A polémica em curso acerca do nascimento de D. Afonso Henriques não é uma querela científica, dirimida entre historiadores, mas uma construção mediática, carregada de efabulação, de citações e referências a obras que não se leram ou que não existem, de colocação de afirmações na boca de quem não as proferiu, a par de um manifesto aproveitamento político desta questão tese.
Já aqui vimos que José Mattoso, na sua biografia de Afonso Henriques, considera admissível a tese do nascimento em Viseu daquele que seria o primeiro rei de Portugal. Mas também diz que, para uma questão como a do nascimento de Afonso Henriques, “não há certeza alguma, apesar da afirmação que Almeida Fernandes pôs nas suas próprias afirmações”. Em presença desta posição, é manifestamente abusivo dizer-se que “a tese de Almeida Fernandes é também defendida pelo historiador José Mattoso”, como se lê na edição online do jornal Expresso.
Na mesma notícia do Expresso leio, aliás, a seguinte informação, demonstrativa da falta de rigor com que estas questões são tratadas, mesmo em órgãos de comunicação social ditos de referência: “Diogo Freitas do Amaral, natural de Guimarães, escreveu um romance histórico sobre D. Afonso Henriques e aponta a cidade minhota como o berço da nacionalidade”. Num curto texto, duas inverdades: Freitas do Amaral não é natural de Guimarães e, que se saiba, nunca escreveu qualquer romance histórico sobre Afonso Henriques.
No espaço mediático vai passando a ideia de que “hoje existe um conjunto de medievalistas reputadíssimos a subscrever a tese”, como se houvesse uma espécie de abaixo-assinado a correr no meio científico, subscrevendo as conclusões a que chegou Almeida Fernandes.
Ora, o que disseram os medievalistas que se pronunciaram sobre a questão, na sequências da injecção de credibildiade que lhe foi introduzida por José Mattoso?
Bernardo Vasconcellos e Sousa disse crer “que a hipótese de Viseu é a mais provável". Maria Alegria Fernandes Marques constatou que, depois de longos anos de silêncio, a “hipótese colheu ecos, favoráveis". João Silva de Sousa afirmou que a obra de Almeida Fernandes está na origem da “hipótese, a mais credível, penso, de D. Afonso Henriques ter nascido em Viseu”. António Matos Reis declarou que aquela “é, de todas as teses sobre a data e o local do nascimento de D. Afonso Henriques, a mais provável”. Marsilio Cassotti escreveu que “é possível o nascimento de D. Afonso Henriques em Viseu”. Por último, António Borges Coelho disse, na TV um dia destes, que “Viseu é, quase, com muita probabilidade a terra de nascimento de D. Afonso Henriques”.
Nenhum daqueles autores afirma positivamente, como o afirmam os títulos dos jornais, que Afonso Henriques nasceu em Viseu. Todos falam em hipótese, em probabilidade, em possibilidade, mas nunca em certeza.
Pois é: Viseu “é quase” o berço de Afonso Henriques. O problema é que, à tese de Almeida Fernandes, falta um imprescindível quase: o suporte das fontes históricas.
De Afonso Henriques já havia o mito. Agora, há a mistificação.
Já aqui vimos que José Mattoso, na sua biografia de Afonso Henriques, considera admissível a tese do nascimento em Viseu daquele que seria o primeiro rei de Portugal. Mas também diz que, para uma questão como a do nascimento de Afonso Henriques, “não há certeza alguma, apesar da afirmação que Almeida Fernandes pôs nas suas próprias afirmações”. Em presença desta posição, é manifestamente abusivo dizer-se que “a tese de Almeida Fernandes é também defendida pelo historiador José Mattoso”, como se lê na edição online do jornal Expresso.
Na mesma notícia do Expresso leio, aliás, a seguinte informação, demonstrativa da falta de rigor com que estas questões são tratadas, mesmo em órgãos de comunicação social ditos de referência: “Diogo Freitas do Amaral, natural de Guimarães, escreveu um romance histórico sobre D. Afonso Henriques e aponta a cidade minhota como o berço da nacionalidade”. Num curto texto, duas inverdades: Freitas do Amaral não é natural de Guimarães e, que se saiba, nunca escreveu qualquer romance histórico sobre Afonso Henriques.
No espaço mediático vai passando a ideia de que “hoje existe um conjunto de medievalistas reputadíssimos a subscrever a tese”, como se houvesse uma espécie de abaixo-assinado a correr no meio científico, subscrevendo as conclusões a que chegou Almeida Fernandes.
