Porquê 1109 e não 1111?


O modo como Alexandre Herculano chegou a 1111 para ano de nascimento de D. Afonso Henriques está descrito na nota XI do Tomo I da sua História de Portugal, que a seguir se transcreve:

NASCIMENTO DE AFONSO HENRIQUES

"A data verdadeira do nascimento de Afonso I é ainda hoje disputada. A «Chronica Gothorum», contradizendo-se a si própria, assina-lhe duas diversas — a de lllleadelll3. A relação da tomada de Lisboa no cartório de S. Vicente de Fora (hoje no Arquivo Nacional) fá-lo nascido em 1107; mas este documento tem contra si o ser escrito quase um século depois do facto. A relação da tomada de Santarém (Monarquia Lusitana, P. 3, Apêndice), cuja fé para alguém é duvidosa, estabelece-lhe a data de 1110. O Livro das Linhagens, atribuído ao conde D. Pedro, parece concordar nisso mesmo; mas o Livro das Linhagens, como hoje existe, é obra de muitas mãos e de diversos tempos, sem que seja fácil discriminar o que é do conde ou posterior a ele, e, portanto, pouquíssima autoridade histórica pode ter. O Livro da Noa de Santa Cruz de Coimbra coloca o nascimento de Afonso Henriques em 1106, e com ele concorda uma nota posta num antigo manuscrito de Alcobaça. Um breviário do mesmo mosteiro, citado também por Brandão e cuja data ignoramos, põe este sucesso em 1109.

No meio de tanta incerteza preferimos o testemunho da «Chronica Gothorum» por ser a que unicamente reputamos contemporânea. Entretanto, é também necessário remover a contradição que aí se encontra, referindo o sucesso numa parte ao ano de 1113 (era 1151) e em duas ao de 1111. Eis as respectivas passagens: «Era 1151. Natus fuit infans Alfonsus...»; «Era 1163. Infans D. Alfonsus... habens aetatis annos fere quatordecim»; no códice que foi de André de Resende e no de Alcobaça: «Era 1163, Infans D. Alfonsus aetatis anno quatordecim»; «Era 1166... mortuo patre... cum adhuc ipse puer esset duorum vel trium annorum.» Esta última passagem, admitida a nossa opinião sobre o ano da morte do conde em 1114, concorda com a outra em que se afirma ter Afonso catorze anos em 1125. Não só por concordarem, mas até por ser mais fácil introduzir-se um erro nos algarismos à margem do códice do que nas palavras do texto, é que se deve preferir a data de 1111.

Dizemos de 1111, posto que o autor da «Chronica Gothorum» hesite entre este ano e o de 1112 («duorum vel trium annorum»), porque esse ano se aproxima mais das datas das outras memórias e porque, desde os últimos meses de 1110 até os princípios de 1112, o conde Henrique andou por França, Aragão e Castela, quase sempre ausente de sua mulher. Acresce a isto que no Pentecostes de 1125 tinha o infante catorze anos completos, porque o «fere» que se lê no exemplar da «Chronica Gothorum» que pertenceu a André de Resende fala nos de Santa Cruz e Alcobaça, e noutra parte nós exporemos as nossas ideias acerca da preferência que merece a lição destes dois códices à dessoutro, que nos parece adicionado."

Como se viu, Herculano calculou o ano de nascimento de D. Afonso Henriques a partir da referência da Chronica Gothorum que diz que o futuro primeiro rei de Portugal teria dois ou três anos aquando da morte de seu pai, que, em sua opinião, teria ocorrido no ano de 1114. Ora, num documento de doação de D. Teresa de 22 de Maio de 1112, diz-se expressamente que, naquela altura, D. Henrique já havia falecido. Por outro lado, o último documento assinado por D. Henrique tem a data de 12 de Abril de 1112. Logo, D. Henrique terá falecido entre essas duas datas, indicando-se geralmente o dia 24 de Abril (Almeida Fernandes defende que foi a 1 de Maio). Assim sendo, se D. Henrique faleceu, como parece certo, em 1112, para que o seu filho tivesse, nessa data, 2 ou três anos, teria que ter nascido entre Abril/Maio de 1109 e Abril/Maio 1110. Deste modo, fazendo-se fé na Chronica Gothorum, fica descartado o ano de 1111.

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