Efeméride do dia: Os frades recebem ordem de despejo

Joaquim António de Aguiar, o Mata Frades (1792-1884)

31 de Maio de 1834
São intimados os frades da Costa, S. Francisco, S. Domingos e Capuchos para deixarem os seus conventos, dando-lhes alguns dias, entregando as chaves das igrejas e sacristias aos párocos das suas freguesias e as das casas e oficinas ao corregedor da comarca.
(João Lopes de Faria, Efemérides Vimaranenses, manuscrito da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, vol. II, p. 196)
Assinada a Convenção de Évora Monte (v. efeméride do dia de ontem), prossegue o programa liberal de extinção do Antigo Regime. Muito embora o regente D. Pedro tenha assumido uma postura de recusa do revanchismo sobre os que, na Guerra Civil, tinham enfileirado ao lado das hostes miguelistas, os conventos eram encarados como refúgios de boa parte dos mais ferozes inimigos da ordem constitucional. Mal acabada a guerra, foi publicado o decreto que justificou o cognome por que o seu autor, Joaquim António de Aguiar, ficou conhecido na história nacional, o Mata-Frades. O relatório que antecedia o decreto de 28 de Maio de 1834, publicado no dia 31 seguinte na Crónica Constitucional de Lisboa é expressivo quanto ao modo como, por aqueles dias, eram vistos os que povoavam cerca de meio milhar de casas religiosas em Portugal, cujos rendimentos  com uma dimensão semelhante ao total das receitas do Estado:

Têm-se urdido no Claustro insidiosas tramas contra o Trono legítimo, e contra a civilização e liberdade nacional... as casas religiosas foram convertidas em assembleias revolucionárias; os púlpitos em tribunais de calúnias facciosas e sanguinolentas; e o confessionário em oráculos de fanatismo e de traição. A Nação inteira viu uma parte do Clero Regular trocando a milícia de Deus pela milícia secular, abandonando efectivamente o Santuário cuja potência os não secundava, despojando o culto de suas opulências, para as converter em meios e estímulos de guerra, distribuindo com uma mão as relíquias dos Santos, e com a outra as armas fratricidas, alternando as verdades do Evangelho com as mentiras mais absurdas, as orações com as proclamações mais ferozes, e para cúmulo de horror perpetrando na solidão da noite desacatos inauditos para os assoalhar de dia como obra dos liberais: a Nação toda viu alistado nesses bandos de selvagens assim fanatizados, correndo as fileiras, cingindo em vez do cilício que lhe cumpria trazer, a espada que devera exterminá-lo, e disparando rios de morte com as mãos que foram sagradas para suplicar e atrair as bênçãos do Céu sobre os seus semelhantes, incitando com sua palavra e com o exemplo ao roubo, ao assassínio, e ao incêndio; submetendo enfim a Religião aos caprichos de uma imaginação delirante e furiosa (Relatório do decreto que suprime as congregações religiosas).
(Relatório do decreto que suprime as congregações religiosas, in Maltez, José Adelino, Traição e Revolução – Uma biografia do Portugal político do século XIX ao XX, Vol. I (1820-1910), Tribuna da História, Lisboa, 2004, pp. 243-244)

Os conventos masculinos de Guimarães foram esvaziados de imediato, à imagem do que sucedeu no resto do país (para os femininos, iria adoptar-se um procedimento diferente: tendo sido igualmente extintos, a sua entrega ao Estado apenas aconteceria após a morte da última das sua freiras, tendo-se proibido os noviciados). No dia 18 do mês seguinte, foi publicado o decreto sobre a venda dos bens nacionais, em que os bens de mão morta (que não se transmitiam por herança, ficando para sempre nas mãos da Igreja) dos conventos foram colocados em hasta pública.

Em Guimarães ficaram todos os conventos masculinos completamente devolutos em 9 de Julho, na sequência de nova intimação do corregedor. Destes,  Convento de Santa Marinha da Costa seria vendido em leilão. A Câmara pretendia dar-lhe um outro destino, que o Governo não autorizou. A este propósito, escreveu o Padre António Caldas no seu Guimarães - Apontamentos para a sua História:

Em 1834, em sessão de 29 de Novembro, representou a câmara às cortes, pedindo a criação, no próximo convento da Costa, dum estabelecimento de educação de expostos, onde ao menos se lhes ensinassem as primeiras letras, com algum ofício útil; bem como se ensinassem também às meninas as prendas domésticas. Mas o governo de sua majestade, talvez por motivos de muito peso, preferiu a venda do convento, por um preço inferior ao valor das telhas, que cobriam este edifício, à fundação dum instituto de tal ordem!

Nos anos que se seguiriam, muito se discutiria acerca do destino a dar aos conventos masculinos de Guimarães. O de S. Francisco seria entregue à Ordem Terceira que hoje o governa; o de Santo António dos Capuchos seria adquirido pela Misericórdia, para acolher o seu hospital; o de S. Domingos viria a ser entregue à Sociedade Martins Sarmento, para nele instalar os seus museus, a sua biblioteca e os seus serviços. E assim continuam nos dias de hoje.
Pela sua parte, o Mosteiro da Costa, foi colégio, seminário e casa de habitação. Em 1911 passou a ter António Leite de Castro Sampaio E Vaz Vieira como proprietário único. Retornaria à posse do Estado. No princípio do último quartel do século XIX passou por um profundo processo de requalificação, com projecto de Fernando Távora, que o transformou numa pousada.

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