Das Nicolinas (10)



[continua daqui]


A roubalheira ou o rapto das tabuletas



Um dos números menos consensuais do programa das Festas Nicolinas é o das Roubalheiras, que consiste no furto de tabuletas, vasos de flores e outros objectos que se encontravam mais à mão de semear. Os objectos retirados pelos estudantes dos lugares respectivos eram levados para o Toural, onde ficavam a adornar o pinheiro. Este acto acontecia na mesma noite das posses (4 de Dezembro) e realizou-se, pela primeira vez, aquando da restauração das Nicolinas em 1895. Nesse ano, o jornal "Religião e Pátria" noticia umas inofensivas brincadeiras de rapto de tabuletas, vasos, mesas, etc. que na manhã de 5 se viam fazendo bric-a-brac em volta do pinheiro. Nos seus primórdios, esta tradição era conhecida pelo título sugestivo de rapto das tabuletas, por serem os letreiros que se encontravam às portas das lojas, dos serviços e dos profissionais liberais as principais vítimas dos furtos. Mas também não faltavam os bichos de capoeira. A designação roubalheiras é quase tão antiga como aquela, embora menos generalizada nos seus primeiros anos.


A roubalheira resulta da adaptação em meio urbano de uma antiga tradição do mundo rural minhoto, levada à prática por altura das festas dos santos ditos populares, em especial durante os festejos a S. Pedro, também conhecido em terras próximas da cidade de Guimarães como o dia dos atrancamentos. Por essas aldeias afora, era costume aparecerem, na manhã do dia 29 de Junho, caminhos atrancados com alfaias agrícolas, vasos, utensílios e animais domésticos, desviados dos seus lugares habituais por bandos de rapazes.


Havia quem não apreciasse esta brincadeira dos estudantes. No jornal Independente, de 7 de Dezembro de 1902, defende-se que os estudantes não deviam, com o roubo das tabuletas, desrespeitar a liberdade alheia, quando com tão severas penas pretendem conservar a própria liberdade. Não faltaram, ao longo dos tempos, suspensões e proibições desta prática. Nós discordamos apenas das roubalheiras. Isto não está nas tradições dos festejos nicolinos e, ainda que estivesse, era um número que se devia banir, porque ofende muitas vezes e raro tem graça..., escrevia-se no "Regenerador", de 10 de Dezembro de 1909


As censuras às roubalheiras (e também às posses) eram quase generalizadas. Até o primeiro responsável pelo ressurgimento de 1895, Jerónimo Sampaio, escrevia no "O Comércio de Guimarães", de 11 de Dezembro de 1923:


Os académicos, snr. redactor, apenas podem ser culpados por insistirem em não eliminar do programa das suas e nossas festas, os números das "posses" e "mudanças de tabuletas", números esses que, por vários motivos, não merecem aplausos a gente de senso e boa razão.


Ao longo dos anos, a roubalheira, ora se fazia, ora era suspensa. Depois de muitos anos de suspensão, ressurgiu há alguns anos, com novo figurino: sem dia certo, para evitar que os verdadeiros amigos do alheio se juntem à festa, à imagem do que algumas vezes aconteceu no passado.

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