16 de Junho de 1910
Decreto, desta data e publicado no Diário do Governo de 23 deste mês,
designando os imóveis que devem ser considerados monumentos nacionais, e entre
eles os seguintes de Guimarães : Monumentos pré-históricos, antas e outros
monumentos: “Anta de Polvoreira”. Monumentos lusitanos e lusitano-romanos:
Castros :”Citânia de Briteiros - Citânia de Sabroso”. Marcos miliários (série
capela): ”Braga e Guimarães (2 marcos). Inscrições:”Lápide das Taipas (Ara de
Trajano). Igrejas:”Igreja de S. Miguel do Castelo, de Nossa Senhora da
Oliveira, de S. Domingos (Claustro), de S. Martinho de Candoso.” Cruzeiros: “Cruzeiro de Nossa Senhora da Guia”. Castelos: “Castelo de Guimarães”. Padrões:”Padrão
de D. João I”. Monumentos civis :”Paço dos Duques de Bragança”. Paços
Municipais: ”Paços Municipais de Guimarães”. Pontes: “Ponte velha de Vizela,
sobre o Vizela”.
(João Lopes de Faria, Efemérides
Vimaranenses, manuscrito da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, vol.
II, p. 267 v.)
O Castelo foi o primeiro monumento de Guimarães a obter a classificação
de monumento nacional, através de um decreto de 27 de Agosto de 1908, ficando “o terrapleno, paiol e mais dependências pertencendo ao Ministério da Guerra”.
A classificação definitiva do monumento mais simbólico de Guimarães e,
porventura, de Portugal, aconteceria no dia 16 de Junho de 1910, através de um
decreto que seria publicado no dia 23 do mesmo mês, juntamente com uma larga lista
de outros monumentos portugueses, entre os quais dezasseis situados no concelho
de Guimarães, a saber:
Monumentos pré-históricos / Antas
e outros monumentos : Anta de Polvoreira.
Monumentos lusitanos e
lusitano-romanos / Castros: Citânia de Briteiros e Citânia de Sabroso. Marcos miliários (Série Capela): 2
marcos da “Série Capela”, originários de Braga e de Guimarães, pertencentes ao
Museu Arqueológico da Sociedade Martins Sarmento. / Inscrições: Lápide das Taipas (Ara de Trajano).
Igrejas: Igreja de S. Miguel
do Castelo; Igreja de Nossa Senhora da Oliveira; Caustro da Igreja de S.
Domingos; Igreja de S. Martinho de Candoso.
Cruzeiros: Cruzeiro da Senhora da Guia.
Monumentos militares / Castelos:
Castelo de Guimarães.
Padrões: Padrão de D. João I.
Monumentos Civis: Paços dos
Duques de Bragança (ruínas).
Paços Municipais: Paços Municipais
de Guimarães.
Pontes: Ponte Velha de Vizela.
Dissemos acima que por este decreto foram classificados dezasseis monumentos
“situados no concelho de Guimarães”. Acontece que um deles não se situava em Guimarães,
porque não se situava em lado nenhum. Nunca existiu.
Trata-se da fabulosa "Anta de Polvoreira".
A segunda nota que Francisco Martins Sarmento inscreveu nos seus cadernos
de apontamentos de arqueologia referia-se a um suposto dólmen existente no
monte de Lujó em Polvoreira. Eis o que escreveu:
A Furna de Polvoreira. Aqui
está o que eu escrevi, o ano passado, voltando de ver a “Furna de Polvoreira”:
“Fica no monte de Lujó. Chamam-lhe a “Furna dos Mouros”. Não vi coisa que
se parecesse com “dólmen”. Imagine-se uma Pena Província liliputiana. Os
penedos deixam entre si espaços desencontrados, diferentes e estreitos - o que torna, à primeira
vista, difícil saber qual deles formava a furna. Mesa, nem sinal dela em parte
alguma. Quebrou-se ali já pedra; mas vê-se que a pedra quebrada não alterou no
essencial o grupo dos penedos. Por fim, um guia mostrou a “Furna”:
1) Furna; 2) parte do penedo que despegou de cima,
abrindo uma fenda para poente. A furna terá doze palmos de profundidade, sete
de alto, quatro de largo. Como se vê, não podia ser um dólmen. Era, quando
muito, um esconderijo, talvez para cadáveres, facilitado pela deslocação do
penedo, deslocação que esmigalhou a pedra que, extraída, deu a furna. Tudo isto
foi preparado pela natureza e a única coisa que faz suspeitar que a furna fosse
aproveitada para algum uso é o seu nome “Furna dos Mouros” e alguma legenda de
dinheiro encantado que por ali há. Realmente não é pouco, porque, sem uma tradição
fundada em algum achado esquisito, a coisa em si não podia chamar a atenção.
Disse-me depois o Couto (Jerónimo) que a legenda queria que os tesouros estivessem
por baixo do penedo (espécie de loja à qual dava entrada a furna). Um lavrador
que nos acompanhava diz mais que havia por ali caminho até um ribeiro próximo
(anónimo), caminho subterrâneo, entende-se. Estas tradições devem relacionar-se
com alguma coisa mais, que caiu em pleno esquecimento. No morro a nascente, por
onde passámos antes de chegar à igreja de Polvoreira, encontrei eu um fragmento
de tijolo romano, que mostrei aos dois Avelinos, meus companheiros. O lavrador
supra, que apareceu depois, disse que num campo dele apareciam a cada passo
grandes tijolos e carvão (este homem saiu o irmão do meu falecido criado
António, que mora ali). Defronte deste teso, para nascente, há um monte de S. Simão,
sem capela. Em Taboadelo, que não fica longe, há, diz o Couto, um sepulcro
aberto na rocha.”
Tenho só a acrescentar que a “Furna dos Mouros” podia bem ser lugar de
enterramento, porque enterrar os mortos nas “fendas dos rochedos” era comum,
diz não me lembra quem.
Francisco Martins Sarmento, Antiqua - Apontamentos de Arqueologia, Sociedade Martins Sarmento, Guimarães, 1999, pp. 21-22
Assim sendo, sabe-se que, ao entrar no último quartel do século XIX, se
falava da existência em Polvoreira de uma anta ou dólmen no monte de Lujó. Que
Sarmento, na inspecção que fez ao monte em 1877, não confirmou, antes pelo
contrário O que não se sabe é qual foi o processo que transformou um monumento fantasma
num monumento nacional…
A lendária “Anta de Polvoreira” continuou classificada até 26 de Outubro
de 1999, data em que o IPPAR determinou a sua inexistência e a mandou retirar
das listagens oficiais de património.
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