Do Toural: 2. Das fontes e dos monumentos

Fonte-monumento do Toural (1953). Foto obtida aqui.

Um dos temas que, ao longo dos tempos, mais discussões têm gerado, quando se fala do Toural, prende-se com o que se deve lá colocar para embelezar a praça.
No início, o Toural era um imenso terreiro vazio. Em finais do século XVI, colocaram-lhe, no lado Sul, um grandioso chafariz de seis bicas, com taças de pedra bem lavradas e todo cercado de assentos de pedra para se recrearem os que ali vão, obra do célebre arquitecto Gonçalo Lopes. Em meados do século seguinte, o Toural ganhou também um cruzeiro de pedra majestoso, elevado sobre escadas, mandado erigir pela Irmandade da Senhora do Rosário, que ficaria conhecido como o Cruzeiro do Fiado, por ser junto a ele que se mercadejava o linho. Chafariz e cruzeiro foram retirados na década de 1870, no decurso do processo de renovação que criaria o jardim fechado, ao jeito do da Praça da Batalha, no Porto.
Em 1834, logo após a morte de D. Pedro IV, a Câmara aprovou a proposta de erecção no Toural de um monumento à sua memória, assim descrito no texto da deliberação: “uma pirâmide quadrangular de pedra fina, cujo ápice sustente um livro, representando a Carta Constitucional que ele nos outorgou; e uma espada, representando aquela com que o herói libertou a pátria”. Este monumento não passaria do papel.
Em 1911, foi colocada no centro do jardim do Toural aquele que o povo chamava de Rei Preto, o monumento de D. Afonso Henriques esculpido por Soares dos Reis que, até aí, estivera no largo de S. Francisco. Seria transferida, em 1940, para junto do Paço dos Duques. Por algum tempo, o centro do jardim do Toural ficaria vazio, discutindo-se o que lá se deveria colocar. Inicialmente, pensou-se realizar a proposta da Comissão Municipal de Estética (composta por Alberto Vieira Braga, Alfredo Guimarães, António de Azevedo, Luís de Pina e pelo Arq. José António Sequeira Braga) aprovou em 1939, fazendo regressar ao Toural o chafariz quinhentista. Depois de aceso debate público, decidiu-se construir uma fonte monumento, cuja concepção foi encomendada ao Arq. Sequeira Braga, que viria a ser inaugurada em 1953. Incluindo uma escultura em bronze de Eduardo Tavares, representando a vitória e a independência, o monumento comemora o milenário de Guimarães.
A solução proposta no projecto de intervenção no Toural e na Alameda actualmente em discussão pública, não me parece a melhor, tanto do ponto de vista artístico, como do da memória histórica (o mesmo penso, aliás, do que se propõe para as fontes do jardim da Alameda com esculturas de António de Azevedo). Intervenções sobre obras artísticas como as propostas parecem-me tão defensáveis como pretender retocar o auto-retrato de Van Gogh, pintando-lhe a orelha que lhe falta. Não me parece uma boa opção a ideia de desmantelar a fonte monumental, apenas aproveitando, da obra de Sequeira Braga, a escultura de Eduardo Tavares, que seria transferida para um espelho de água. Tenho para mim que aquela obra deve ser vista como um todo e não como o somatório de duas partes independentes. Se a opção for retirar do Toural, nada a opor. Certamente não faltará local onde o monumento possa ser colocado com dignidade e enquadramento adequado.
O que colocar, então, no Toural? Obra(s) de arte contemporânea(s), sem dúvida. Mas continuo a pensar que será de ponderar a possibilidade de integração no novo desenho da praça de duas peças magníficas, que foram originalmente concebidas para o Toural: o chafariz de 1588 (como propunha, há quase 70 anos, a Comissão Municipal de Estética) e o célebre Cruzeiro do Fiado.

O Chafariz do Toural (1588), pormenor (Foto de Eduardo Brito).

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