J. Santos Simões (pormenor de fotografia de Armindo Cachada) |
No dia 22 de Junho de 2004, Santos Simões faltou, pela primeira vez, a uma reunião da direcção da Sociedade Martins Sarmento, a que presidia desde 1990. Nunca mais regressaria, mas nunca mais deixou de estar presente naquela velha casa de cultura de Guimarães. No dia 24, o jornal Público publicaria uma nota cronológica escrita pelo jornalista vimaranense Victor Ferreira, que aqui se recorda-
Faleceu Joaquim Santos Simões
Joaquim Santos Simões,
presidente da Sociedade Martins Sarmento, uma das mais importantes
instituições culturais de Guimarães, faleceu ontem, ao início da
tarde, no Hospital de S. José, em Fafe, após ter sofrido uma
paragem cardio-respiratória. A morte de Santos Simões deixou
Guimarães de luto, a cidade que, desde 1957, o acolheu e à sua
família, depois de ter saído de Coimbra.
Joaquim António dos Santos
Simões nasceu a 12 de Agosto de 1923 na vila de Espinhal, concelho
de Penela, distrito de Coimbra. Entre 1944 e 1947, já como aluno da
Universidade de Coimbra (UC), participou nas movimentações
reivindicativas dos estudantes, dedicando-se ainda ao Teatro de
Estudantes da UC, onde foi director, encenador e actor. No ano
lectivo de 1950/51 acaba por ser eleito presidente da Associação
Académica de Coimbra (AAC) e conclui as suas licenciaturas em
Ciências Matemáticas e Engenharia Geográfica. Já então se
destacava por aquilo que alguns dos seus colaboradores mais próximos
designam como um "profundo sentimento de justiça e intervenção
social". Depois de leccionar no ensino particular, em 1957
transita para Guimarães onde se torna professor do ensino público
na então Escola Industrial e Comercial de Guimarães.
É nesta cidade que Santos
Simões começa a intensificar o seu trabalho ligado à cultura,
vindo a iniciar, em 1963, uma actividade política organizada,
militando na oposição democrática do distrito de Braga.
Paralelamente, notabiliza-se como um dos fundadores do Cineclube de
Guimarães e do Teatro de Ensaio Raúl Brandão, ligado ao Círculo
de Arte e Recreio, três instituições onde ocupou cargos e
desempenhou um papel importante até ontem, dia da sua morte.
Em 1968 foi preso pela PIDE,
vindo a ser expulso do ensino devido à sua militância contra o
Estado Novo. Um ano mais tarde, participa no II Congresso da Oposição
Democrática, em Aveiro e é candidato da CDE por Braga, na campanha
"eleitoral" para a Assembleia Nacional.
No pós-25 de Abril, é
reintegrado no ensino oficial, regressando à (ainda) Escola
Industrial e Comercial de Guimarães. Na mesma altura, participa
activamente na criação do Partido Movimento Democrático Português
(MDP/CDE), integrando os órgãos directivos nacionais e sendo um dos
responsáveis pelo partido no distrito de Braga e em Guimarães.
Chega a ser indicado pelo MDP/CDE para os cargos de governador civil
e de Ministro de Educação, mas foi rejeitado por António Spínola
"por ser comunista", segundo descrevem as notas biográficas
sobre a sua vida que o próprio deixou escritas. Participou na
criação de novas associações culturais em Guimarães, como a
cooperativa editorial O Povo de Guimarães, a Cercigui, e em 1990 é
eleito presidente da direcção da Sociedade Martins. Anteontem,
Santos Simões faltou pela primeira vez a uma reunião de direcção,
consequência do seu estado de saúde fragilizado decorrente da
doença renal que o afectou nos últimos quatro anos. Curiosamente,
foi neste período que Santos Simões teve ainda força para
concretizar alguns dos projectos mais importantes da Sociedade
Martins Sarmento, como a construção do Museu de Cultura Castreja,
inaugurado em Guimarães o ano passado, ou a criação da Casa de
Sarmento, uma unidade cultural dedicada aos estudos históricos.
Para Amaro das Neves,
docente da Universidade do Minho - cuja comissão instaladora Santos
Simões integrou em 1975 - e seu companheiro de trabalho na Sociedade
Martins Sarmento durante os últimos 15 anos, o desaparecimento desta
figura é uma "perda irreparável para a democracia portuguesa e
para a cultura de Guimarães e do país". A sua morte foi
igualmente lamentada pela Câmara de Guimarães, que ontem à tarde
divulgou um comunicado.
O corpo de Santos Simões
está em câmara ardente nos Passos Perdidos da sede da Sociedade
Martins Sarmento, de onde amanhã, pelas 9h00, partirá o cortejo
fúnebre rumo ao cemitério do Prado Repouso, no Porto, onde o seu
corpo será cremado, conforme era sua vontade.
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