"Parque de estacionamento" de S. Francisco, por estes dias, ao início da noite. |
Tem
sido visível, nos últimos tempos, a paulatina transformação do
terreiro de S. Francisco num parque de estacionamento, por via da sua
paulatina ocupação abusiva, por um lado, e, mais recentemente, de
uma decisão controversa tomada por quem tem a competência de a
tomar para resolver um decorrente da instalação de um estaleiro de
obras da responsabilidade do município no parque de estacionamento
do Jardim de Infância S. Francisco.
A
propósito desta questão, antes de mais considerações, começamos
por recordar a reacção do então Presidente da Câmara na sequência
de uma situação semelhante àquela que tem vindo a tornar-se numa
realidade persistente de que as autoridades, aparentemente, não
tomavam conhecimento. Estávamos nas vésperas do Natal de 2011:
Como
contributo para uma melhor compreensão das palavras de António
Magalhães, aqui fica, por agora, a descrição da intervenção de
requalificação do Terreiro de S. Francisco, nas palavras da responsável pelo respectivo projecto:
Terreiro de S. Francisco (fotografia de Rita Burmester) |
Localizado
no lado sul da Alameda de São Dâmaso e implantado a um nível
claramente inferior, o Convento de São Francisco* materializa um
processo edificatório que ocorreu entre os séculos XIV e XVIII.
Apresentando-se como um valioso conjunto patrimonial, oferece à
cidade quer a sua igreja, com uma cabeceira que possui um valor único
na compreensão da arquitectura gótica mendicante em Guimarães,
quer — contrastando vivamente com a secura da construção
tardomedieval intervencionada em meados do século passado — a
expressão barroca do corpo azulejado do antigo hospital e a
exuberante fachada rococó da capela.
Apesar
de ser considerado um dos edifícios monacais de maior importância
na urbe nunca dispôs, ao longo da sua secular existência, de um
espaço fronteiro de representação que fizesse justiça à sua
importância e valia arquitectónica. Ao repensar a frente urbana do
Convento de São Francisco no sentido da sua nobilitação, o
projecto ambicionou, através de uma intervenção muito
deliberadamente reduzida ao indispensável, materializar um espaço
que se constituísse como o seu terreiro, estabelecendo um chão
adequado à eloquente retórica que o edifício exprime.
Assim,
num gesto que pretende atribuir um novo significado urbano ao
conjunto franciscano, foi desenhada uma extensa superfície lajeada a
granito — que encontrou a sua métrica nas irregularidades
do pavimento preexistente —, um
plano que se dispõe ao longo do convento, capela e dependências da
homónima Venerável Ordem Terceira.
Este
terreiro ex-novo,
seco e grave, acolhe dois
objectos autónomos que também eles, por oposição, se complementam
e reforçam: o cruzeiro datado de 1593, que mantém
a posição em que se encontrava
já implantado assinalando a reentrância do adro que prolonga o
corpo da igreja, e um banco em mármore lioz branco, agora desenhado,
que, corrido em toda a extensão do terreiro — uma linha recortada
contra o granito que a envolve —, na sua horizontalidade, sublinha
o esforço vertical da peça quinhentista.
Concretizando
a abertura de novas ligações pedonais entre a cidade alta e a zona
da ribeira de Couros, propôs-se no topo sudoeste do terreiro a
execução de uma escada que articula três níveis: Couros, São
Francisco e Alameda. Muito discretamente implanta- da, sem perturbar
a espacialidade do terreiro, permite no entanto singulares leituras
ao facultar, a partir do passeio da Alameda, um enfiamento
anteriormente inexistente sobre o interior da Zona de Couros e, no
sentido inverso, uma nova perspectiva da fachada do corpo barroco do
convento.
*Conjunto
dos finais do século XIII e edificado originalmente junto à muralha
do burgo medieval, foi deslocado por ordem real na centúria
seguinte, tendo em vista o desatravancamento da muralha.
Maria Manuel Oliveira, “(re) Desenhar no
coração da cidade: o Projecto de Reabilitação Urbana da Praça do
Toural, da Alameda de São Dâmaso e da Rua de Santo António, em
Guimarães”, in Monumentos (publicação
electrónica), Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana,
IP, Lisboa, 2013, pp. 128-129.
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