Quando um tostão não é um tostão.



Aparentemente, é uma história corriqueira do nosso novo normal: uma imobiliária adquiriu um prédio numa praça do Centro Histórico de Guimarães, supostamente para o converter numa unidade de alojamento local. Algo que agora acontece quase todos os dias.
Nada de extraordinário, portanto, não fosse nesse prédio estar instalada uma das instituições culturais mais relevantes da cidade. E é esse pormenor que faz deste negócio uma história estranha, sobre a qual muito se tem dito e, certamente, muito mais se dirá nos tempos que aí vêm.
Por estes dias, bastante tenho lido e ouvido acerca da postura da entidade compradora, de que é único administrador um conhecido empresário que tem construído uma imagem de mecenas da cultura e de compromisso com a responsabilidade social. No entanto, confesso que não me causa qualquer estranheza o facto de um negociante não perder a oportunidade de fazer um bom negócio (e este foi, a atender ao valor da aquisição, um excelentíssimo negócio). O que me provoca estranheza são as motivações de quem vendeu, que desconheço. Aparentemente, terá procedido sem sentir necessidade, nem sequer por simples cortesia, de informar previamente o seu inquilino de há mais de meio século da intenção de vender o prédio, não podendo ignorar que o iria colocar em dificuldades, e manteve essa intenção, mesmo depois de saber que o inquilino estava na disposição de exercer o direito de preferência, pagando, nos termos da lei, o valor que estava acertado para a venda.
Diz-se que o dinheiro não tem cor, que negócio é negócio, que um tostão é um tostão (ou, na versão que ficou célebre pela voz do nosso conterrâneo Manuel Machado, que um vintém é um vintém). Ninguém duvidará que os 370.000 euros que a imobiliária pagou pelo prédio valem exactamente o mesmo que os 370.000 euros que o Convívio reuniu e se dispôs a pagar pelo mesmo prédio, pelo que ficam por explicar as razões pelas quais o vendedor deu preferência aos primeiros, colocando em dificuldades uma instituição relevante na cidade, enfrentando um clamor público de reprovação e, certamente, não ignorando que se poderia estar a envolver numa contenda jurídica de que poderá não sair incólume.
Pelo que se percebe do que vai sendo público, tudo terá sido feito de modo a que o Convívio não pudesse exercer o direito de preferência e na suposição de que dificilmente aquela associação reuniria as condições para o fazer (porque, como qualquer associação cultural desta nossa terra, não nada em dinheiro e porque os seus mecanismos de decisão dificilmente se compaginam com o cumprimento de prazos apertados). Mas a associação reuniu as condições necessárias e manifestou a sua intenção de exercer o direito de preferência. O que fez o vendedor, depois de ter sido informado da intenção do inquilino? Escudou-se num precedente jurídico qualquer e comunicou ao Convívio que lhe retirava esse direito.
Neste ponto, já pouco importam os argumentos legais que invoquem prazos, precedentes ou quaisquer outros pretextos para justificar a negação do direito de preferência ao Convívio. São falaciosos, não conseguindo ocultar o que salta aos olhos: o vendedor, deliberadamente, não quis vender o prédio ao seu inquilino de há mais de meio século, não hesitando em comprar uma guerra jurídica que poderá arrastar-se nos tribunais por muito tempo. Fez o que pode ser classificado como uma venda hostil. O porquê é um mistério.
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Em 1964, as Festas da Cidade estavam em risco. O tempo escasseava e o desfecho parecia inevitável. Foi então que uma jovem associação cultural de Guimarães reuniu a sua assembleia geral e tomou uma decisão corajosa: iria assumir a organização das festas. Em dois meses, pôs de pê as Gualterianas que, nesse ano, foram um sucesso. Em 1964, o Convívio salvou as Festas da Cidade. Hoje, é o Convívio que está em risco. A cidade não o deixará cair.

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