Ora, o que disseram os medievalistas que se pronunciaram sobre a questão, na sequências da injecção de credibildiade que lhe foi introduzida por José Mattoso?
Bernardo Vasconcellos e Sousa disse crer “que a hipótese de Viseu é a mais provável". Maria Alegria Fernandes Marques constatou que, depois de longos anos de silêncio, a “hipótese colheu ecos, favoráveis". João Silva de Sousa afirmou que a obra de Almeida Fernandes está na origem da “hipótese, a mais credível, penso, de D. Afonso Henriques ter nascido em Viseu”. António Matos Reis declarou que aquela “é, de todas as teses sobre a data e o local do nascimento de D. Afonso Henriques, a mais provável”. Marsilio Cassotti escreveu que “é possível o nascimento de D. Afonso Henriques em Viseu”. Por último, António Borges Coelho disse, na TV um dia destes, que “Viseu é, quase, com muita probabilidade a terra de nascimento de D. Afonso Henriques”.
Nenhum daqueles autores afirma positivamente, como o afirmam os títulos dos jornais, que Afonso Henriques nasceu em Viseu. Todos falam em hipótese, em probabilidade, em possibilidade, mas nunca em certeza.
Pois é: Viseu “é quase” o berço de Afonso Henriques. O problema é que, à tese de Almeida Fernandes, falta um imprescindível quase: o suporte das fontes históricas.
De Afonso Henriques já havia o mito. Agora, há a mistificação.
13 Comentários
E qual é o "suporte das fontes históricas" para a tese de que Afonso nasceu em Guimarães?
Quanto ao que pergunta, se tiver paciência de ler tudo o que aqui já se escreveu sobre Afonso Henriques, verificará que não encontra nenhuma afirmação nossa de que nasceu em Guimarães. Porquê? Porque não há nenhuma evidência nas fontes históricas coevas que permita sustentar tal afirmação. É essa a grande diferença em relação aos que afirmam positivamente que Afonso Henriques nasceu em Viseu. Também aí, apesar do que escreveu Almeida Fernandes, e como já aqui demonstramos, não há nenhuma fonte documental que permita dizer que Afonso Henriques lá nasceu.
O que tem Guimarães, e Viseu nem sequer isso, é uma tradição de muitos séculos e muito afirmativa, com suporte nas crónicas que se escreveram sobre o primeiro rei, que coloca em Guimarães o nascimento de Afonso Henriques.
também existia "uma tradição de muitos séculos e muito afirmativa" de que a Terra era o centro do Universo.
As tradições podem servir para formular as tais hipóteses de que fala, mas não se substituem às hipóteses. E eu uso o caminho inverso - a teoria conduz à hipótese e à sua verificação.
Eu não sou historiador e muito menos entendido na época medieval. Pelo que li no seu post, o que entendo é que há uma tese lógica sobre a possibilidade de nascimento em Viseu. Resulta daí uma hipótese que vários medievalistas reputam de uma "boa" hipótese.
Existe uma outra tese sobre a possibilidade de nascimento em Guimarães. Os mesmos medievalistas consideram esta "teoria" menos lógica, o que não significa necessariamente que seja a errada.
São duas hipóteses, nenhuma delas verificada com sucesso. Resultam de duas teorias diferentes, uma delas mais consistente do que a outra, segundo a opinião dos tais medievalistas. Infelizmente para si, no plano da tese, a balança pende mais para Viseu.
Quanto ao tratamento jornalístico da coisa, não me surpreende, é assim que funciona - há um press release para a Lusa e os outros vão todos atrás, raramente um jornal manda alguém verificar a sustentabilidade do press release. Tenho vários exemplos no meu blogue.
Quanto à hipótese de Viseu, até hoje, só houve um estudioso que a afirmou como certa, Almeida Fernandes. Outros foram dizendo que, com base na interpretação de Almeida Fernandes de documentos medievais, a hipótese era plausível. Não serei eu a negar que seja plausível. Tão plausível como outras, como Coimbra ou Guimarães. Mas, no actual estado de conhecimentos, não tenho nenhuma certeza quanto ao local de nascimento de Afonso Henriques. Não o sei, provavelmente, jamais o saberei. Mas, confesso, isso não é assunto que me inquiete ou que me tire o sono. Esta é, em história, uma questão de lana caprina. O que me irrita é que se pretenda transformar em verdade universal uma simples hipótese, ainda por cima muito mal amanhada, porque assente em leituras retorcidas de documentos históricos, procurando induzir que dizem coisas que, manifestamente, nunca disseram.
