Primeira página do número especial jornal Independente, publicado no dia 17 de Julho de 1906, aquando de uma das visita de D. Carlos a Guimarães |
13 de Agosto de 1907
Terça-feira.- El-rei D.
Carlos, acompanhado pelo conde de S. Lourenço, camarista e oficial-mor efectivo
da casa real, D. Tomás de Melo Breyner, médico da real câmara, e António
Ferreira Pinto Basto, oficial às ordens de El-rei, visitou esta cidade onde
chegou às 6 horas e 40 minutos da tarde, vindo em automóvel pela estrada de
Fafe, hospedando-se em casa do Conde de Margaride, deu recepção, sendo-lhe
lidas algumas mensagens, durante a qual trocaram as bandas de infantaria 8 e 10
e mais 4 bandas paisanas, jantou - às 8 horas principiou o banquete de 30
talheres-, e depois viu, das janelas, desfilar a marcha aux flambeaux - saiu da estação dos bombeiros às 9 e 30 -,
organizada pelos empregados do comércio, que poucos dias antes lhe tinha sido
decretado descanso semanal, bombeiros voluntários e empregados superiores da
fábrica da Avenida, no dia seguinte, às 8 e meia da manhã seguiu pela mesma
estrada para Amarante. NB : Visitou Guimarães, mas não visitou Nossa Senhora da
Oliveira; não seguiu os exemplos dos reis seus antecessores, por isso não podia
ter, como não teve, bom fim. J. L. de F.
(João Lopes de Faria, Efemérides
Vimaranenses, manuscrito da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, vol. III,
p. 144 v)
Na noite de 28 de
Setembro de 1863, foram lançadas no Toural três girândolas de foguetes,
repicaram os sinos de todas as torres da cidade, ao mesmo tempo que uma banda
de música percorria as ruas de Guimarães. Anunciava-se que, nesse dia, nascera
em Lisboa Carlos Fernando Luís Maria Vítor Miguel Rafael Gabriel Gonzaga Xavier
Francisco de Assis José Simão, que seria, simplesmente, D. Carlos, o penúltimo
rei de Portugal. As celebrações prolongaram-se até ao dia 3 de Outubro.
Repetiram-se no dia de baptismo do príncipe, a 19 de Outubro.
O príncipe real seria
novamente motivo para festa em Guimarães aquando do seu casamento com Amélia de
Orleães, bisneta do último rei de França. Guimarães fez-se representar pelo
presidente e pelo vice-presidente da Câmara, pelo seu deputado, João Franco e
por Francisco Agra, além de muitos vimaranenses que foram para Lisboa para
assistirem aos festejos públicos. Na noite do casamento, a 22 de Maio de 1886,
houve luminárias nos edifícios públicos e em muitas casas particulares, a banda
do 20 de infantaria tocou em frente ao quartel, onde os oficiais fizeram subir
alguns balões festivos. Como de costume, as celebrações repetiram-se nos três
dias seguintes.
Entronizado em Outubro
de 1889, enquanto rei D. Carlos visitou Guimarães pela primeira vez no dia 29
de Novembro de 1891. Com ele vinham a rainha D. Amélia e João Franco, então
Ministro das Obras Públicas. Inaugurou o seminário de Nossa Senhora da
Oliveira, na Praça de S. Tiago, visitou a Sociedade Martins Sarmento, os
Bombeiros e o Quartel. Enquanto o rei estava no Quartel, no paço dos Duques, a
rainha visitou o hospital da Misericórdia. Como doutras vezes, o palacete do
Conde de Margaride foi, nesse dia, o Paço Real, onde foi servido um jantar de
trinta talheres, com a seguinte ementa (em francês, como mandava a etiqueta),
servida em baixela de prata (os reis tiveram direito a talheres de ouro):
Consomme á la royale. Petits pâtés
aux huîtres. Poisson au gratin. Filet de bœuf piqué á la jardinière. Salmis de
perdreaux aux champignonne. Galantine de dinde au principe royal. Foie gras en bellevue.
Punch á la reine. Paon au cresson. Asperges sauce hollandais. Bread pudding.
Gelé au marasquin. Nougat. Fruits divers et fromage. Vins: Collares, Bordeaux, Sauterne,
Chateau Margeau, Porto, Madeira, Xerez, Champagne, etc.; café el liqueurs.
A comitiva de D. Carlos saiu para Braga às
onze da noite.
