento
Puro e Dúlcida Bondade?!...
Quando é que
se unirá para sempre a Humanidade
No inefável
Amplexo, abraço universal,
Que extinguirá
na terra a Peste, a Guerra, o Mal?!...
Ó Supremo
Arquitecto, ó Deus de todos nós:
Que venha ao
mundo a Paz, que se ouça a tua Voz!
*
* *
A Araduca revive em seu Poder estranho
A Fundação da Pátria, a altivez de Antanho!
Sobreleva a Bandeira a Torre de Menagem!
Numa ascensão
de Luz desenha-se a imagem
Duma Pátria Maior e fala o Chefe ao povo
Enaltecendo a Pátria, a Grei, o Estado Novo!
E o sol rutila
mais. o sol tem mais fulgores,
Quando oscula
o Cortejo em mil milhões de flores!
*
* *
Vede as tendas
de guerra erguidas nos outeiros!
A trombeta
chamou à liça os cavaleiros:
E todos, em
acção, erguendo alto a cerviz,
O velho Lidador, D. Paio, Egas
Moniz,
D. Rui Gonçalves, Elcha,
Hilarião, Froylaz,
Fernão da Maia, o moço intrépido, audaz,
E tantos,
tantos mais, armados de aço e ferro,
Vencem era S. Mamede o Conde intruso e perro!...
Depois aclamam
Rei o valoroso Infante
Numa alegria
doida, imensa, delirante!
É a turba a uma
voz: Rial! Rial! Rial!
Por D. Afonso Rei, o Rei de Portugal!
A Araduca revive em seu Poder estranho
A Fundação da Pátria, a altivez de Antanho!
*
* *
Outro Padrão soberbo: a nossa Independência!
Pertence à Capital! e a sua aurifulgência
O assinala,
exalta em rasgos de Firmeza!
— É a Raça que não morre, é a Raça Portuguesa!
*
* *
Alfim: a Exposição do Mundo Português!
É a nossa História Pátria ungida de altivez!
É um Milagre de funda e rara concepção,
De gosto
singular, fervor, realização!
Dum lado o Tejo a abrir à Cruz de Cristo a estrada,
Doutro lado o Mosteiro, a Obra rendilhada
De beleza sem
fim! Belém! Santa Maria!
É o conjunto
da Luz, do Sonho, da Harmonia!
Conquistas duma Raça, os seus Descobrimentos,
Tudo ali se
unifica em grandes Monumentos!
A Luta, o Sacrifício, a Fama, o Heroísmo,
A Alma forte Lusa, o seu Patriotismo!
A humildade da gleba, as casas das aldeias
Beijadas pela
luz votiva das candeias!
A maravilha
eterna em telas de pinturas,
Um paraíso de Arte em obras de esculturas!
É aí, em cada Sala e vastos Pavilhões,
Que nos falam
mais alto os Versos de Camões!
*
* *
Agora pouco
falta... Apenas mais três dias...
A nossa terra
vai, num fulcro de alegrias.
Levantar um Cruzeiro, aos céus, com imponência,
Que marcará
eterna a nossa Independência!
*
* *
A Crítica morreu!... Com ela os Comentários
Tombaram um a
um... À Luz dos Centenários
Iluminou-se o Senso e hoje é diferente
Do senso
repontão, má-língua, irreverente!...
E crítica para
quê?!... A casa é arrumada...
A Estação, olhai-a: ao alto, espanejada,
Já nem parece
a mesma!... Asseio!... Que limpeza!...
No Castelo não há pedintes nem pobreza!
Aquela linda Igreja, ali, em S. Domingos,
Foi restaurada
a bem, sem zangas, sem respingos!...
Mata-Diabos, tem palácios em projecto
De mármore
buscado ao monte do Himeto!...
Rua de Gatos foi de novo calcetada,
No bairro de Trás-Gaia a paz é à facada!...
A água, que fartura! há água em profusão!...
Que barata que
está a broa..., o nosso pão!...
Tudo vida
estuante, é a vida era mil fulgores,
Vida que faz a
crise às lojas de armadores!.. s
*
* *
Gentis tricanas vede o que isto em nós mudou:
O próprio bom
humor há muito se abalou
E a verve, conformada, arrecadou as falas,
Fechou toda a
alegria e expansão nas malas!...
Tudo se
revirou na forma e contrapasso...
A dança é
muito outra... A valsa é o calhamaço,
A disciplina a
polca e a mazurca o zero...
O estudante de
noje é grave! é mais austero!...
Tricanas não estranheis, nem vós, grisettes loiras,
A falta de
gracejo, a ausência de tesoiras...
*
* *
Senhoras,
perdoai! O galanteio é breve,
Como uma asita
de ave ele esvoaça leve...
É pólen duma
rosa a entontecer a brisa,
É linfa
sussurrante em fio que desliza...
Coisa subtil,
assim: nas pontas dos dedinhos,
Em troca das
maçãs, dos pomos coradinhos,
(E ficará
apagada a sede de desejos)
Mandai-nos de
permuta o mel dos vossos beijos...
*
* *
Estudantes,
alerta! É Nicolau quem manda!
Ele é que vai
reger a formidável banda,
Essa banda infernal de bombos e
tambores!...
Minerva já assinou as cartas de doutores
Para aqueles
que de rijo exibam maçanetas!...
Bacharéis do
futuro, Artistas e Poetas:
O que impera
na Festa, a Festa deste dia,
É a nossa
Mocidade, é o Riso, é a Alegria!...
S. Nicolau é o chefe! Arriba as Nicolinas!
Erguei, erguei
mais alto as Capas e Batinas!
Dezembro do Ano Áureo de 1940.
DELFIM DE GUIMARÃES.
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