Presumo que não terá lido a obra de Almeida Fernandes. Poucos leram, é verdade. Acredito que assim acontece com a maior parte daqueles que lhe tecem comentários ou se penduram à sua boleia. Eu, que já a li, até de trás para a frente, e que também li os documentos medievais em que ele fundamentou a sua obra, verifico que está tão demonstrada a hipótese de que Afonso Henriques nasceu em Viseu, como a de que ele terá nascido nas margens do Rio Jordão, como se narra em anais medievais. A tese de Almeida Fernandes não tem qualquer consistência. Nos documentos coevos, nada a confirma. Mas também é certo que nada a infirma.
O texto que comentou vem na sequência de uma série onde dou conta da minha leitura da obra de Almeida Fernandes a partir da análise crítica dos documentos em que ele se apoia. A minha análise não partiu de nenhuma posição colocada a priori, embora admitisse que a tese de Almeida Fernandes fosse sólida e sustentável, partiu dos documentos. Porque, em História, partimos do documento para a hipótese e desta para a teoria.
Quanto ao modo como se fazem as notícias e à ligeireza com que os assuntos são tratados, estamos conversados. A prioridade e o investimento informativo tem outros interesses, mais palpitantes. Ainda há pouco, no noticiário da SIC da 13 horas, a certa altura, fazem uma ligação em directo para o Algarve. À porta de uma unidade hoteleira, estava uma repórter (e mais toda a parafernália necessária para um directo) que nos deu a palpitante notícia de que Cristiano Ronaldo ainda não tinha sido avistado. Assim se fazem as coisas.
Eu não comento (dum ponto de vista científico) a obra de nenhum historiador. Folheei o livro em causa durante cerca de uma hora e fiquei dele com uma vaga impressão. Mas eu NÃO sou historiador. Recuso-me a admitir que esteja a incluir na «maior parte daqueles que lhe tecem comentários ou se penduram à sua boleia» os historiadores, nomeadamente José Mattoso e os que refere neste post. Ou está? :)
Claro que quando falo nos que se "penduram à boleia" da tese de Almeida Fernandes, sem a terem lido, não me refiro a José Mattoso (por todas as razões, e mais uma: este historiador não disse muito do que têm dito que disse). Refiro-me a políticos e afins que se apropriaram da questão e a transformaram em instrumento para a sua própria afirmação.
Deixe-me lembra-lhe Séneca:
"Veniet tempus quo ista quae nunc latent in lucem dies extrahat et longioris aeui diligentia. Ad inquisitionem tantorum aetas una non sufficit, ut tota caelo uacet: quid quod tam poucos annos inter studia ac uitia non aequa portione diuidimus? Itaque per successiones ista longas explicabuntur. Viniet tempos quo posteri nostri tam aperta nos nescisse mirentur.”
Séneca
(Corduba, 4 a.C. – Roma, 65 d. C.)
in SÉNÈQUE – Questions Naturelles, texte établi et traduit par Paul Oltarmare. Tomo I/III, Paris, Société d’Édition Les Belles-Lettres, 1929, pp 326-327.
Tradução livre: “Virá o dia em que, através de um estudo continuado de muitos séculos, as coisas actualmente escondidas parecerão evidentes e a posteridade se espantará por coisas tão claras nos terem escapado.”
Saudações,
António José Coelho
Vejamos:
o beijokense recorda Galileu Galilei e a "teoria heliocêntrica" que ele defendia em oposição aos que defendiam que a terra é que era o centro do universo e que o Sol é que se movia à volta da Terra. Por isso foi chamado ao Tribunal do Santo Ofício dirigido por Roberto Bellarmino, que decidiu não haver provas suficientes para concluir que a Terra se movia e que por isso admoestou Galileu a abandonar a defesa da teoria heliocêntrica excepto como ferramenta matemática conveniente para descrever o movimento dos corpos celestes. Tendo Galileu persistido em ir mais longe nas suas ideias foi então proibido de divulgá-las ou ensiná-las.
aan /autor deste blogue responde ao beijokense com os que defendiam na antiguidade que a Terra era plana e não esférica, que é coisa bem diferente.
São duas polémicas ou discussões diferentes. Coisas não comparáveis. É à mesma coisa que um falar em vinho e outro em vinagre, um e ouyro são difrentezs só têm em comum a proveniencia e nem todos (os vinagres).
Esta resposta de AAN evidencia a forma como se está a analizar a teoria de Almeida Fernandes sobre o possível (provável) nascimento em Viseu de D. Afonso Henriques.
Quando se parte para uma analise séria, ou desapaixonada, não se deve partir com "reservas mentais".