D. Carlos regressaria a
Guimarães 17 de Julho de 1906. Estava de passagem para as termas de Pedras Salgadas.
Chegou de comboio pouco depois das 9 horas, tendo sido acompanhado desde a
estação de Vizela pelas autoridades civis, militares, judiciais e religiosas.
Na estação de Guimarães foi recebido com foguetes e com o 20 de Infantaria a
encarregar-se da guarda de honra. Almoçou no seu Paço em Guimarães, o palacete
do Conde de Margaride. Desta vez, a ementa foi:
Consommé á la Margaride, saumon
de Caminha á la Portugaise, grenade de veau á la ville de Guimarães, côtelette
de perdreaux á la purée Soubise, pâtés de foi-gras á la Bellevue, langouste nationale
sauce rémoulade, dindonneaux rôti au cresson, petits pois á l’Anglaise, savarin
á l’ananas, bavarois á la Chantilly, glace aux fraises e á la vanille, gelée Macédoine
au marasquin, pyramides de gâteau breton, pâtisserie assortie, Vins: Xeres,
Porto 1815 et Champagne; Café; Thé; Liqueurs.
Baixela de prata,
talheres de ouro para o rei, toda a outro serviço de louça da Índia, muito antiga.
O almoço foi acompanhado
pela banda do 20 de infantaria, que tocou no pátio da casa.
No fim do almoço, o rei assistiu
da varanda a uma grande manifestação aguardava-o uma multidão e mais sete
bandas de música. Agradeceu e partiu de automóvel, às duas horas da tarde, em
direcção a Fafe.
D. Carlos regressaria a
Guimarães uma última vez, no dia 13 de Agosto do ano seguinte. Chegou de carro,
ao final da tarde, vindo dos lados de Fafe, no regresso das termas de Pedras
Salgadas. A chegada foi anunciada por repiques dos sinos e girandolas de
foguetes. A comitiva real era composta pelo conde de S.
Lourenço, camarista e oficial-mor efectivo da casa real, Tomás de Mello
Breyner, médico do rei, e António Ferreira Pinto Basto, oficial às ordens do rei Era aguardado por uma grande multidão na
rua Serpa Pinto, seguindo para o palacete do Conde de Margaride, no largo
Martins Sarmento. A recebê-lo, estavam as bandas militares do 8 e do 10 de
infantaria, além de quatro bandas paisanas.
Depois do beija-mão, foi servido um banquete, que
esteve a cargo da confeitaria Oliveira, do Porto. Eis a ementa:
Consommé á la Reine; Fritures de
foie-gras i l’italienne; Turbot crème à la piémontaise; Cœur de filet de bœuf á
la Diplomate; Petits pâles de perdreaux à la Bellevue; Chaud-froid de homard à
la portugaise; Punch à l'impérial; Dindonneaux piqués à la broché; Asperges
sauce crème; Fromages divers.
Dessert: Pudding au Sabayon; Glaces
aux fraises et a la vanille; Gelée macédoine au Marasquin;
Coupe en nougat aux fruits; Pâtisserie
mêlée glace; café, thé et liqueurs.
Vins: Madère, Medoc, Vert-Margaride,
Collares-blanc et rouge; Campagne, Mumm & C-ª, Xerés et Porto 1815.
Findo o jantar, o rei
assistiu da varanda a uma marcha aux
flambeaux, organizada pelos empregados do comércio, pelos bombeiros voluntários
e pelos empregados superiores da
fábrica avenida.
Quando o rei partiu, às
oito e meia da manhã, três bandas de música executaram o hino da Carta
Constitucional e ouviram-se vivas ao rei e à família real.
Quando, menos de meio
ano depois, chegava a Guimarães se soube do regicídio, a notícia, como escreveu João Lopes de Faria na efeméride do dia 2
de Fevereiro de 1908, em todos, com
pequeníssimas excepções, causou tristeza, consternação, saudade e indignação.
Provavelmente para alguns, como para o próprio João Lopes, a notícia não terá
sido de todo inesperada. À efeméride em que registou a visita de a Guimarães de
D. Carlos em 1907, acrescentou uma nota:
Visitou Guimarães, mas
não visitou Nossa Senhora da Oliveira; não seguiu os exemplos dos reis seus
antecessores, por isso não podia ter, como não teve, bom fim.
Está explicado o regicídio.
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