Morte de S. Nicolau |
Diz-nos O Comércio de Guimarães que, além do pregão
que foi recitado, houve “um outro que foi distribuído, original do snr.
Jerónimo de Almeida, o que tinha muito valor por ser feito por um estudante
vimaranense”. E, no Imparcial,
escreveu-se: “O nosso amigo sr. Jerónimo de Almeida, inteligente moço já
conhecido pelas suas mimosas produções poéticas, fez imprimir e distribuir
profusamente pela cidade um bem feito Pregão,
dedicado as senhoras de Guimarães, o qual tem sido muito apreciado.”
Não sabemos
ao certo (ainda) qual a razão pela qual o pregão que era para ser lido, o de
Jerónimo de Almeida, foi preterido pelo que escreveu Delfim Guimarães. Não foi,
seguramente, por falta de merecimento da obra do jovem Jerónimo de Almeida, à
altura com 21 anos de idade e já com obra poética publicada. Com este, Jerónimo
de Almeida escreveria 13 pregões, o último dos quais em 1969, quando já contava
83 anos de idade.
Os dois
autores dos textos de 1907 viriam a revelar-se especialmente produtivos: à sua
conta, assinariam mais de metade dos pregões que foram recitados até ao ano de 1950.
BANDO ESCOLÁSTICO
JERÓNIMO AUGUSTO DE ALMEIDA
IMPRESSO NA TIPOGRAFIA GUISE, EM GUIMARÃES
NO ANO DE MDCCCCVII
Dedicado
Às senhoras Vimaranenses
(Este bando devia ser recitado no dia 5 de
Dezembro de 1907,pelo académico Francisco Xavier de Albuquerque Dias; mas por
motivos particulares não o é, em virtude do que o mandei imprimir e publicar.)
Pátria de
Mumadona, Araduca de outrora,
Vimaranes
depois e Guimarães agora;
Berço de
heróis, sábios, santos e poetas,
Cuja memória
doira as nossas capas pretas;
Bizarra
flor-de-lis de heráldica nobreza,
Que embalou
ao nascer a com a da realeza;
Eu te saúdo
a par com a deusa Minerva!
As ruas se
varreram e cortou-se a erva,
Para poder
passar o cortejo do Bando,
Que a fim
do.o recitar, pára de quando em quando.
Ó Santo
NicoIau, acena com um lenço.
Lá do alto
do Céu. para a terra de Afonso,
Contente de
nos veres alegres como dantes,
Aos homens
do futuro, a nós os estudantes,
É esta festa
anual realizada em teu nome;
Eu sei
quanto por ti a gente se consome!
Mas que
importa se nós somos de seda e aço
E pomos a
teu lado um coração e um braço?...
O progresso
abalou Guimarães, é um ciclone!
E agora eu
vou servir aqui de cicerone,
Para vos
mencionar cada melhoramento;
— Em lugar
de honra está o grande monumento,
De
encantador estilo na arte bizantina,
Erguido e
burilado em branca pedra fina,
Com três
amplas janelas, cujos belos nichos
Demoram
muito tempo os nossos olhos fixos
Naquelas
seis mulheres simbólicas e airosas,
Com diademas
e colares de pedras preciosas,
(Trabalho
excepcional do artista primoroso,
Que o seu
nome firmou ali — Abel Cardoso)
Nenhuma
força humana a glória fere ou bane-a
De Sarmento,
esse sábio arqueólogo da Citânia!
Fica a
perder de vista o octógono arcaico,
Que há-de
ter brevemente um passeio a mosaico,
Para
perpetuar-se ao centro, sobranceiro,
O mastro mais gigante, o nosso bom pinheiro...
Em ruas não
falar! isso vai muito além!
A de Paio
Galvão prolonga-se a Azurém...
Um largo se
alargou, no abrir duma porta,
Lavrou-se a
terra… e falta só plantar a horta!
De mais
utilidade e de melhor ideia,
É o novo e
importante edifício da Cadeia,
Que se vai
construir junto à rua de Arcela,
De janelas
com grade e grades sem janela…
Ia-me já
esquecendo das máquinas novas,
Cujos apitos
se ouvem de Paçô a Covas!
E instou-se
para o governo ao telégrafo sem fio,
Palácio com rei, Sé com bispo e ponte com
rio…
Felicito por
isso a câmara actual,
Que quer
desafiar a grande Capital!...
Dandismo do balcão, agora é que é o goza
Manda a lei
do descanço aos domingos fechar:
Puxai pelos
cordões, nada de economias,
Usai com
liberdade as novas regalias,
Porque em
qualquer domingo, o que à semana ganha,
Vai a Fafe
em comboio e automóvel à Penha!
Mas isto não
bastou, queríeis pintar a manta,
E ao
passardes ali perto da Fonte-Santa,
Uma dor vos
feriu de saudades atrozes,
— A sede a
pedir vinho e a fome a pedir nozes...
Voltastes para baixo imersos na tristeza,
Indo dar com
o nariz nas portas da Havaneza!
Depois
disto, depois, — ò lei que foste lei! —
De maneira
que eu francamente não sei
E nem quero
saber, faço uma cruz na boca,
Para não
proferir qualquer palavra louca
Capaz de
melindrar-vos ou merecer-vos crítica
Visto que eu
não percebo nada de política…
. . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Tricaninhas vou lá? Cantai-me aqui ao pé,
Todos as
trovas do balancé! balancé!
[imitando a voz das tricanas]
Tenho na
minha gaveta
Cinco réis
há tanto tempo,
Para dar ao
João Franco
No dia do
casamento!
Como é doce
essa voz de penas tão macias!
Que nome
têm! São todas Rosas e Marias?
Gosto de
ambas, confesso a fraqueza do amor;
Mas se o meu
coração a amar-vos é maior
Do que o
oceano, e tem as marés como ele...
Dai-nos das
vossas bocas os favos de mel,
Que andamos
procurando assim como as abelhas.
Para
beber...beber… nessas bocas vermelhas!
Senhoras,
que escutais a voz dum estudante,
Devia-vos
cantar a inspiração do Dante
Retratar-vos
depois o pincel de Rembrandt,
E amar-vos...
isso só o nosso coração!
Tranças da
noite escura e tranças fulvas de oiro.
Nenhum
milionário tem melhor tesoiro
Que o dos
vossos anéis feitos de luz e treva,
Ó netas do
luar! ó meigas filhas de Eva!
Brancos
lírios do mais puríssimo perfume,
Quantas
flores dessecando às vezes de ciúme,
Contemplando doridas a beleza vossa!...
Minha alma
entristecida em mágoas, remoça
E começa a
sentir o infinito dilúvio
Desses
olhares que são o mais suave eflúvio!
Recebei este
Bando em preito de amizade,
Como recordação
da nossa mocidade.
Good-bye! Good-bye! Laus-Deo pelo meu
discurso!
Avante
companheiros, no usual percurso!
Se quereis
ir tomar o five ó clock tea,
Afinai bem o
dó, ré, mi,fá, sol, lá, si...
Muitíssimo
compasso, assim a quatro tempos,
Nas caixas
infernais! nos bombos turbulentos!
Um hino
atroador, de todo o fogo à prova,
Para a
música relha se enterrar e a nova!!
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