O Toural, no princípio do século XX, já com candeeiros eléctricos |
18 de Agosto de 1900
A Câmara Municipal anuncia aberto por 30 dias o concurso para
fornecimento da luz eléctrica, pública e particular da cidade.
(João Lopes de Faria, Efemérides
Vimaranenses, manuscrito da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, vol.
III, p. 159 v.)
No princípio era o breu. Depois, a
partir de 1844, mas por pouco tempo, a vila passou a ter as suas noites
iluminadas a candeeiros de azeite. Nos tempos que se seguiram, discutiu-se qual
seria a melhor forma de iluminar Guimarães, entretanto elevada a cidade. Esteve quase para
ser instalado um sistema de iluminação a gás, mas acabou por se optar por
candeeiros de petróleo, que começaram a dar luz à noite a partir de 1874. No
final do século XIX, começou a projectar-se a ideia de iluminar a cidade com
candeeiros eléctricos.
Na sequência de um concurso para
introduzir a iluminação pública a gás, a que apresentaram propostas António
Luís Soares Duarte, do Porto, e John Clark, de Lisboa, que a Câmara considerou
inaceitáveis, foi decidido abrir um concurso para prover Guimarães de um
sistema de luz eléctrica, para uso público e privado. O aviso do concurso tem a
data de 17 de Agosto de 1900 e a Câmara propunha-se adjudicar o fornecimento exclusivo da luz eléctrica
para a iluminação pública, particular e usos industriais, durante o período de
quarenta e cinco anos, dentro do perímetro da cidade. Para a iluminação
pública, a Câmara assumiria os custos do consumo mínimo de 350 lâmpadas de
incandescência, com um poder iluminante
de dezasseis velas. Entre outras condições, as bases do concurso
determinavam que a iluminação pública deveria começar a funcionar a meia hora
depois do Sol posto, sendo desligado uma hora antes do nascer do Sol. Nas
noites de luar ou partir da meia-noite, nas outras, as lâmpadas poderiam funcionar
com metade da intensidade. O concessionário deveria assegurar o correcto
funcionamento do sistema de iluminação pública, ficando sujeito ao pagamento de
um multa de 200 réis por noite e por cada
lâmpada que por incúria do concessionário ou empresa deixe de funcionar convenientemente.
O processo de adjudicação da luz eléctrica ficaria concluído no dia 24 de
Setembro de 1901, com a assinatura do respectivo contrato entre a Câmara de
Guimarães e a empresa inglesa Moon Longhlin & C.ª, de Manchester,
representada no acto por John Clark, residente em Lisboa. A concessão seria por
30 anos, devendo o concessionário iniciar as obras dentro de seis meses e
terminá-las em dezoito, contados a partir da data da aprovação do contrato pelo
Governo, que aconteceria no dia 16 de Dezembro daquele ano.
A fábrica da luz eléctrica seria instalada no Campo da Barroca ou do
Galego, junto ao palacete de Vila Pouca, em terreno arrendado por 30 anos à
Condessa de Vila Pouca por John Aloysins O'Longhlin, proprietário, residente em
Manchester.
Iniciados os trabalhos de instalação da fábrica e dos sistemas de
distribuição de electricidade e de iluminação pública, a Câmara foi
acompanhando os trabalhos. Em Agosto de 1902, apercebe-se de um problema que
não tinha sido previsto antes: os constrangimentos à circulação dos andores e
das bandeiras das procissões, em particular os da Ronda da Lapinha, por causa
dos fios eléctricos que atravessavam as ruas. Vai daí, decide que os fios condutores de
energia eléctrica para a iluminação pública desta cidade, sejam colocados a
altura suficiente para que não prejudique o tradicional costume das procissões
religiosas, embaraçando a passagem das bandeiras, comunicando esta
decisão ao concessionário.
Ultrapassadas as dificuldades que foram surgindo, que levaram ao prolongamento
por dois meses do respectivo prazo de conclusão,no início de Agosto lia-se no
Jornal O Progresso:
Os ingleses têm trabalhado nos últimos dais com afã para ver se conseguem fornecer a luz eléctrica no dia 16
do corrente mês, dia em que termina a prorrogação que lhes foi concedida.
No dia 5, ao final da tarde, procedeu-se à inspecção do sistema de luz
eléctrica.
No dia 16, O Progresso,
anunciava que
A velha mas sempre nobre Araduca
vai hoje mostrar claramente aos seus filhos que a acção e a vida são dois
elementos poderosíssimos que sempre devem acompanhar o progresso, e a
civilização.
A cidade embandeirou-se para a festa da inauguração. Caberia ao
presidente da Câmara, Joaquim José de Meira, a abertura do circuito eléctrico, com 373 lâmpadas. Assim que a luz se acendeu, rebentou uma enorme
girândola de foguetes. A banda de música do João Inácio executou o hino
nacional, percorrendo em seguida as ruas da cidade. A banda do 20 de Infantaria estava estacionada no Toural, onde,
segundo O Comércio de Guimarães, a iluminação
produzia um belíssimo efeito, sendo
difícil poder-se transitar naquele recinto, em virtude da grande aglomeração de
povo que estava a presenciar o aspecto da luz eléctrica que era, na verdade,
maravilhoso.
A nova Filarmónica Vimaranense também participou na festa, percorrendo as
ruas e actuando na Praça de D. Afonso Henriques (S. Francisco).
Mas não há bela sem senão. Lemos em O
Progresso do dia 23:
Não obstante a luz aparecer muito
perfeita, lâmpadas houve que não acenderam, não admirando este acontecimento se
atendermos a que quase todos os trabalhos para a completa instalação foram
feitos à última hora.
A pessoas bastante autorizadas, e
no número destas algumas de fora da terra, temos ouvido dizer que a luz é
magnifica, com bastante força iluminante e muito superior à das outras cidades
iluminadas pelo mesmo sistema, não se podendo exigir mais nem melhor.
Na noite de anteontem, por um
incidente qualquer sucedido na máquina, muitas ruas estiveram completamente às
escuras, tornando-se o trânsito bastante perigoso.
Este facto deu causa a cenas
engraçadas — um morador que punha uma candeia de azeite à janela, outro um
candeeiro, um noctívago que passava com um lampião e o Marinho que, não
obstante o lampião com que ia armado,
dá com os costados na calçada da rua de Camões, segundo ele nos contou.
Ontem também não acenderam algumas lâmpadas.
Não sabemos se, por este caminhar,
estaremos todas as noites com parte da iluminação acesa e outra parte apagada.
E assim se iluminou Guimarães.
No dia 1 de Outubro de 1910, a concessão da electricidade de Guimarães
seria adquirida aos ingleses por Bernardino Jordão. Mas essa já é outra
história.
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