No ano de 1516, as gentes da governança de Guimarães enviaram ao rei uma petição suplicando meios para construir uma nova casa do Concelho. A resposta de D. Manuel I veio por um alvará de 27 de Agosto daquele ano. Na Praça Maior, ao lado da sede do poder religioso, a Colegiada, instalou-se o poder político de Guimarães.
As marcas manuelinas ainda persistem nos elementos decorativos do edifício, apesar das alterações que sofreu ao longo do tempo. A estrutura da Casa da Câmara é singela, com o espaço fechado limitado ao piso superior e sustentado pela arcaria ogival que franqueia a passagem entre a Praça da Oliveira e a antiga Praça do Peixe (S. Tiago). Tem planta rectangular, com duas salas cobertas por tectos abaulados de madeira pintada.
Segundo uma descrição de 1612, existia, na sala voltada para nascente, uma capela metida na parede onde, junto a um quadro que representa o Espírito Santo (actualmente depositado no Museu Alberto Sampaio), se dizia missa antes das vereações, às quartas-feiras e aos sábados.
A Sala de Audiências, no lado poente, tinha uma mesa destinada aos oficiais da Justiça e ao redor das paredes assentos de pau com seus encostos lavrados e no meio umas grades para não entrarem delas para dentro. Do lado voltado para a Praça de S. Tiago, estava colocada, em plano elevado, a mesa de audiência dos julgadores.
Em 1606, foi assentado no topo da fachada principal o sino de correr da Vila, trazido do Castelo, que servia para chamar para vereações e audiências. Ao lado da sineira, estava um magnífico relógio de sol, em granito fino. Meio século depois, no cunhal da esquina da rua dos Açoutados, foi embutida, por ordem de D. João IV, uma pedra com uma inscrição em honra da Imaculada Conceição, padroeira de Portugal
Por diversas vezes, a Casa da Câmara ameaçou ruína. Outras tantas foi restaurada. Segundo o Padre Caldas, numa das intervenções do século XVIII fizeram-lhe janelas segundo o gosto moderno, que foram coroadas com os escudos reais e as esferas armilares que até aí estavam cravados no liso da parede, por baixo das ameias.
Em 1877, a Casa da Câmara teve nova reforma, que deixou marcas na fachada. A sineira e o relógio foram apeados, o reboco da parede foi removido, ficando a parede em pedra nua, e foram alteradas as posições das esferas e dos escudos sobrepostos às janelas. Na platibanda de onde desceu o sino, foi colocada a estátua de um guerreiro trazida da antiga Casa da Alfândega. Segundo a tradição popular, esse guerreiro seria o Guimarães, outorgando-lhe a condição de símbolo epónimo da cidade. Tem um rosto esculpido sobre o ventre, sendo associado à tradição das duas caras, de feição pejorativa, que se refere a uma suposta duplicidade de carácter das gentes de Guimarães.
Há uma outra interpretação das duas caras de Guimarães, com origem recente, que remete para o seguinte episódio da conquista de Ceuta: tomada aquela praça marroquina, D. João I repartiu a defesa dos diferentes troços da sua muralha pelas terras que o acompanharam na conquista. Como os de Barcelos se puseram em retirada perante a arremetida dos mouros, deixando desguarnecida a estância que lhes cabia defender, foram os de Guimarães que se desdobraram, cumprindo, com sucesso, a sua missão e a dos de Barcelos. As caras da estátua representariam as duas frentes (caras) que os vimaranenses terão defendido em Ceuta. Esta versão, sem suporte documental nem tradição historiográfica, não tem sustentação. Além do mais, na nossa língua, cara nunca foi sinónimo de frente de batalha…
A realidade é que não se encontra fundamento para a identificação da estátua com Guimarães: não existe nenhum documento que se lhe refira. Aquela figura nada tem a ver com a iconografia vimaranense. É apenas a representação de um guerreiro que enverga uma armadura ornamentada com uma carranca, sobre a qual algum dia se inventou um chiste que ganhou foros de tradição.
0 Comentários