As poesias de António Lobo de Carvalho (11)


Ao Duque do Cadaval, que oferecia um quarto na sua casa ao autor.



Se eu fora, excelso Duque, homem perito,
Capinha, ferrador, cabeleireiro,
De cães decurião, ou cozinheiro,
Em sopas mestre, em massas erudito:

Se em letra antiga lesse o que anda escrito
De vosso grande avô João Primeiro,
Que à gótica mostrasse ao mau caseiro
Que o tombo velho nunca está prescrito:

Neste caso, senhor, a vossa graça
Mais quisera alcançar, que ter mil burras
Do metal louro, que se ri da traça:

Mas como a sorte me tem dado surras.
Não vou servir-vos, só por não ter praça
No livro mestre dos santões caturras.


Neste poema António Lobo de Carvalho dirige-se com manifesta insolência ao poderoso Duque do Cadaval, Nuno Álvares Pereira de Melo, uma das principais figuras da Restauração de 1640, recusando a oferta de alojamento, a troco de serviços, em casa do Duque. A que se diz, este soneto terá “rendido” ao Lobo quatro semanas na cadeia do Limoeiro.

O seguinte soneto, cujo autor se ignora, é uma resposta ao do Lobo que vai acima:

Grande Duque se algum Autor perito
Qual Voltaire, Boileau, Garção, Monteiro
Ou outro cujo nome o mundo inteiro
Respeitasse por homem erudito.

Se outro qualquer lesse o que anda escrito
Do grande Nuno, de João primeiro,
Vos censurasse a vós, e ao mau caseiro
Que o Tombo velho imaginou prescrito.

Neste caso, Senhor, seria graça
Perdoar ao censor, e de mil burras
Franquear-lhe o metal, que se ri da traça.

Mas o Lobo merece duas surras,
Uma por tolo, outra por ter praça
No Livro Mestre dos Santões caturras.

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