Sala do Teatro-Circo do príncipe Real, Porto (actual Teatro Sá da Bandeira). Imagem do Arquivo Municipal do Porto |
O
Pedantismo de Braga
Ou pedantismo ou pulhismo que escolham os bracarenses a
quem nos vamos referir.
De há muito que ouvíamos falar em umas rivalidades entre
Braga e Guimarães, e achávamo-las tão estúpidas que não as acreditávamos. Agora
vemos que era verdade o que se dizia, por termos conhecimento do que se passou
a semana passada com a companhia do teatro Príncipe Real, do Porto.
Incrível, na verdade!
Se fora em uma terra aonde não tivesse chegado a
civilização, admitia; mas em Braga, que tem obrigação de se mostrar
competentemente ilustrada e civilizada, é simplesmente estúpido!
Vamos ao facto e à rivalidade a que nos referimos:
A companhia do teatro Príncipe Real teve a ideia de fazer
uma digressão pela província, principiando por Guimarães e terminando em Viana.
Por isso deixou de atender à vaidade dos bracarenses e foi lá depois de ter
estado nesta cidade. Foi o mesmo que passar à bofetada todos os habitantes da
cidade augusta, porque estes tomaram isto em desfeita, e protestaram vingar-se
terrivelmente dum tão inaudito crime!
E vingaram-se; e saciaram toda a sua sede de abutre;
pagaram a desconsideração da companhia com o mais completo desprezo, deixando o
teatro vazio no dia da récita, e obrigando os poucos espectadores a patear!
É uma desforra de selvagem, mas é desforra!
Agora pergunta-se: por que razão se pretende obrigar as
companhias a visitar Braga primeiro que Guimarães?
Será porque a terra é mais civilizada?
Porque seja a terceira cidade do reino na ordem
cronológica?
Porque os seus habitantes sejam mais dignos de consideração
e respeito?
Porque a sua paga seja melhor e mais pontual do que a
daqui?
Não pode ser por nada disto porque Braga nem é mais
civilizada, nem tem habitantes mais respeitáveis, nem é mais honrada que
Guimarães porque as companhias quando daqui saem vão sempre com o saldo das
suas contas, entretanto que em Braga…
O motivo é outro a nosso ver, e esse resulta do pedantismo
que por lá está inveterado.
Desgraçadamente hoje é tudo assim. Para se fazer figura é
preciso ser pedante e pulha, sem se reparar que são à custa alheia os
progressos que se vão fazendo e de que resulta essa condenável vaidade.
Que mais seria Braga do que Guimarães se não andasse
constantemente a mendigar o auxílio dos seus pupilos para se engrandecer?
É asneira tentar amesquinhar-nos. Quem precisa do vizinho
não pode nem deve indispor-se com ele, e Braga precisa de Guimarães mais do que
Guimarães precisa de Braga.
O
Formigueiro, 22 de Maio de 1881
[continua]
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