Quase a entrar no período de reflexão para o próximo acto eleitoral, partilho aqui algumas reflexões avulsas, que resultam da leitura dos programas dos partidos candidatos ao município de Guimarães.
1. Em primeiro lugar, até pela dificuldade que tive para aceder a alguns dos programas eleitorais dos partidos, noto que, em regra, os programas são encarados como documentos sem importância e escritos com a ideia de que ninguém os lê, apenas servindo para cumprir uma mera formalidade. Está demasiado enraizada entre nós a tradição de que os programas não são para cumprir. E o escrutínio público também não é um costume muito nosso: hoje já ninguém se lembra do que se prometeu há quatro anos e não nos preocupamos em verificar o nível de cumprimento dos programas eleitorais, em apurar se quem foi poder concretizou o que prometera quando foi a votos, nem se aqueles que foram oposição apresentaram as propostas que se comprometeram a apresentar ao longo do mandato.
2. Entre nós também vai faltando o espírito de "governo sombra" na administração autárquica, que permitiria aos partidos que não estão no poder um melhor conhecimento dos dossiês, contribuindo para uma maior especialização e solidez das respectivas linhas programáticas. Acredito que não seria de todo inútil a "institucionalização" pelos partidos da oposição da figura de "vereador sombra", para acompanhamento de cada um dos principais pelouros da autarquia.
3. Podemos dividir os programas eleitorais dos diferentes partidos em dois grupos: há os que estão convictos de que vão ser poder e que, por isso, são mais contidos no que toca a promessas, e os que estão certos de que, no máximo, terão assento na oposição, e que avançam com diferentes promessas, mais ou menos avulsas, sem sentirem necessidade de ponderarem os respectivos cadernos de encargos.
4. O modo como os diferentes partidos abordam a cultura dá-nos uma ideia clara das suas preocupações em matéria cultural. O que vemos, quando olhamos para as propostas dos dois partidos tradicionalmente mais votados em Guimarães, não é especialmente entusiasmante. Em ambos os casos, não se acrescenta uma única ideia nova em relação ao que já era conhecido. Em ambos os casos, nada há, absolutamente nada, para além da CEC2012. Não deixa de ser sintomático que nenhum deles tenha definido uma linha de política cultural para a autarquia. Apenas e só CEC. O que não é pouco, antes pelo contrário, mas que peca por se situar numa área onde a margem de intervenção da autarquia se restringe à construção de obra física.
5. Não terá, porventura, grande significado, mas registo que o PS e o PSD omitiram, nos respectivos programas, quaisquer referências a apoios destinados às associações culturais (o primeiro compromete-se expressamente a apoiar as associações de bombeiros e as associações e clubes desportivos, nada referindo a propósito das associações que trabalham no campo da cultura).
6. A aposta cultural em Guimarães tem estado fortemente voltada para a fruição e muito balanceada para as artes performativas. O tempo que aí vem há-de ser especialmente propício para um maior equilíbrio do investimento cultural, apostando igualmente na criação, nos diferentes domínios da cultura. Há, nas propostas dos partidos, alguns sinais, tímidos embora, de que este pode ser o caminho.
7. Porque não estão inscritas nos programas eleitorais dos partidos melhor posicionados para assumirem a maioria na autarquia, não somos capazes de adivinhar quais serão as linhas de força da política cultural da CMG para os próximos anos. A verdade é que os dois maiores partidos não têm políticas culturais claramente definidas (para além da CEC.) Em ambos os casos, não há enquadramento teórico, não há definição de objectivos, não há uma determinação clara de qual seja a vocação da autarquia na área da cultura. Não estando definidos os limites da intervenção da Câmara, o que podemos ter, nos próximos quatro anos, pode ser tudo ou pode ser nada. É absolutamente necessário definir-se, com clareza e em termos compreensíveis para os agentes culturais, o que a autarquia pode e o que a autarquia deve fazer e o que a autarquia não pode nem deve fazer nos diferentes domínios da intervenção cultural.
8. Na falta de linha de rumo previamente traçada, a acção cultural da CMG tenderá a fazer-se por navegação à vista, ao sabor da maré e da casuística. O horizonte será sempre o mais próximo, as decisões serão contingentes e não necessariamente coerentes entre si.
9. Estarei eu especialmente pessimista em relação à cultura em Guimarães, para além da CEC, para os anos de 2009 a 2013? Nem por isso. Acredito que o improvável não é impossível e que até pode ter forte probabilidade de vir a acontecer. E o improvável que acontece pode ser especialmente exaltante. Como a Capital Europeia da Cultura, improvável, quase impossível, há quatro anos, bem o demonstra.
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