E também se deve fazer uma "declaração de interesses" coisa que AAN em nenhum sítio deste blogue faz.
Mas à pergunta do beijokense sobre qual o suporte das fontes históricas para a tese de que Afonso nasceu em Guimarães, AAN disse NADA.
Como diz a lenda atribuindo a frase a Galileu:
E A TERRA CONTINUA A GIRAR
Os autores medievais defendiam que a Terra era redonda, mas aceitavam erroneamente o geocentrismo como fora estruturado por Aristóteles e Ptolomeu. Este princípio é anticientífico mas o mais divulgado. Esta reformulação leva a que haja uma encontrar construtivo sucessivo e não uma batalha dogmática. Assim sendo primeiro o homem descobre uma bidimensionalidade da superfície terrestre (terra plana), depois soma o aspecto da forma arredondada, depois em forma esférica, e assim sucessivamente em continuidade construtiva da realidade espacial e física.
O sistema cosmológico, na ciência, ensinava que a Terra estava parada no centro do universo e os outros corpos orbitavam em círculos concêntricos ao seu redor. A Igreja Católica aceitava esse modelo como sempre aceitou os modelos científicos de cada época, desde que sejam compatíveis com a Verdade revelada. Contudo essa não era uma certeza tradicional na ciência da época e não era um problema discutido. O heliocentrismo já era uma ideia antiga e que nunca despertou grande interesse nem complicação. Essa visão geocêntrica tradicional para alguns hoje foi abalada por Nicolau Copérnico que se limitou a dizer o que já tinha sido divulgado pelos monges copistas em seus manuscritos, que em 1514 começou a divulgar no meio académico clerical um modelo matemático em que a Terra e os outros corpos celestes giravam ao redor do Sol, tese que ficou conhecida como heliocentrismo e que era antiga. Nesse primeiro momento, não se encontram muitas críticas por parte do clero católico nem por parte dos eclesiásticos. Aliás, membros importantes da hierarquia clerical ficaram bem impressionados com o novo modelo e insistiram que essas idéias fossem melhor desenvolvidas. Note-se no entanto que a obra de Copérnico foi publicada com uma nota introdutória que explicava que o modelo apresentado devia ser interpretado apenas como uma ferramenta matemática que simplificava o cálculo das órbitas dos corpos celestes e nunca como uma descrição da realidade. É apresentada como obra matemática astronómica, que era uma coisa estudada nas ciências da época.
Galileu viveu uma época atribulada. Durante a Idade Média, entendiam que muitos teólogos já haviam reinterpretado e mutilado as escrituras de forma relativamente sem que ocorresse nenhum incidente de não serem detectados como abusadores e prejudiciais à fé do povo, mas depois do Concílio de Trento a Igreja passava a considerar esse tipo de comportamento ainda mais inaceitável, segundo a interpretação do clero, porque o caso do protestantismo provaria que o conhecimento da Doutrina não tinha ficado bem entendido entre muitos católicos que decidiram romper com a sucessão apostólica, doutrina que também seria reinterpretada. Pois o caso de Galileu não implica o heliocentrismo com objecto do processo nem qualquer interpretação bíblica. Galileu acabou condenado por desobediência e por proverir conteúdos nada conformes a Doutrina, por ignorância nestes temas, e a doutrina da Igreja permaneceu por muito tempo fiel como sempre foi, ao mesmo tempo que muitos clérigos apoiaram o geocentrismo e outros o heliocentrismo em disputas académicas.
É evidente que esta conversa nada tinha a ver com o a esfericidade da terra nem com o antigo debate entre o mito geocêntrico e a teoria heliocêntrica. Se parte da menção que eu aqui fiz à esfericidade da terra para tirar conclusões acerca do meu processo argumentativo, não seguirá pelo melhor caminho. Eu não falei aqui dos que defendiam o heliocentrismo, apenas disse que a esfericidade da terra já estava assente desde o tempo de Plínio e de Ptolomeu. E disse-o como contraponto ao que dissera o Beijokense. Apenas isso.
A propósito, acho uma certa graça o senhor vir para aqui "esmagar-me", dando-me uma lição, de cátedra, sobre a problemática do heliocentrismo, transcrevendo a nova vulgata da internet, a Wikipedia, por exemplo daqui,daqui ou daqui. Confesso que estas citações são "uma delícia" quanto ao modo como o ilustre anónimo "analisa o que lhe aparece pela frente". Não deixa de ser irónico que, quem cita sem indicar as fontes do que cita, fazendo passar por seus os textos que são de outros, me venha questionar em matéria de fontes históricas.
