Cabeçalho do jornal republicano Alvorada de 20 de Maio de 1915 |
16 de Maio de 1852
Domingo.- Às 9 e meia horas da noite gritos fora do Café Fernandes, à
Porta da Vila, e ao mesmo tempo, uma multidão entrava de tropel e procurava
refúgio. Havia forte tiroteio no cimo da Rua da Rainha. Patrulhas de soldados
armados de Mauser que por ordem do comando militar se encontravam dispersas
por as mais principais ruas da cidade. Explodiu uma bomba próximo do Centro
Democrático. Danificou bastante a parede do prédio onde vivia a amásia do
António José Ribeiro, "O Bravo", e as janelas ficaram estilhaçadas.
Próximo, um pouco à esquerda, estendido no chão, sem chapéu, envolto num mar de
sangue, o surrador António Machado, casado, de 40 anos e morador na travessa do
Monte Pio, morreu com uma bala. No Eirado do Forno outro infeliz era o oficial
de barbeiro Zacarias da Silva, solteiro, de 28 anos, tinha no pescoço um grande
ferimento, morreu com um estilhaço de bomba. Recolheram ao hospital da
Misericórdia gravemente feridos com estilhaços de bomba: Sebastião Pinto
Salvador, de 36 anos, solteiro, ferrador, da Rua de Donães e Aníbal Ribeiro
Soares, de 24 anos, curtidor, casado, da Rua Trindade Coelho. Também ali foram
receber curativo diversos indivíduos, uns feridos por bala, outros com
estilhaços de bomba. Nesta noite e no acto dos acontecimentos foram presos 6
operários e soltos no dia seguinte.
(João Lopes de Faria, Efemérides
Vimaranenses, manuscrito da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, vol.
II, p. 150 v.)
No dia 25 de Janeiro de 1915, Portugal iniciou uma experiência de governo
de iniciativa presidencial, encabeçado pelo General Pimenta de Castro. Todavia,
o executivo nomeado pelo Presidente Manuel de Arriaga executivo não obteria a
necessária aprovação do Congresso da República, entrando-se numa fase que foi
classificada como de ditadura. Os democráticos de Afonso Costa declararam que o
governo era ilegal, apelando à desobediência civil. O país entra numa fase de
grande turbulência política, marcada por actos de violência, de que os
democráticos serão as principais vítimas. Em finais de Abril, recrudesceram os
apelos à insurreição popular. O governo de Pimenta de Castro duraria pouco mais
de 100 dias, sendo substituído no dia 15 de Maio por um governo de João Chagas (que
seria substituído logo em seguida, uma vez que no dia 16 de Maio foi alvo de
uma tentativa de assassinato, de que saiu gravemente ferido, com um olho varado
pro um tiro desfechado por um senador).
Em Guimarães, aqueles também foram dias de desassossego e violência
política. Por aqui, como noutras terras, os monárquicos acreditaram que, com a
ditadura de Pimenta de Castro, estava a chegar a sua hora. O último Administrador
do Concelho do tempo da Monarquia, Pedro Guimarães regressou agora às mesmas
funções. A Câmara, de Mariano Felgueiras, acabaria dissolvida, a pretexto de
desobediência ao governo pimentista.
No dia 8 de Maio, sábado, o arcebispo de Braga esteve em Guimarães. A
visita do prelado foi aproveitada para uma manifestação de força dos monárquicos,
que exibiam as bandeiras azuis e brancas do tempo da Monarquia. Escrever-se-ia
no jornal republicano Alvorada, que...
... a gente católica da
cidade teve, nesse dia memorável, a funesta ideia de juntar política com
religião, correspondendo à ampla concessão da República com um acintoso e grotesco
namoro à monarquia, embandeirando provocantemente a azul e branco.
Deste enfartamento e
pimponice surgiu uma manifestação pelas ruas do católico burgo, sendo esta também
recebida pelas damas — cujo saber e discorrer não vão além do saber e discorrer
das suas cozinheiras — que até houve quem lhe acenasse com bandeirolas, das
tais azuis e brancas. Assim fortalecidos os sentimentos cristãos da referida
farandolagem monárquica, ela foi, de seguida, apupar as bandeiras das cores
nacionais que um católico republicano entendera dever pôr em sua casa, para com
elas festejar a vinda do prelado, foi ao centro republicano quebrar vidros e
tentar um assalto, fazendo o mesmo na casa do presidente da câmara, ao Priorado.
Por coincidência, nesse mesmo dia, Afonso Costa passou por Guimarães a
caminho de Braga, tendo sido objecto da ira dos monárquicos que participavam
nos actos da recepção ao arcebispo.
As manifestações anti-republicanas prolongaram-se pelo dia seguinte, durante
a peregrinação à Penha, onde se fizeram ouvir vivas à Monarquia e à “Santa
Religião”.
No dia 15 de Maio, foi recebida em Guimarães, por telegrama, a notícia da
queda do governo de Pimenta de Castro, às mãos duma Junta Revolucionária
composta por jovens turcos. Numa loja
da cidade, apareceu um placard a
anunciar que a notícia da queda do governo da ditadura era falsa. É fita! É fita!, diziam os monárquicos
de Guimarães, que se foram manifestar para a porta do Centro Republicano, na
rua Avelino Germano, com gritos provocatórios. Os acontecimentos
precipitaram-se quando alguém terá disparado para a janela do Centro. Do lado
de dentro, a resposta não se fez esperar, desencadeando-se um tiroteio que só terminaria com o rebentamento de uma bomba na rua. Resultado: 2 mortos e vários
feridos. Só então é que as autoridades apareceram. Fizeram-se várias
detenções.
As vítimas mortais dos desacatos foram Zacarias da Silva, o Muá, barbeiro, solteiro, morador na
Praça de S. Tiago, e António Machado, o S.
Pedro, surrador, casado, morador no largo Primeiro de Maio. Deram entrada
no Hospital da Misericórdia, com ferimentos graves provocados por estilhaços de
bomba, Sebastião Pinto Salvador, ferrador, solteiro, de 30 anos, ferrador, da
rua do Donães, e Aníbal Ribeiro Soares, curtidor, casado, 24 anos, da rua
Trindade Coelho.
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