Efeméride do dia: Inauguração do cemitério da Atouguia

Cemitério da Atouguia (capela)
11 de Maio de 1879
Pelas 12 horas do dia, teve lugar a bênção solene do cemitério público no monte da Atouguia. Foi benzido pelo arcipreste do julgado eclesiástico, António Manuel de Matos, com assistência da Câmara Municipal, Misericórdia, Ordens terceiras, quase todas as irmandades e as confrarias, todas com grande número de irmãos, bem como grande concurso de povo. Depois que terminou este acto acabaram de ter lugar dentro de barreiras, inclusive no antigo Campo Santo, os enterramentos. Foi o penúltimo enterramento dentro da cidade, ontem 10, à noite, em S. Francisco, o de D. Maria de Belém, e hoje, às 10 horas, o último, na Colegiada, o do chantre como ficou dito.
 (João Lopes de Faria, Efemérides Vimaranenses, manuscrito da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, vol. II, p. 136 v.)

Antigamente, os enterramentos faziam-se no interior das igrejas. Todavia, esta prática levantava um problema que ia aumentando à medida que a população crescia: no chão das igrejas não havia lugar para todos os que morriam. Muitos teriam que ficar de fora. E esses eram os pobres. Os pobres da vila de Guimarães eram enterrados, primeiro, no claustro da Colegiada e, depois, no adro da igreja de S. Sebastião, que se erguia junto à Alfândega (onde ainda hoje se mantém a torre onde está a inscrição “Aqui nasceu Portugal”). Era aí que, em meados do ano de 1770, se situava o “cemitério dos pobres”, então considerado demasiado pequeno, além de ter o problema de estar em terreno com lajes e penedos, o que impedia que as sepulturas tivessem mais do que dois palmos de profundidade, o que dificultava a decomposição dos cadáveres e provocava maus cheiros, que originavam queixas dos vizinhos. Esta situação era, naquela altura, particularmente grave, por força de uma epidemia (“malina”) que então grassava na vila. O Abade de Tagilde registou que, para resolver a situação, que ameaçava a saúde pública, “a câmara deliberou que as freguesias vizinhas onde corressem rios trouxessem água para regar o cemitério a fim de apressar a consumpção e resolveu fazer novo cemitério, escolhendo para ele o sítio chamado o Capitão Farrapo, fora da porta de Santo António, que é público e onde não há prejuízo de terceiros”.
Quem iria assumir a tarefa da criação do cemitério seria o novo D. Prior da Colegiada, D. Domingos Portugal e Gama, que se apresentou por aqueles dias e que comprou o terreno e o mandou murar. A Misericórdia daria conta da sua concordância em relação à decisão de instalar no Campo do Capitão Farrapo o Campo Santo onde passariam a ser enterrados os pobres de Guimarães.
Em 1835 foi publicado um decreto que, por razões sanitárias, proibia os enterramentos no interior das igrejas, obrigando à construção de cemitérios municipais localizados fora das zonas habitacionais. Passariam mais de quatro até que o cemitério municipal de Guimarães começasse a funcionar. Só no início de 1870 é que a Câmara aprovaria a sua localização. O monte da Atouguia foi o sítio escolhido. Decorridos dois anos, foi publicado um decreto declarando “de utilidade pública e urgente” a expropriação dos terrenos necessários para construção do cemitério.
Em Outubro de 1873, a Câmara decidiu mandar demolir o claustro do antigo convento de S. Domingos, devendo a sua arcada, por proposta do vereador José Joaquim da Costa, o Vago Mestre, ser aplicada no cemitério que andava em construção. Esta demolição não se concretizaria na totalidade, devido à posição que encontrou na cidade (apenas seria desmontado o piso superior do claustro).
O regulamento para o cemitério foi aprovado pela Câmara de Guimarães no dia 25 de Agosto de 1878, tendo sido aprovado pela Junta Geral do Distrito em finais de Novembro do mesmo ano.
O último enterro dentro de barreiras da cidade aconteceu no dia 11 de Novembro de 1879. O defunto era o cónego chantre de Guimarães, José António Vimaranense, que foi sepultado na igreja da Colegiada. Segundo João Lopes de Faria, os ofícios fúnebres por este religiosos não tiveram a solenidade que se impunha: “ principiaram às 8 horas e meia, rezaram-nos e antes das 10 e meia já estavam concluídos, e os capelães a marcharem para a bênção do cemitério da Atouguia para ganharem uns míseros tostões. Foram uma vergonha”.
Inaugurado o cemitério municipal da Atouguia naquele mesmo dia, que calhou a um domingo, logo no dia seguinte, 12 de Maio, ali teve lugar o primeiro enterramento. Foi então a sepultar a esposa do carreteiro Ventura de Melo. O funeral, que não teve padre nem capela, que ainda não estava construída, atraiu muita gente, que ali foi para ver o cemitério e admirar o novo carro funerário, que logo foi baptizado de cozinha de ferro.

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