Os caminhos para Guimarães, segundo "os estatísticos". |
Há em Guimarães uma nova paixão: as estatísticas.
À entrada da cidade, deparo-me com um cartaz que me informa
que Guimarães já ocupa o quinto lugar no ranking dos concelhos mais
exportadores do país. Magnífico. Mas o que é que isso me diz sobre o nível de
vida dos vimaranenses? Nada. Consulto as estatísticas e verifico que, segundo
os últimos dados disponíveis (referentes a 2013), a remuneração média mensal dos
trabalhadores por conta de outrém de Guimarães se ficava por uns tristes 77% da média
nacional. Céu ou Inferno?
O portal da PORDATA, na informação desagregada por
municípios, disponibiliza quase uma centena de indicadores, havendo-os para
todos os gostos. Escolhas cirúrgicas desses indicadores permitirão pintar o
quadro de Guimarães com os tons do mais luminoso cor-de-rosa, ou com as
diferentes variações de cor-de-laranja, que é a cor que, na pintura antiga, predomina nas representações
do Inferno.
As estatísticas são ferramentas muito úteis para a análise
dos diferentes processos sociais, económicos, financeiros, históricos, etc, mas
têm que ser usadas com cautela e espírito crítico. São construções e, enquanto
tais, quem as usa deve ter o cuidado de procurar perceber como é que foram
construídas, ou seja, quais as opções que foram tomadas pelos estatísticos que
permitiram chegar ao resultado que se observa. Porque, em estatística, caminhos
diferentes não conduzem necessariamente a resultados iguais.
Ontem, mostrei aqui um exemplo que encontrei na PORDATA que demonstrava que, na construção das amostras estatísticas, opções erradas produziam respostas incorrectas. Era um exemplo de uma
realidade que conheço bem, em que os resultados apresentados eram
manifestamente incorrectos. À pergunta “onde há mais e menos homens ou mulheres
a frequentar o ensino universitário e politécnico?”, a resposta era a de que em
Guimarães havia, no ano de 2016, 70 estudantes a frequentarem o ensino superior.
Notei o erro, que era mais do que evidente, e logo me caíram em cima alguns dos
especialistas instantâneos em estatísticas que passaram a povoar as redes sociais e que, aparentemente, nem sequer se deram ao trabalho de ler o que eu escrevi, a
acusarem-me de ter dito aquilo que nunca disse, em defesa de uma dama, a
PORDATA, que eu não sabia pertencer-lhes.
O que eu pretendia, no que escrevi, com a ironia de que fui
capaz, é que não é recomendável usar a informação estatística, venha ela de onde
vier, de forma acrítica. Porque, sem informação que complete os quadros estatísticos
e que nos informe de onde provêem e quais são os dados que foram utilizados para
a sua elaboração, há sempre informação relevante que nos falha.
Dou outro exemplo, colhido na mesma PORDATA (que, note-se, é
uma ferramenta inquestionavelmente útil, a que recorro com frequência na minha
actividade profissional), referente a outra realidade que conheço bem, os
museus. Segundo a PORDATA, no ano 2000 havia um único museu em Guimarães. Em
2009, já eram 5 e, em 2013, 6, número que não se alterou até ao último ano
disponível, 2015. Ora, não é preciso um esforço muito grande para perceber que
estes números não batem certo com a realidade instalada. Nem no ano 2000, nem
agora. Uma visita à página do Guimarães
Turismo, permite contar 10 museus, sendo certo que um deles, a Casa da
Memória, só abriu em 2016, e que um outro, a Sala Museu José de Guimarães, no Paço
dos Duques, não é propriamente um museu, o mesmo se podendo dizer, porventura,
do Núcleo Arqueológico da ACIG. Porém, sem muito esforço, sou capaz de acrescentar
dois museus que não constam da lista do Guimarães Turismo, o Museu da
Agricultura de Fermentões e o Museu da Vila de S. Torcato. Em suma, também
aqui, a informação estatística é visivelmente deficiente.
Servirá isto para que se afirme que toda a informação da
PORDATA está errada? Claro que não. O que serve é para reafirmar a necessidade
de cautelas básicas na utilização da informação estatística disponível.
Apenas isso.
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