A questão do Seco

Suplemento ao n.º 3 do Jiustiça de GUimarães
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No ano de 1872, Guimarães foi abalada pela “questão do Seco”. Por aquela altura, um juiz prepotente, Seco de seu nome, lançava a "anarquia na comarca de Guimarães com o seu absolutismo" (expressão de Domingos Leite Castro), chegando a pontos de suspender da advocacia o dr. Avelino da Silva Guimarães, que então exercia as funções de Presidente da Câmara, por este ter ousado questionar o procedimento do magistrado quanto às suas atribuições na administração das crianças expostas. Algum tempo antes, o dr Bento Cardoso, um dos mais prestigiados advogados portugueses do seu tempo, mas então já minado pelos efeitos da doença e da velhice, tinha sido levado a abandonar o tribunal de Guimarães. Foi chegada a hora de também José Sampaio entrar em rota colisão com o famigerado juiz. Em defesa dos direitos de um cliente, que o juiz Seco teimava em atropelar, viu-se forçado a recorrer a Famalicão para encontrar um tabelião que não tivesse medo de lavrar o seu protesto contra a actuação do iníquo magistrado. Em seguida, anunciou que também ele abandonava o tribunal de Guimarães, que "o juiz assim ia despovoando", como escreveria, anos mais tarde, José Sampaio.

Aqui chegados, Francisco Martins Sarmento, tendo tomado conhecimento da situação, se decide a sair a público em defesa do direito e da justiça. É José Sampaio que, a este propósito, nos dá conta de que ele:
''Estava disposto a lutar. O amor da justiça, uma das feições mais salientes do seu carácter, tinha sido locado pela tirania da autoridade: não era preciso mais para o transformar num lutador”.

Já há muito era conhecida em Guimarães a veia de polemista verrinoso e implacável de Martins Sarmento. Não encontrando, nos jornais da terra quem lhe quisesse abrir as páginas para enfrentar a prepotência do juiz, assumiu os trabalhos e as despesas da fundação, produção e distribuição de um jornal, A Justiça de Guimarães, que se publicou enquanto durou a contenda. Aí, à pena apaixonada de Sarmento, juntaram-se outras, com particular destaque para José Sampaio e Avelino da Silva Guimarães. Juntos lançaram uma violenta campanha pública de contestação ao Seco. O juiz replicou-lhes com um folheto; os redactores da Justiça de Guimarães responderam-lhe com um livro.

Dos tribunais, a questão do Seco havia passado para a imprensa; da imprensa transbordou para as ruas O anúncio da anulação da suspensão de Avelino da Silva Guimarães foi sublinhado ruidosamente com o rebentamento de engenhos explosivos nas imediações da residência do Seco e com o passeio triunfal de uma filarmónica pelas ruas da cidade; um partidário do famigerado juiz, que o defendia, como nos dá conta Domingos Leite Castro, "a tanto por linha num jornal lisbonense, veio também a Guimarães, provocando os adversários, procurar duas bofetadas. Levou-as".

No princípio de Agosto a questão do Seco terminava. O juiz foi obrigado a retirar-se de Guimarães. A sua saída da cidade foi saudada festivamente pelo estralejar dos foguetes.

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