14 de Abril de 1928
Sábado. Apareceu coberta de
crepes a estátua de D. Afonso Henriques, tendo junto um dístico com a legenda “Inditosa
pátria que tais filhos tens…” houve largos comentários. Isto foi porque, na
reunião de ontem às 9 horas da noite, não apareceram os representantes da
Câmara Municipal, da Sociedade Martins Sarmento e da Associação Comercial e
Industrial de Guimarães que faziam parte da Grande Comissão do 8º Centenário da
Batalha de S. Mamede; os presentes membros resolveram, por unanimidade,
considerar dissolvida a grande comissão.
(João Lopes de Faria, Efemérides Vimaranenses,
manuscrito da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, vol. II, p. 35)
O dia 24 de Junho é o dia mais
solene de Guimarães, aquele em que se assinala a primeira tarde portuguesa, acontecida em terras vimaranenses no dia
de S. João do ano de 1128. Todavia, a comemoração da batalha de S. Mamede é
muito mais recente do que aquilo que muitos pensam. A primeira vez aconteceu quando Guimarães resolveu assinalar o oitavo centenário daquele
recontro fundador. Até aí aceitava-se como inquestionável que Portugal nascera
mais tarde, na sequência de outra batalha travada pelas hostes de Afonso
Henriques, a de Ourique. No entanto, a preparação dos festejos seria atribulada. Depois de, numa
primeira reunião, realizada na Sociedade Martins Sarmento, no dia 12 de Abril
de 1928, a que compareceram quase todas as entidades oficiais, foi designada
uma comissão para organizar as celebrações, de que faziam parte a Câmara
Municipal, o Comando Militar, a Sociedade Martins Sarmento, o Arcipreste, a Associação
Comercial e Industrial de Guimarães, o Reitor do Liceu Nacional de Martins
Sarmento, o Director da Estação dos CTT, a Escola Industrial de Francisco de
Holanda, a Sociedade de Defesa e Propaganda de Guimarães, o presidente da
Academia Vimaranense, o Sindicato Agrícola de Guimarães, o lnspector Primário, a
Associação Artística Vimaranense, a Associação dos Empregados de Comércio, um representante
dos Alunos da Escola Industrial de Francisco de Holanda, a Comissão do Núcleo
de Scouts e, pela Imprensa, o padre
Gaspar Roriz. Ficou marcada a primeira reunião desta Comissão para o dia seguinte,
na ACIG.
Na reunião do dia 12, o
ambiente era, segundo o jornal A Velha
Guarda, “um tanto pesado”, com cochichares
e confidências, verdadeiras ou
mentirosas, trocadas a meia voz antes da abertura da sessão. Apesar do
consenso alargado que a constituição da comissão então criada parecia evidenciar, a
realidade era de dissensão, ficando no ar a dúvida sobre a participação nas
celebrações das entidades oficiais. A dissensão tinha, manifestamente, natureza
política.
A reunião do dia 13
confirmaria os receios que alguns avançavam. As três entidades mais relevantes
do Concelho, a Câmara Municipal, a Sociedade Martins Sarmento e a Associação Comercial e
Industrial da Guimarães estiveram ausentes. Posto isto, os que compareceram decidiram dissolver a
comissão. As celebrações do centenário pareciam inviabilizadas.
No dia seguinte, 14 de Abril,
o monumento de D. Afonso Henriques apareceu coberto de luto, e, junto dele, um
lamento numa inscrição adaptada de Camões (“Inditosa Pátria que tais filhos
tens…”).
As divergências
seriam ultrapassadas e a Batalha de S. Mamede teria, pela primeira vez,
celebração condigna em Guimarães.
Porém, ainda não seria nesse ano que o 24 de
Junho seria dia de festa em Guimarães. A batalha foi festejada de véspera, a
23, e as grandes manifestações públicas só aconteceriam nos dia 7 e 8 de Julho.
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