S. Nicolau |
O autor do pregão de 1868 foi
o primeiro escrito por Joaquim Pinto de Sousa Macário (o segundo, seria o de
1911, escrito em Lamego, onde vivia na condição de general reformado). Foi
recitado por Carlos de Castro de Araújo Abreu.
No jornal Religião e Pátria
de 9 de Dezembro de 1868, dá-se notícia das folias dos estudantes de Guimarães
no dia 5 de Dezembro daquele ano:
No dia 5 de manhã aparecem
já na rua alguns máscaras, notando-se um que cavalgava em mazelento burro, mas
que recitava um chistoso aranzel tendente a dispor os ânimos para receber o
bando que de tarde devia sair anunciando a festa do dia seguinte. Saiu este com
efeito, recitado por um académico, e
acompanhado por mais alguns, que se mostravam em carros, cabendo as honras do barulho em tambores aos
estudantes de menos idade.
Bando Escolástico
RECITADO NO DIA 5 DE
DEZEMBRO DE 1808
POR
CARLOS DE CASTRO ARAÚJO
ABREU
I
Damas
de Guimarães vinde às janelas;
Casadas
inda moças – e donzelas
Ouvir
qual nunca ouvistes o programa
Da
festa que amanhã aqui nos chama.
– Vinde
ouvir o garboso pregoeiro,
Que
é dentre os estudantes o primeiro
Primeiro,
em vos prestar culto gracioso
Em
estilo jucundo e mui chistoso!
Culto
também de amor qual Deus Cupido
Se
em vós puder achar peito rendido.
– Amanhã,
amanhã ressurge o dia
Para
nós há muitos anos de folia;
É
festa em Guimarães de antiga usança,
E
grata a muita gente à magra pança,
Amanhã
– como nunca – há-de ser bela;
De
ditos, de chalaças e de trela;
De
trelas – alto lá... digo de tretas,
De
danças, de gaifonas e de petas.
– Não
menos o será de petisqueiras
Que
os janotas trarão nas algibeiras,
Não
faltarão maçãs, nozes e passas,
Castanhas,
e também com estas chalaças,
De
amores uma carta misturada;
Já
vedes minhas dandis que isto agrada;
– Pois
bem, mal que amanheça preparai-vos
Nas
janelas depois apresentai-vos
Cada
qual mais coquett; mais risonha,
Alguma
que tiver má carantonha,
Ou
sendo então já velhas mui ronceiras.
Essas
só se admitem nas trapeiras;
Porque
de Nicolau no fausto dia,
Os
rapazes só querem ter folia
E
chalaça gastar com as elegantes
Que
apreço saibam dar aos estudantes.
Das
feias, das velhotas essas – tricas,
Que
se guardem para a festa dos futricas,
Que
entra nós e os futricas há diferença
Mas
uma distinção pasmosa! imensa.
Mas
não é isto o que hoje aqui me chama
Escutem!...
Oiçam lá meu programa!
II
Cavalgando
em jumentos orelhudos,
Vós
vereis, homens magros e pançudos,
Fazendo
mil gaifonas como entrudos!
Uns
a falarem muito e outros mudos
Com
largos papelões fingindo escudos!
Uns,
de nariz comprido e carrancudos!
Já
alguns de calva à mira, outros lanzudos!
Entrarem
pelo lado do Toural,
Seguidos
de uma banda marcial!
Tocando
o hino alegre e festival
Que
aos filhos de Minerva é natural!
E
ali, junto ao pinheiro – pedestal,
Onde
se apoia a Deusa sem igual
Todos
culto te prestam perenal!
Como
nunca se viu em Portugal!
Um
culto tão pomposo e triunfal!
– Depois
da cerimónia tão pomposa,
Esta
caterva alegre e majestosa
Às
ruas seguirá!!... oh!... festa honrosa!...
A
s damas – qual mais bela e mais formosa,
Em
vez de em sátira má, vos darem tosa,
Dar-vos-ão
alecrim, jasmim e rosa;
– Também
não faltarão pomos corados
Das
lanças pelas pontas espetados!
Que
vos serão por mimos ofertados!
Também
recebereis papéis dobrados
Onde
juras tereis dos namorados!
Porém,
se algum dos pais desconfiados
Disser
– (vendo o papel) “O que será?!...
Dizei-lhe
logo assim “nada papá.
É
branco este papel, é só tem cá,
Um
A., um M., um O., R.! Que dirá?!...
O
pai que tal batata engolirá,
Logo
mais descansado ficará,
E
diz: – “Nada, filhinha – guarda-o lá.
– Assim
a mocidade ira folgando
Amorosas
conquistas enlaçando!
E
os pais desconfiados cudilhando!
– Também
se faz saber hoje aos futricas,
Que
escusam de vir lá com as suas nicas;
Que
não se atreva algum cheirando a breu
Vir
cá fazer figura de judeu;
Porque
se em tal se metem por seu mal,
Irão
nadar ao tanque do Toural;
Isto,
só é para a os filhos da ciência,
Meus
amiguinhos, tenham paciência.
– Enfim,
minhas senhoras, este ano,
Se
no cálculo que faço não me engano
Há-de
tudo correr com pompa e fama,
Salvo
se eu vos mentir no meu programa.
Joaquim P. de S. Macário
0 Comentários