Das Nicolinas (2)



  
Do mastro ao Pinheiro


As fontes até agora conhecidas são omissas quanto à origem de alguns dos actuais números das festas dos estudantes de Guimarães, nomeadamente quanto àquele que nos tempos que correm mobiliza mais participantes, tendo adquirido uma dimensão que, para muitos, quase o torna sinónimo de Nicolinas: o Pinheiro.

A primeira menção ao acto com que se abrem as festas a S. Nicolau que encontrámos, data de 1822. No dia 28 desse ano, foi publicada uma ordem do intendente-geral da polícia, apregoada publicamente através de um bando, através da qual se interditavam as máscaras no dia de S. Nicolau. Não obstante, houve alguns estudantes que infringiram aquela disposição policial, saindo mascarados à rua no dia 6 de Dezembro.


Os estudantes recorreram para o rei da ordem do intendente, através de uma representação (petição), que o rei acolheria, através de uma portaria de 12 de Dezembro, em que autorizava os estudantes a mascararem-se. A notícia desta decisão foi celebrada em Guimarães no dia 18, tendo os estudantes erguido a sua bandeira no Toural, com acompanhamento de foguetes e repiques de sinos. A vila iluminou-se, como costumava acontecer nos dias festivos e recitaram-se versos. Nessa noite, organizou-se uma encamisada (folia de mascarados) de estudantes, com grande acompanhamento de povo, onde não faltaram os vivas a D. João VI.


Ou seja: na mais antiga referência ao pinheiro (mastro ou bandeira) dos estudantes, que até agora conseguimos encontrar, o seu levantamento aconteceu, não no dia 29 de Novembro, mas a 18 de Dezembro.


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2 Comentários

Francisco Brito disse…
Caro Amaro das Neves,

É sabido que, ao contrário do que se costuma afirmar, as Nicolinas tem sofrido diversas mudanças. Contudo, o facto de não sabermos a origem de alguns números, a sua antiguidade e de desconhecermos outros aspectos não invalida que as Festas de S. Nicolau possam ser Património Oral e Imaterial da Humanidade. Isto porque, na verdade, as festas cumprem muitos dos requisitos necessários a esta “distinção”. As Festas de S. Nicolau contêm aspectos relacionados com práticas sociais, rituais e eventos festivos (http://www.unesco.org/culture/ich/index.php?lg=en&pg=00055)que se enquadram no que é pedido pela UNESCO para o POIH. Temos o pregão, as posses (?) e as cerimónias religiosas como alicerces da tradição. E depois temos outros números que não devemos menosprezar, como as maçãzinhas (que já era considerado um número tradicional em 1850), as representações teatrais, etc. E ainda temos o Pinheiro, o número mais popular das nicolinas. Não sendo um dos números mais antigos, de onde vem a tradição de erguer um pinheiro nesta altura do ano? E a música, de onde vem um ritmo que se ouve por vezes nas aldeias vizinhas e até fora de Guimarães?

Faltam estudos, é verdade. Sabemos que o S. Nicolau já era celebrado nas Universidades Portuguesas desde o século XVI. Será que esse culto passou a Guimarães e que Guimarães foi a única “academia” que o manteve?

O que sabemos hoje sobre as festas de S. Nicolau em Guimarães é que remontam ao século XVII. Mantiveram-se algumas tradições e adulteraram-se outras. O que é certo é que as festas conseguem, com os seus vários números, não só dar continuidade a uma tradição com vários séculos (festas dos estudantes) mas também incluir nessas festas uma serie de tradições da nossa região cuja origem se perde no tempo…

Um abraço

Francisco
Meu caro Francisco,

Confesso que já fui mais céptico quanto à possibilidade das Nicolas virem, um dia, provavelmente não tão próximo quanto há uns anos se esperaria, a integrar a lista de património oral e imaterial da UNESCO. E, o facto de não conhecermos bem a sua história em todos os seus pormenores não será obstáculo ao sucesso de uma candidatura: as nicolinas não serão escolhidas por aquilo que foram, mas sim por aquilo que são (ou, melhor, pelo que forem no momento da aprovação da candidatura).

Daquilo que referes, há um aspecto importante que ainda está mal trabalhado: o dos estudos comparados, nomeadamente com as tradições de S. Nicolau que existiram (muitas delas ainda persistem) por essa Europa afora. É que nos tempos centrado tanto na ideia da originalidade das nicolinas que descuramos as afinidades que as festas dos estudantes de Guimarães têm com tantas outras tradições dentro e fora do nosso país.