Carta Constitucional de 1826 |
28 de Julho de 1826
Sai um Bando em que a Câmara
anuncia que o dia 31 deste mês era o dia marcado para o juramento da Carta
Constitucional dada pelo sr. D. Pedro IV, cujo bando ia assim: adiante de tudo
ia uma escolta de 4 soldados e 1 sargento, depois seguiam-se os tambores e
bombo atrás destes ia o pregoeiro, atrás iam os juízes almotacés, e quase
juntos a estes iam os misteres cada um com sua bandeira na mão, vestidos todos
de grande gala, e atrás de tudo ia uma guarda de honra de 30 soldados do
regimento 21, sob o comando de um alferes; ao passar o bando pelo Toural
deram-se foguetes e vivas. PL
(João Lopes de Faria, Efemérides Vimaranenses, manuscrito
da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, vol. III, p. 77 v.)
Em tempos em que não
havia meios de comunicação à distância eficazes, uma notícia ou um anúncio com
alguma relevância era levado ao conhecimento público por meios de bandos anunciadores,
uns mais solenes do que outros. Ainda hoje no Brasil, em especial na região da
Baía, é através de bandos que, nas vésperas, se anunciam as festas populares. Entre
nós, permanece esta tradição no número do Pregão das festas a S. Nicolau, que
actualmente funciona como uma espécie de anuário satírico das coisas locais e
nacionais, mas que, nos primeiros tempos, servia apenas para anunciar em texto
rimado os festejos de S. Nicolau que teriam lugar a cada 6 de Dezembro.
No dia 28 de Julho de
1826, saiu à rua um bando a anunciar às gentes de Guimarães que, no último dia
daquele mês seria jurada a carta constitucional que D. Pedro IV outorgara a
partir do Brasil, em substituição da Constituição de 1822. Para o efeito,
formou-se um cortejo, que era aberto por uma escola de cinco militares,
seguidos por bombos e tambores que convocavam as pessoas para virem à rua
escutar o pregão, que seria lido pelo pregoeiro. Para marcar a solenidade do
anúncio que iria ser feito, incorporaram-se no cortejo os juízes almotacés, os
representantes dos ofícios com as suas bandeiras. A fechar, seguiam trinta soldados
fardados, fazendo a guarda de honra. O bando era o cortejo e, também, o texto
do pregão.
No dia anunciado, 31 de
Julho de 1826, a alvorada foi assinalada por 21 tiros de morteiro, a que se
seguiu o hino de D. Pedro, executado pela banda de música do regimento n.º 21, que percorreu as
ruas da vila, seguida por muita gente que lançava vivas a D. Pedro, à Carta
Constitucional e à Infanta Isabel Maria, que presidia à regência de Portugal,
por nomeação do seu pai, D. João VI, falecido alguns meses antes.
A Carta Constitucional
foi jurada, em primeiro lugar, pelo Cabido, em reunião na casa do Capítulo, presidida
pelo chantre. Eram 13 horas. Duas horas mais tarde, foi a vez de prestarem juramento, nos paços do Concelho, as autoridades civis e militares
e os empregados públicos de Guimarães, cerimónia a que se seguiu um Te Deum cantado na igreja da Colegiada.
No final os soldados do regimento 21 deram, na praça da Oliveira, três
descargas de fogo, renovando-se os vivas a D. Pedro, à Carta e à família real,
que seriam repetidos no Campoda Feira e
no Toural, por onde passou o regimento, antes de recolher ao seu quartel. À
noite a vila iluminou-se, voltando as ruas a ser percorridas pela banda do 21 a
tocar, por entre vivas, o hino de D.
No dia seguinte, o
primeiro de Agosto, saiu à rua um novo bando, convidando a população a
participar na função do dia seguinte, preparada pelos constitucionais da vila.
Este bando era aberta por duas bestas com coberturas de damasco, a que se
seguiam dois tocadores e clarim, muito
asseados, no meio dos quais seguia uma figura que representava Guimarães.
Seguia-se o pregoeiro, que ia lendo o anúncio, escrito em verso, escutando-se vivas
nas ruas que iam sendo percorridas. À noite, voltou a haver iluminação geral.
O Cónego Pereira Lopes
descreveu as comemorações do dia 2 de Agosto de 1826, de que foi testemunha:
Às 5 horas da tarde,
soleníssimo Te Deum na basílica de S. Pedro, pela Outorga da Carta
Constitucional, saindo no fim dele o Santíssimo Sacramento em procissão pelo
campo do Toural indo atrás a música do regimento nº 21 a tocar o hino de D.
Pedro. A imensa gente de todas as classes que assistiu ao Te Deum acompanhou
com tochas acesas a procissão. À noite, houve grande iluminação no campo do
Toural, constando de um templo a fingir mármore e com a figura da Constituição
no meio; a figura estava ricamente asseada e o templo iluminado a cera. No
escadório do templo estavam quatro anjos a cantar o hino constitucional ao som
de uma bem concertada música. Defronte da igreja de S. Pedro estavam, sobre
duas colunas iluminadas, as figuras da Religião e Guimarães com seus dísticos.
Em uma das janelas da casa do Toural estava, muito bem iluminada, a Real efígie
de S. M. I. o sr. D. Pedro dando a constituição a sua filha Sra. D. Maria. Nos quatro
cantos do Toural estavam as quatro partes do mundo. No chafariz do Toural
estava a figura da Fama tocando trombeta e tendo na mão direita um dístico que
dizia Constituição. As grades das janelas das casas do passeio (lado nascente)
estavam iluminadas por simetria com festões de murta, laranjas e grisetas, que faziam
uma agradável vista. Foi certamente esta função uma das mais brilhantes que se
tinha visto em Guimarães, segundo o que diziam os velhos.
As comemorações prosseguiriam
nos dias seguintes. No dia 3, ao final da manhã, os constitucionais de
Guimarães levaram à cadeia da vila um
farto jantar para os presos. Seguiram em cortejo, que era precedido pela
banda de música do regimento n.º 21, que tocava o hino constitucional. No final,
o que sobrou do almoço dos presidiários foi distribuído aos pobres, no Toural, onde
alguns constitucionais também lhes atiravam moedas.
No dia 4, a pretexto de
desmontar a figura a Constituição do templo que lhe fora erigida no meio do
Toural, estralejaram foguetes e dispararam-se tiros de morteiros.
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