Avelino da Silva Guimarães |
Em 1881, o Estado português
promoveu um inquérito industrial que teve como objectivo fazer o ponto da
situação das indústrias portuguesas. Dos resultados do trabalho das comissões
designadas para inventariarem o estado das indústrias do país, pode-se dizer
que ficaram muito aquém do pretendido, traçando um retrato muito incompleto e
irregular do estado das indústrias nacionais. Aliás, não seria de esperar outro resultado, já que os inquiridores apenas tiveram três meses para
proceder às inquirições e apresentar as suas conclusões. No que toca ao
concelho de Guimarães, a informação que se encontra no relatório é particularmente
escassa e pouco sistemática, fazendo um retrato das indústrias vimaranenses que
estava muito longe de corresponder à realidade já então existente. Foi para mostrar a verdadeira
face do tecido industrial vimaranense que a Sociedade Martins Sarmento
promoveu, em 1884, uma grande exposição industrial concelhia que ficaria a marcar
um ponto de viragem no panorama económico, social e cultural de Guimarães.
Em de 1884, sob
impulso da Sociedade Martins Sarmento, Guimarães começa a transpor, finalmente, os muros que a apartavam
da modernidade. A indústria local entra na sua fase mais florescente, com
fortíssimos investimentos em novos ramos de actividade e na modernização dos já
existentes. É neste contexto que, ainda naquele ano, surge a ideia de criar um
museu das indústrias locais, cujo conceito não encaixa bem na ideia que hoje temos dum espaço museológico, enquanto repositório de monumentos de existências
extintas ou em vias de extinção. Este museu, em vez de um repositório de
ferramentas e de produtos de modos de produção obsoletos, deveria assumir-se
como uma exposição industrial permanente, onde se fosse mostrando o que de mais
importante e de mais avançado se produzisse em Guimarães, em cada momento.
Encerrada a Exposição
Industrial de 1884, diversos industriais que nela exibiram os seus produtos ofereceram
à Sociedade Martins Sarmento diversos objectos que tinham estado expostos. No
dia 4 de Julho daquele ano, o presidente da direcção daquela instituição, Avelino
da Silva Guimarães, propôs que aquelas ofertas fossem conservadas,
constituindo-se com elas o núcleo inicial dum futuro museu de indústrias de Guimarães. A proposta ficou registada na acta da reunião em que foi apresentada, e que foi publicada na Revista de Guimarães daquele ano (páginas 204-205), de onde a transcrevemos:
Vários e mui distintos expositores têm prestado a sua espontânea homenagem à Sociedade Martins Sarmento, oferecendo-lhe alguns dos objectos expostos no palacete de Vila Flor. Decerto que a Sociedade os aceita com vivo reconhecimento, porque, se a homenagem traduz as simpatias dos expositores pela corporação que tem empregado todos os possíveis esforços para o melhoramento da indústria vimaranense, por uma série ininterrupta de medidas, de iniciativas mais ou menos arrojadas, até à abertura da Exposição, que pareceu a mais arrojada de todas, a oferta, reveladora das simpatias e do motivo que as provoca, é o melhor prémio aos esforços colectivos desta corporação.
A jornada da Sociedade não terminou ainda: é longo o caminho a percorrer, que no capítulo de instrução popular a satisfação duma aspiração logo cria outra, um aperfeiçoamento produz novas aspirações. Entre estas, virá a da criação de um museu industrial, onde a exposição permanente seja uma escola de largo ensinamento para as diversas classes de indústria. Sendo assim, e sendo aquelas ofertas a expressão de homenagem, os brindes valiosíssimos dos expositores parece-me que é absolutamente indispensável conservá-los, considerando-os como o primeiro núcleo, o primeiro e valioso pecúlio de futuro museu. Sobre isto, acresce que conservar na casa da Sociedade os objectos oferecidos é conservar o troféu desta última campanha, que condensa tantíssimos esforços, tão assíduos estudos, tantos serviços, trabalhos e despesas, prestados por esta colectividade no curto período da sua existência em prol do melhoramento das classes industriais de Guimarães.
Sendo, pois, não só o mais levantado e digno, como o mais conveniente aos fins legais da Sociedade, a conservação dos objectos oferecidos, tenho a honra de propor que assim se delibere, e se participe, agradecendo, aos mui dignos oferentes.
Os objectos entregues pelos industriais vimaranenses à Sociedade Martins Sarmento em 1884 foram colocados numa das salas da casa da instituição, como informa o relatório da direcção referente ao ano de 1885, onde se lê:
Noutra sala encontrareis também o pequeno pecúlio de produtos e amostras industriais do concelho, ofertas de alguns expositores de Vila Flor, negociantes e industriais deste concelho. Este depósito não constitui nem sequer um começo de museu; constitui apenas um convite a futura criação de museu industrial, revela somente uma aspiração desta Sociedade.
[Continua]
1 Comentários
Temos hoje "espaços"em deriva e à procura de realização.
Só que a "vontade" se apaga no tempo e do nosso Passado só restam retalhos: a ingratidão está instalada!
E até me atrevo a considerar que a nossa Sociedade Martins Sarmento , uma Instituição única em Portugal, não tem merecido o justo reconhecimento dos Vimaranenses! Aguardo expectante a segunda parte desta crónica... porque é tempo de retomar o "progresso e a vida" de uma Cultura ancorada no passado, a Cultura Vimaranense.