Personagens e outros temas, por António Gama Brandão, Guimarães, 2013 |
António Gama Brandão é um
prestigiado médico pediatra, responsável pela criação do Serviço de Pediatria
do Hospital de Guimarães. Mas é também um cidadão atento, um homem de cultura e
um humanista que não se demite da esperança num Mundo melhor e mais justo.
Homem de muitas leituras e de muitas viagens, partilha a sua mundividência
através da escrita. Conhecíamos-lhe dois livros (Santos Simões, um líder carismático e Vultos e Questões). Acaba de lançar um terceiro, Personagens e outros temas, onde reúne
um conjunto de textos sobre figuras contemporâneas marcantes, a que se segue
uma série de textos com reflexões sobre os mais diversos temas de natureza
científica (com destaque para os que dedica à criança), política, social, além
de impressões de viagem. Ao todo, são mais de oito dezenas de textos, abordando
múltiplas temáticas, que se estendem ao longo de mais de trezentas páginas que
se lêem com prazer e proveito.
O prefácio é assinado pelo seu
condiscípulo Levi Guerra, professor catedrático jubilado da Faculdade de Medicina
da Universidade do Porto, que encontrou as palavras certas para descrever esta
obra:
É um livro que, no seu ecletismo,
revela a grandeza humana do autor e oferece-se como uma relíquia de sabedoria
que se frui com encantamento quando as suas páginas se percorrem e
repetidamente se volta a lê-las, tão densas são de conteúdo, de implícito enriquecimento
pessoal e de lúcidas normas de proceder e de pensar.
Uma leitura que se recomenda.
A propósito do livro de António
Gama Brandão que acaba de ser lançado, recordo que, em 2005, o autor me honrou
com o convite para prefaciar o seu livro Santos
Simões, um líder carismático, em que publicou um importante conjunto de
textos sobre Santos Simões. Partilho aqui o texto que então escrevi:
A existência faz-se de encontros.
Encontros com outros, com lugares, com ideias. Esta obra testemunha o encontro
de dois homens na terra que ambos adoptaram e amaram como sua e as causas que partilharam.
Joaquim António Santos Simões e
António Augusto Gama Brandão encontraram-se em Guimarães, vai para meio século.
Um pedagogo distinto e um jovem pediatra. Das afinidades que os aproximaram, há
uma que se sobrepõe às restantes: a preocupação com as crianças em tempos que,
sendo difíceis para todos, eram particularmente amargos para aqueles a quem era
negado o direito à meninice.
No conjunto de textos agora
coligidos, Gama Brandão retrata, com traços impressivos e afectuosos, o perfil
de Santos Simões: espírito inconformista, dotado de uma permanente inquietude e
de uma resistência de estóico, trabalhador incansável, referência moral,
cultural e política para várias gerações.
Por onde passou, Santos Simões deixou
o rasto permanente da sua obra.
Em Guimarães, ele passou por todo
o lado. O Círculo de Arte e Recreio e o Teatro de Ensaio Raul Brandão, o
Cineclube, a antiga Biblioteca Calouste Gulbenkian, a Escola Francisco de
Holanda, o Convívio e os Jogos Florais Minho-Galaicos, a Sociedade Musical de
Guimarães, o Magistério, a Universidade do Minho, o Infantário Nuno Simões, o Notícias de Guimarães ,
o Povo de Guimarães, a Cercigui, a Assembleia
Municipal, a Sociedade Martins
Sarmento , a democracia, a liberdade, a cultura, têm, em
Guimarães, a sua impressão digital.
A vida de Santos Simões é um
paradigma de honradez, rectidão e coerência. Viveu e morreu de acordo com as
suas convicções, pelas quais sempre se bateu. Mesmo quando a sua voz se
levantava sozinha, rompia o silêncio e era escutada com respeito, até por
aqueles que pensavam de maneira diferente da sua.
Ao lado de outros companheiros,
acompanhei Santos Simões à frente dos destinos da Sociedade Martins Sarmento
desde 1990 até ao último dia da sua vida. Testemunhei a sua dimensão humana, a
sua inteligência, o seu génio criativo, a sua aversão à preguiça, a sua obstinação
em vencer bloqueios, a sua vontade férrea de ver a obra realizada, a sua
impaciência perante as respostas que tardavam, a sua imensa capacidade de
trabalho, o entusiasmo com que se envolvia em cada nova tarefa, mesmo quando a
doença, impiedosa, já o minava por dentro. Testemunhei como resistiu até ao
último dia: senti a alegria com que, pela última vez, foi a uma escola primária
cumprir uma missão de sempre (despertar nas crianças o interesse pela
matemática), pressenti a emoção com que recebeu a notícia de que o seu nome
iria ser dado a uma Escola Secundária de Guimarães (a ele, a quem um dia um
poder estúpido e discricionário proibiu de ensinar em escolas públicas).
Tudo isso testemunhei, mas vejo
que só agora serei capaz de avaliar a verdadeira dimensão da sua presença à
frente daquela Instituição centenária, ao descobrir o quanto hoje nos faz
falta.
O autor dos textos agora
reunidos, Gama Brandão, é um médico que nunca se confinou ao espaço da bata
branca, do estetoscópio e da sala de consultas. Como Santos Simões, tem olhos
de ver o mundo, uma sólida cultura humanista e uma marcada preocupação social.
Cidadão atento, acompanhou de perto ou observou de longe, conforme os momentos
e as circunstâncias, o percurso de Santos Simões em Guimarães. Os textos
que publicou entre 1989 e 2004, relidos hoje, evocam a presença viva de Santos
Simões e convocam a memória da nossa cidade nas últimas décadas do século XX e
nos primeiros anos do século XXI.
Por tudo isso, merece o nosso
reconhecimento.
Guimarães, 20 de Março de 2005
António
Amaro das Neves
In António Gama
Brandão, Santos Simões, um líder
carismático, Guimarães, 2005
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