A rua dos Terceiros, também foi conhecida por rua das
Carvalhas de S. Francisco e rua de Donães. É a artéria irregular que hoje tem o
nome do padre Gaspar Roriz. Não sabemos quando foi aberta, sendo certo que na
planta de Guimarães da segunda metade do século XVI ainda não aparece. No
século XIX já lá estava, com a designação de rua dos Terceiros. Ao que parece, esta
via resultou de uma decisão da Câmara de 1846, que mandou abrir um caminho mais
desafogado em direcção ao Campo da Feira. Em 1899, andou em obras de
reconstrução e calcetamento.
O engenheiro Almeida Ribeiro, por perceber que havia
necessidade de uma ligação entre S. Francisco e o Campo da Feira e considerar a
Viela de Soalhães uma “péssima comunicação” entre aqueles dois espaços, projectou
“uma rua de 10 metros de largura a partir do terreiro das Carvalhas em
continuação com o alinhamento do Hospital de S. Francisco”. Traçada em linha recta,
a nova artéria garantiria uma circulação mais fácil de S. Francisco ao Campo da
Feira.
Durante décadas, este projecto esteve em cima da mesa.
Em 1890, a Ordem Terceira de S. Francisco antecipou-se à iniciativa da Câmara, doando-lhe
144 metros quadrados de terreno que lhe pertencia e iniciando, desde logo, as
demolições necessárias para que a nova rua seguisse o percurso traçado por
Almeida Ribeira, que corria rente à Igreja.
Mas a obra nunca se realizaria. As obras de construção
da Alameda, que implicaram a demolição do quarteirão de S. Dâmaso, levariam ao
seu abandono em definitivo.
Esta rua tem o nome do padre Gaspar Roriz desde a
manhã do dia 12 de Julho de 1936, data em que Guimarães rendeu uma expressiva
homenagem ao multifacetado padre-artista que deixou marcas indeléveis no devir
vimaranense das primeiras décadas do século XX. Naquela manhã, foi a sua irmã Maria
de Oliveira Roriz, quem descerrou a lápide com o seu nome, entre acordes de música, revoadas
de pombas, estralejar de foguetes e os aplausos da vasta multidão queque se
juntou para participar na cerimónia.
Gaspar Roriz, o padre-artista
O
Padre Gaspar da Costa Roriz é uma das figuras incontornáveis das primeiras
décadas do século XX em Guimarães. Nascido na rua de D. João I no dia 30 de
Agosto de 1865, filho de um mestre barbeiro, nunca esqueceu a sua origem
humilde nem deixou de amar a terra que o viu nascer. Sacerdote e eminente
orador sagrado, era frequentemente requisitado para abrilhantar solenidades
religiosas nos lugares mais diversos. Mas os seus dotes oratórios não se
limitavam a actos sagrados, sendo senhor de uma verve prodigiosa com que
animava todo o género de eventos, públicos ou privados. Foi jornalista (em 1899
era redactor principal do Eco de
Guimarães; em 1908 fundou o Regenerador,
de que era director e proprietário), professor do Liceu, poeta, dramaturgo, encenador,
conferencista, político, comissário da Ordem Terceira de S. Francisco de
Guimarães. Grande conversador, era presença imprescindível nas tertúlias do seu tempo, onde se destacava pela cultura, pela devoção patriótica à sua cidade e
pela finura da sua ironia. Padre-artista lhe chamou um dia um colega de ofício.
Gaspar
Roriz foi um dos grandes animadores das festas dos estudantes de Guimarães a S.
Nicolau, desde o seu ressurgimento em 1895. Escreveu pregões, compôs e ensaiou os
textos das danças, dedicou diversas composições poéticas às festas.
Dedicou-lhes também o Auto da Saudade,
que compôs em 1920. Não foi por acaso que foi a Associação dos Antigos
Estudantes do Liceu de Guimarães, então dirigida por António Faria Martins, a
tomar a iniciativa de comemorar o centenário do seu nascimento, em 1965.
O seu
nome é também indissociável das festas Gualterianas, ou não fosse ele o autor
da letra do Hino da Cidade de Guimarães, composto por Aníbal Vasco Leão para as
festas de 1906, e o inventor da
Marcha Gualteriana, que saiu à rua pela primeira vez nas festas de 1907.
Mas o
que mais distinguia o Padre Roriz era a sua dedicação a Guimarães, a sua paixão
pela terra natal. Por aqui, todos sabiam que a porta da sua casa nunca deixava
de se franquear alegremente a quem a ela batia e dizia a senha: Por Guimarães!
A
última grande cerimónia em que discursou em público foi aquando da celebração
do oitavo centenário da Batalha de S. Mamede, em 1928. Nesse dia, quando soaram
os clarins de um pelotão de cavalaria, vestidos como os soldados de Afonso
Henriques, acompanhando o içar da bandeira na torre de menagem do castelo, e a
multidão explodia em vivas e aplausos, pelo rosto do Padre Roriz corriam
lágrimas de que A. L. de Carvalho foi testemunha.
A
notícia da sua morte cobriu Guimarães de luto no dia 7 de Março de 1932.
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