Catarina de Bragança, 1638-1705. |
31 de Agosto de 1661
Os ministros, Câmara, gente da governança, etc., acordaram aceitar a
carta de El-rei de 19 de Julho deste ano em que manda dobrar a sisa por tempo
de dois anos, para dote de casamento de sua irmã, a infanta D. Catarina com seu
primo El-rei da Grã Bretanha, de cuja aliança virão grandes bens ao reino. A
Câmara escreveu neste mesmo dia a El-rei e ao Conde de Prado relatando-lhes a
resolução tomada. El-rei escreveu em 8 de Outubro, agradecendo.
(João Lopes de Faria, Efemérides
Vimaranenses, manuscrito da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, vol.
III, p. 191)
Em Agosto de 1661, Portugal continuava envolvido num conflito com Espanha
que parecia não ter fim, que sangrava os recursos das gentes, chamadas a
contribuir para o esforço da guerra. Aos habitantes dos concelhos, o exército demandava
homens, armas, cavalos, bestas e carga, provisões, palha, carros para
transporte. E o rei pedia donativos
em dinheiro e lançava impostos, que mandava aceitar sem réplica, que era
para acudir à defensão do reino. Não obstante estar sujeita a tamanho
esforço para sustentar a guerra, a população do reino era chamada a
comparticipar em outros negócios da coroa.
Aclamado rei de Portugal, D. João IV procurou alianças externas que permitissem
dar solidez e sustentabilidade à independência de Portugal e a melhor forma de
lhes dar solidez seria através do estabelecimento de laços com outras casas
reais europeias, por via de casamentos dos seus filhos com príncipes estrangeiros.
Assim aconteceu com a infanta D. Catarina, Princesa da Beira (título concedido
à filha mais velha do rei, que recebeu depois da morte da sua irmã Joana). Catarina
Henriqueta de Bragança tinha acabado de completar dois anos quando o seu pai
foi aclamado rei de Portugal restaurado. Ainda criança, começaram as
negociações diplomáticas com outras casas reais. D. João de Áustria, bastardo
de Filipe IV de Espanha, e o duque de Beufort, neto bastardo do rei Henrique IV
de França, foram os primeiros candidatos, que acabariam descartados. Esteve
para ser consorte do Rei-Sol. As negociações com o cardeal Mazarino estiveram
muito avançadas, mas Luís XIV de França acabaria por casar com a infanta
espanhola Maria Teresa de Áustria. Após a morte de D. João IV, a regência seria
assegurada, na menoridade do príncipe Afonso, pela sua mãe, Luísa de Gusmão,
que tratou de negociar o seu casamento com Carlos II de Inglaterra
As negociações chegariam a bom termo. Em Junho de 1661 foi ratificado o Tratado de Casamento do rei Carlos II, do
Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda com D. Catarina de Portugal. O enlace
aconteceria em Portsmouth, a 21 de Maio do ano seguinte. O dote de casamento de
Catarina era de tal ordem que não tinha comparação com qualquer outro até aí
conhecido: incluía, além de outras minudências,
meio milhão de libras esterlinas e as possessões portuguesas de Tânger e de
Bombaim, que teriam um papel fundamental na construção do império britânico em
África e na Índia.
Para pagar o meio milhão de libras do dote, o rei, o seu irmão D. Afonso VI,
mandou que, durante dois anos, a sisa fosse cobrada em dobrado. No dia 21 de Agosto
de 1661, as autoridades locais vimaranenses decidiram aceitar aquela imposição,
porque da aliança com o rei de Inglaterra viriam grandes bens ao reino.
Os anos em que Catarina de Bragança de Bragança foi rainha de Inglaterra
(até à morte de Carlos II, em Fevereiro de 1686), não foram especialmente
felizes. Por ser católica, o que impediu a sua coroação, e por nunca ter dado
um herdeiro ao rei, foi mal-amada pelos seus súbditos. Na corte, havia quem a escarnecesse
da sua figura, dizendo-a pouco dotada, no que respeitava ao físico e ao
intelecto. Chegou a haver quem a pretendesse acusar de traição, por
envolvimento numa suposta conspiração para devolver a Inglaterra ao catolicismo.
Ao rei, chegou a ser sugerido que se divorciasse de Catarina de Bragança, para
casar com quem lhe desse um sucessor. Porém, Carlos II não comungava dessas
opiniões, considerando-a uma boa esposa e uma conselheira e confidente e um suporte
fundamental na sua acção política.
No princípio de 1693, Catarina de Bragança, viúva de Carlos II de
Inglaterra, regressou a Portugal, onde ainda viria a ter um papel de relevo
junto do seu irmão, o rei D. Pedro II, que sucedera a Afonso VI, chegando a
assumir a regência do reino, em alturas em que o rei estava impedido, por estar
doente ou na guerra. Morreu em Lisboa, no último dia do ano de 1705.
A portuguesa que foi rainha de Inglaterra nunca caiu nas boas graças dos
ingleses. No entanto, muito lhe deve a Inglaterra. Deve-lhe o hábito de tomar chá,
o doce de laranja (a marmalade, cujo
nome deriva da portuguesíssima marmelada), o uso da porcelana, a generalização
do emprego das especiarias, o sabor das tangerinas,o fumo do tabaco e as boas maneiras à mesa.
Foi Catarina de Bragança que ensinou os patrícios do conde de Sandwich (o
comandante da armada que a levara à Inglaterra, em 1662) a comer de faca e
garfo.
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