Memórias Paroquiais de 1758: São Cláudio do Barco

Igreja de S. Cláudio do barco


O nome de S. Cláudio virá do barco que ali servia, por ser o único meio viável para a travessia do rio Ave durante os meses de Inverno (que não nos outros, porque, como diz o pároco na memória paroquial de 1758, “por serem poucas as suas águas no Verão, tem muitas passadeiras”). Na idade Média chamava-se S. Croio de Riba de Ave.
No Ave criavam-se “barbos, também bogas e algumas trutas e também, nos tempos antigos, se caçavam muitas lampreias e sáveis, o que agora raras vezes aparece neste sítio”. É em Barco que o regato a que chamam Febras, que vem de Briteiros, se mete no Ave. Nele funcionavam, nos tempos de maior caudal, além de oito moinhos e uma azenha, “três pisões, em que se fabricam uns fracos panos da terra a que chamam serguilha e burel”.


São Cláudio do Barco
Freguesia de S. Cláudio do Barco.
S. Cláudio do Barco fica na Província de Entre-Douro-e-Minho, pertence ao Arcebispado de Braga Primaz. É termo e comarca de Guimarães.
Não conhece outro senhor mais que Sua Majestade Fidelíssima e suas justiças.
Tem oitenta e seis moradores, entre pobres e ricos. Tem duzentas e vinte e uma pessoas entre maiores, menores e ausentes.
Está esta freguesia situada num plano levantado, na beira e margem do rio Ave, que a divisa pela parte do Sul, ficando esta para a parte do Norte do mesmo rio Ave. Desta se descobrem, em circuito, muitas freguesias, como são Santa Eufémia de Prazins, Santo Estêvão de Briteiros, O Salvador de Briteiros, São Tomé de Caldelas. Tem em si esta freguesia cinco lugares, a saber, São Martinho, Torre, Monte, Pinheiro e Souto, nos quais estão todos os seus moradores, vivendo separados e não em forma de rua.
Bem no meio da freguesia está situada a igreja paroquial e, pegadas a ela pela parte do Nascente, as casas da residência, situadas num limitado campo, que lhe serve de passal. A igreja é muito pequena e é ao antigo. É o seu orago o glorioso São Cláudio Mártir e se festeja em todos os trinta de Outubro, como patrono dela. Fica a igreja versa ao Poente e tem três altares, o primeiro, da capela maior, em que está a gloriosa imagem de São Cláudio seu patrono e o Menino Deus. O segundo altar está no costão do Sul e tem o glorioso São Sebastião. O terceiro altar se acha no costão do Norte e tem em si a gloriosa imagem da Senhora dos Remédios, que tem sua irmandade. Não há capelas nesta freguesia.
O seu pároco é vigário ad nutum. É a apresentação do Reverendo Arcediago de Santa Cristina de Longos, hoje monsenhor na Santa Igreja patriarcal de Lisboa e se intitula Ferreira Abreu e, como arcediago, a ele pertence toda a dizimária dos frutos que se colhem nesta [freguesia]. Tem o pároco só uma limitada porção de dez mil réis em dinheiro e, para o reverendo Arcediago, renderá cento e quarenta mil réis.
Os frutos que colhem os seus moradores em maior quantia são milhão, também centeio, milho miúdo, feijão, linho, fruta, castanha e algum pouco azeite e vinho de enforcado e verde, por ser à beira do rio.
Três de seus moradores são privilegiados da Senhora da Oliveira da vila de Guimarães. E todos vivem debaixo do governo do juiz de fora e corregedor da mesma vila, perante quem pleiteiam todos seus negócios e demandas, e se servem do correio da mesma vila, que da cidade do Porto nela entra ao domingo à noite e sai à sexta-feira de manhã.
Dista esta freguesia da vila de Guimarães uma légua grande, da cidade de Braga, cabeça do Arcebispado, duas, e sessenta da cidade de Lisboa, capital do Reino.
Os montes desta freguesia são limitados e neles não há caça estimável.
Notícias do rio.
Do Nascente para o Poente corre, por entre esta freguesia e a de Santa Eufémia de Prazins, o rio Ave, nome que sempre consta conservou e conserva desde a antiguidade. Tem o seu nascimento daqui cinco para seis léguas, numa serra junto a Vieira, e se recolhe no mar daqui sete léguas para o Poente, em Vila de Conde. Neste sítio é caudaloso, suposto que em seu nascimento é diminuto. Nele se metem muitos regatos, nascidos das ribeiras a ele vizinhas, e daqui três léguas e meia, junto à vila de Santo Tirso, pela parte do Sul, nele entra o rio Pombeiro. Tem a sua corrente branda e as suas margens se cultivam, quase em todo o seu curso, de pão e árvores de vinho. Dele se não tiram águas para regar, por correrem fundas. Não é navegável, por ter muitas levadas de moinhos e azenhas e penedos, que o podem impedir. Tem seis pontes de cantaria, quatro para o seu ocaso e duas para o nascimento. E, por serem poucas as suas águas no Verão, tem muitas passadeiras e, no sítio desta [freguesia], tem um barco para o Inverno, que nela sai da parte do Norte e, do Sul, sai na de Santa Eufémia de Prazins, e também passadeiras de pedra para o Verão. E nesta freguesia tem duas levadas, em que tem uma azenha e quatro moinhos, que moem só de Verão. Não há neste sítio pesqueiras e com redes se caça no rio em qualquer tempo do ano, por ser livre a toda a pessoa. A maior quantidade de peixes que cria são barbos, também bogas e algumas trutas e também, nos tempos antigos, se caçavam muitas lampreias e sáveis, o que agora raras vezes aparece neste sítio.
Também pelo meio desta freguesia corre, do Nordeste, um regato que chamam Febras, e tem o seu nascimento daqui uma légua, na freguesia de Santa Maria de Sobreposta, e se mete no rio Ave pela parte do Norte, nos limites desta. Tem em si três pisões, em que se fabricam uns fracos panos da terra a que chamam serguilha e burel, e só andam de Inverno. E tem também oito moinhos e uma azenha, que só mói de Inverno, por de Verão lhe faltarem as águas. Também nele se criam trutas de bom gosto, e muitos escalos, e é a qualidade de seus peixes. Não há serras neste sítio.
Francisco Gomes Luís, pároco de S. Cláudio do Barco, termo da vila de Guimarães, faço certo que, com uma ordem do Muito Reverendo Senhor Doutor Provisor deste Arcebispado Primaz, me foram entregues uns interrogatórios em letra redonda, para por eles dar toda a notícia que tivesse, tudo na forma que neles se declarava, aos quais respondo tudo acima. E, por ser verdade, me assino e comigo o reverendo Domingos de Novais, abade de Santa Eufémia de Prazins e o reverendo Domingos Fernandes, vigário de S. Tomé de Caldelas, ambos mais vizinhos a esta. Hoje, de Maio, 10 de 1758 anos.
O vigário Francisco Gomes Luís.
O abade Domingos de Novais.
O vigário Domingos Fernandes.

Com esta vai o instrumento da visita do Chantrado.
Barco, São Cláudio do”, Dicionário Geográfico de Portugal (Memórias Paroquiais), Arquivo Nacional-Torre do Tombo, Vol. 6, n.º 35, p. 289 a 293.

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