Pregões a S. Nicolau (29): 1859

Milagre de S. Nicolau


Em 1859, o pregão das festas de S. Nicolau teve os mesmos protagonistas do ano anterior, saiu da pena de José Ferreira Mendes de Abreu (Fatinho) e João Pinto de Queirós deu-lhe voz.
Desde o primeiro pregão, de João Evangelista, é recorrente a presença de uma entidade chamada Lysia ou Lyzia que, confesso, não percebia o que seria, apesar de ter procurado em todas as fontes de mitologia clássica que tenho ao alcance. Não encontrei qualquer figura mitológica com esse nome. Não encontrei, nem podia encontrar: não é uma deusa, mas um território. A Lícia onde fica a cidade de Mira, da qual S. Nicolau foi visto. Às vezes a evidência demora em saltar aos olhos... 

BANDO ESCOLÁSTICO.
Recitado no dia 5 de Dezembro de 1859
por
JOÃO PINTO DE QUEIRÓS

Ostenta, Guimarães de Lícia flor,
Das galas mais vistosas o esplendor,
Surge com esse garbo e gentileza,
Que te dotara a meiga natureza,
Para os mimos gozares e a alegria,
Que dar-te vai de Nicolau o dia;
Que volver amanhã verás festivo,
Ao coração trazendo o lenitivo,
Do jovem pensador, que já não mente
Fagueiras emoções, que na alma sente;
Vendo chegado tão feliz momento
De mitigar a dor e o sofrimento,
Dum ano inteiro de cruel martírio:
Já sua alma se expande no delírio;
Entregue à dama, com que simpatiza
Linda maçã, que amor bem simboliza:
E a troco vendo, como de improviso,
Assomar-lhe nos lábios um sorriso.
Mas vós anjos!... que sois de amor a vida!
Entes mimosos! e que o mundo apelida
Ornamento da humana geração! –
– Ah! sois no amor o tipo da ilusão!
Quando, formosas, vos direis sinceras?! –
Pois nada em tempo algum,… falai deveras, -
Vos ha merecido da ciência o filho!?
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Qual haverá estulto peralvilho,
Grão bússola, chinfrim, ou ginja ousado
Que nos venha amanhã causar enfado?!
Ai dele!... se tiver o atrevimento
De dar execução ao louco intento,
De, em traje demudado e de careta,
Às damas propalar rançosa treta;
Escusado é lembrar-lhe a dura pena.
Que em tais casos a nossa lei ordena:
Resistir nem sequer ao menos pense,
O poder do estudante não se vence;
Tenha embora arrojado a luva à terra,
E feito nos amores crua guerra,
Mostrando seu valor e intrepidez
Na intriga furibunda, só, talvez!...
E indo mais adiante no cinismo,
De impor às belas leis de despotismo:
Coitado!...menospreza a liberdade,
Esse dom tão sublime em nossa idade,
A base da ciência e da virtude,
Que faz distinta a sábia juventude:
Verdade esta... que em frase a mais sublime
A voz da Natureza bem exprime!
Eia, pois, sócios meus na lide honrosa,
A festa de amanhã fazei pomposa:
Ufanos, sustentai antigo brilho,
Dos passados seguindo o nobre trilho
Ah! não deixeis votado ao desamparo.
De Nicolau o dia tão preclaro.
Avante!... e os ecos do tambor altivo,
No espaço retumbando em tom festivo,
Vão promover não visto entusiasmo,
– E no mundo causar assombro e pasmo.
J. F. M. de Abreu.

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