É uma das maiores tragédias de que há memória
em terras de Guimarães. Aconteceu em pleno Toural, há 75 anos. Dez mortos, meia
centena de feridos, dos quais treze ficaram internados em estado grave. Trinta crianças
ficaram órfãos. Tudo aconteceu por volta das 7 horas da manhã do dia 1 de
Dezembro de 1942 quando, no final da missa na Basílica de S. Pedro, o pároco procedia
à distribuição de pão pelos mais carenciados, que se juntaram num corredor lateral,
cujo soalho não suportou o seu peso, desabando sobre o sala do estabelecimento
contíguo, a cervejaria Atlantic, de Francisco Mourão. O que se seguiu ainda perdura
entre as memórias mais dolorosas que muitos vimaranenses ainda hoje recordam. O
desastre do primeiro de Dezembro de 1942 colocou Guimarães nas primeiras
páginas dos jornais portugueses.
Aqui fica a notícia de primeira página do Diário de Lisboa do dia seguinte à tragédia da Basílica de S. Pedro.
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Uma tragédia em Guimarães
Abateu o soalho da Basílica quando estavam a ser distribuídas
esmolas a centenas de pobres
Há 10 mortos e 50
feridos
GUIMARÃES, 2. — (Pelo
telefone). A população desta cidade e de toda a região encontra-se dolorosamente
impressionada com a horrível tragédia que ontem se
deu e que custou a vida a dez pessoas, provocando ferimentos em mais de
cinquenta.
O desastre ocorreu na basílica de
S. Pedro. Depois da celebração da missa diária das almas, às 6 horas e 30, o padre José Ferreira Leite ia proceder, às 7 horas, à distribuição
de esmolas por intenção de numerosos mortos. Centenas de pobres acumulavam-se
num corredor lateral da igreja, que dá acesso à
capela-mor e que há muito tempo, praticamente, não era utilizado.
De repente, devido ao excesso de
peso, o velho soalho do referido corredor desabou, precipitando-se toda aquela
pobre gente, aos montes, no salão de jogos de mesa da cervejaria Atlantic, do sr. Francisco
da Cunha Mourão.
Os que ficaram sob aquela massa
de corpos morreram momentos depois, na sua maior parte asfixiados.
Estabeleceu-se pânico indescritível, ouvindo-se muitos gritos e gemidos. Os sinos tocaram
pedindo socorros, que não se fizeram esperar,
por parte dos bombeiros voluntários, que, dirigidos pelo seu comandante, sr. professor
José Luís de Pina, compareceram com as suas
viaturas, guardas da Polícia de Segurança Pública, populares, etc.
Começaram logo a ser retirados os
mortos e os feridos, que foram conduzidos, em ambulâncias, ao Hospital da Misericórdia. E em menos de um quarto de
hora toda aquela gente foi socorrida, devendo-se a essa rapidez a circunstancia de não ter havido mais vitimas.
Naquele hospital, compareceram
imediatamente os clínicos srs. drs. Alfredo Peixoto, João de
Almeida, Alberto Faria, João Afonso de Almeida, João da Mota Prego, Mário Dias de Castro. Augusto Ferreira da Cunha, Alberto
Milhão, Alfredo Bravo, Carlos Saraiva e José de Castro Ferreira, a sr.a
dr.a Edviges Machado e diversos enfermeiros, farmacêuticos, etc., sendo a todos os feridos prestado
rápidos socorros.
Os
mortos e os feridos
Foram verificados os óbitos de dez
pessoas: Antónia da Silva, casada, doméstica; Adélia de Freitas,
casada, operária fabril; Maria Emília, solteira, de 14 anos; Adão Martins, de 15 anos; João
Luís da Costa, de 12 anos; Maria Rodrigues da
Silva, solteira, de 27 anos; Rosa Mendes, casada, doméstica, de 56 anos; Joaquina Domingues, casada, de 50 anos;
João Lopes, de 8 anos; e Fernanda Leite, de 10 anos.
Ficaram feridas mais de cinquenta
pessoas, tendo a maior parte retirado para as respectivas residências, depois de
pensadas.
Ficaram hospitalizados os
seguintes feridos, alguns dos quais se encontram em estado grave; Maria Antónia Vieira
Pinto, de 15 anos; Joaquina Mendes, solteira, de 26 anos; Maria da Conceição
Fernandes, casada, de 47 anos; Custódia
Salgado, viúva, de 50 anos; Laurinda Fernandes da Silva, de 52 anos; Genoveva Pereira, de 12
anos; Maria Duarte de Oliveira, viúva, de 58
anos; Emília Teixeira, solteira, de 50 anos;
Maria Rosa de Oliveira, de 15 anos; Ermelinda de Freitas, casada, de 36 anos; Emília Lopes, viúva, de 61 anos; Claudino Vieira Fernandes, de 11 anos; e Serafim de Sousa Pinto, de 8 anos.
O largo fronteiro à basílica de São Pedro encheu-se de gente, que soltava gritos
aflitivos.
No hospital da Misericórdia — onde compareceram os srs. drs. José Joaquim de Oliveira,
governador civil de Braga, e dr. João Rocha de Castro, presidente da Câmara Municipal de Guimarães, que visitaram os feridos—
deram-se muitas cenas lancinantes.
As bandeiras de todas as corporações
estão a meia haste, sendo a consternação geral.
As autoridades ordenaram que a
Casa dos Pobres forneça diariamente refeições às famílias das vítimas, entre as quais ficam órfãs trinta crianças.
Diário de Lisboa, 2 de Dezembro de 1942
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