Indo ao cerne da questão:
1. Diz que eu "disse nada" ao Beijokense, quando questionado acerca do "suporte das fontes históricas" para a tese de que Afonso nasceu em Guimarães. Um pouco mais de atenção ao que eu respondi, evitava ter de responder exactamente o mesmo agora, que foi o seguinte:
"Quanto ao que pergunta, se tiver paciência de ler tudo o que aqui já se escreveu sobre Afonso Henriques, verificará que não encontra nenhuma afirmação nossa de que nasceu em Guimarães."
Ficou com dúvidas? Então explico-lhe com todas as letras: não conheço "fontes históricas" que suportem que Afonso Henriques nasceu em Guimarães. Por tal razão, nunca afirmei que Afonso Henriques nasceu em Guimarães. Mas também não conheço nenhuma fonte histórica que permita sustentar que ele nasceu noutro sítio qualquer. nem eu, nem ninguém, que se saiba.
2. Diz que eu deveria fazer uma "declaração de interesses", e que eu não a fiz em nenhum sítio deste blogue. Declaração de interesse a propósito de quê? A propósito do nascimento de D. Afonso Henriques? Que interesse é que eu tenho nisso? Quando diz que eu não fiz tal declaração em nenhuma parte deste blogue, deve-se presumir que terá lido tudo quanto aqui se escreveu. Mas não leu, certamente. Ou, se leu, não percebeu. Há muitos anos que eu escrevo sobre este assunto e nunca disse aquilo que parece querer colocar na minha voz. Aconselho-o a ler, por exemplo, este texto. Foi publicado em 1990 e aí afirmava sobre esta matéria: "a questão do lugar de nascimento de Afonso Henriques é, no contexto da História nacional, um problema de lana caprina, dos que não tiram o sono a qualquer historiador. E o facto de se não conseguir provar documentalmente o seu nascimento em Guimarães, em nada diminui a História de que Guimarães tem boa razão para se orgulhar, nem é impeditivo de que se possa considerar o nosso primeiro rei como um vimaranense. Afonso Henriques, Guimarães e o advento da nacionalidade estão ligados estreitamente."
E, a propósito, será que o ilustre anónimo já fez a sua "declaração de interesses" nesta matéria?
Pergunto eu simplesmente: E o meu amigo também já fez a sua dita "declaração de interesses", ou nem por isso?
Ou pretende de uma forma pesporrenta e sufocadora, limitar a opinião dos outros? Enxergue-se. Já li o dito Livro de Almeida Fernandes e, por tudo o que lá constatei, me pareceu um Estudo sério e isento, até porque, quando ele o iniciou e a pedido de uma entidade vimarenense, era no sentido do mesmo provar o nascimento em Guimarães. Mas as conclusões finais do estudo resultaram tão só, na tese de nascimento na cidade de Viseu. E se ler bem, metodicamente e com sentido analítico sério, verá que concordará comigo.
Cumprimentos
Armando Fernandes de Almeida
Quanto ao que escreve tenho a dizer-lhe o seguinte:
1. Perderíamos menos tempo se lêssemos primeiro aquilo que comentamos. Se o senhor tivesse lido a minha resposta ao comentário anterior, e não apenas as suas últimas linhas, teria percebido que a pergunta que me faz (Se eu já fiz a minha declaração de interesse) já me tinha sido colocada pelo tal anónimo, e era precisamente a essa pergunta que eu respondia. Está feita a tal declaração de interesses ou, mais precisamente, de falta deles. Portanto, quem pretendeu limitar a opinião dos outros não fui eu, mas o anónimo a que eu respondi e que, pelos vistos, V. Exa. imita. Portanto, devolvo-lhe a pesporrência.
2. Quanto a ler metodicamente e com sentido analítico sério, foi o que eu procurei fazer. Li a obra de Almeida Fernandes (não hoje, por causa do súbito interesse que alguns lhe dedicaram, depois de a terem esquecido por bem mais de década e meia), mas quando ela foi publicada. Analisei-a com todo o método de que fui capaz e confrontei as conclusões a que chegou com os documentos em que se baseou para lá chegar. E concluí que os documentos usados por Almeida Fernandes não autorizam a conclusão de que Afonso Henriques nasceu no local em que ele indica, na precisa data que avança. Assim sendo, aceitarei humildemente leitura diferente da minha, se me for demonstrada com base nos documentos medievais disponíveis. Até lá, continuarei na mesma: nada pode ser dito com segurança acerca da data e do local de nascimento de D. Afonso Henriques.