O
pregão de 1857 foi o primeiro escrito por J. F. Mendes de Abreu. Foi recitado
por Jacinto de Sousa Dias. No jornal A
Tesoura de Guimarães, descreve-se como decorreu o acto em que se anunciava a festa dos
estudantes de Guimarães a S. Nicolau, que teria lugar no dia seguinte, 6 de
Dezembro:
O
pregão anunciador do festejo ia vistoso e magnífico. A figura de Camões seguida
daquelas que representavam as faculdades da Universidade de Coimbra, mostravam
o apreço que as ciências e a literatura dão ao nosso primeiro poeta. – Se
haviam de alterar o programa, deviam também mudar a hora da saída, porque em
muitas partes deixou ele de ser ouvido, e quando mesmo o Pregoeiro tivesse
peito de bronze, e não se achasse tão incomodado, com se achou, só altas horas
da noite poderia terminar, satisfazendo aos desejos de todos.
A Tesoura de Guimarães,
n.º 129, Guimarães, 11 de Dezembro de 1857
BANDO
ESCOLÁSTICO RECITADO 5 DE DEXEMBRO DE 1857.
POR
Jacinto
de Sousa Dias.
Pátria
de Afonso, surge, flor mimosa,
Vem,
de galas vestida, vem donosa,
Que
breve despontar a encantadora
Do
sexto de Dezembro vai aurora,
Que
já na alma venturas mil inspira
À
tenra juventude que a suspira:
Que
espera mimos ter entre folgares,
E
dum ano esquecer duros penares.
Que
festivo assomando ao teu desperto,
Tornará
de prazer embriagado,
O
coração de saudade torturado,
Do
jovem terno, ao ver que prazenteira
A
dama esperando-o está rindo fagueira,
Que
prestes antevê doce momento...
No
peito lhe esvoaça o sentimento!...
Anelando
soltar meigo sorriso,
Quando
o pomo recebe lindo e liso;
Que
já parece o coração prender-lhe,
Aquele
que homenagem vem render-lhe,
Neste
dia sem par, dia de amores,
Que
sempre traz alívio às nossas dores…
Sim,
formosas, de longe já sabeis,
Que
vós sinceras amanhã podeis,
Sem
temer coibida a liberdade,
Do
jovem compensar alta amizade;
Dele
tomando o nacarado pomo,
Rival
em mimo à flor do cinamomo.
Mas
não penses, futrica arrebicado,
Amanhã
pôr-te do estudante ao lado;
Misturar-ta,
qual gralha, entre pavões,
E
roubar-lhe devidos galardões:
Não
penses!... E ai de ti!... se ousado intentas
Por
brincadeira, só, cobrir as ventas!...
De
ser valente vai perdendo a fé,
Que
levas muito soco e pontapé,
Té
que no tanque do Toural, molhado
Vás
ser, qual duro bacalhau, salgado;
Isso
reserva lá para outras eras,
Quando
então fugurar possas deveras,
Em
progresso a falar... forte mania!...
Da
época é um delírio; que hoje em dia,
O
progresso real e verdadeiro,
Consiste
em títulos, honras; é dinheiro.
Também,
se diz ser do progresso a moda
Saia,
balão, trajar de imensa roda,
Que
faz, por não espanar luzida bola,
À
parede arrimar qualquer Janota.
Formosas,
o balão, estupendo gosto!
Mostrai
ser à modéstia vício oposto;
Que
sendo vós no mundo sem rivais,
Orgulhosas
não sois, mas liberais.
À
criada de sala permiti,
Livre,
senhora, e confiada em si,
Debruçar-se
a janela, e, sem receio,
Ter
possa de maçãs um saco cheio.
Talvez
haja ratão, que por chalaça,
Lhe
queira, só, fazer tamanha graça.
E
dai à cozinheira permissão,
Depois
de bem lavada e com sabão,
Que
o rosto mostre lindo e mui luzido,
Natural
ou de tintas colorido,
Que
não julgada moça de cozinha,
Vá
chuchando a maçã mais coradinha.
Sede
com elas, sede, generosas!
E
em compensar serviços primorosas,
Indo
amanhã humildes implorar
Soneto,
que o mama só pode dar:
Bem
vedes que por causa dos amores
Às
vezes lhes deveis altos favores!...
Vós,
filhos de Minerva, cuja glória
À
posteridade passará na história,
Os
ecos do tambor altissonante
Fazei
reproduzir com mão possante,
Que
retumbem no espaço em tom profundo,
E
vão festivos indicar ao mundo =
=
Que a festa, d’amanhã, dos estudantes
Pomposa
ela vai ser mais que era d’antes.
J.
F. M. de Abreu
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