O bispo S. Nicolau |
Não há
notícias das festas dos estudantes de Guimarães a S. Nicolau no ano de 1830.
Viviam-se
tempos turbulentos em Portugal. Em Dezembro de 1831, ainda na vigência da
usurpação miguelista, já D. Pedro, depois de abdicar a favor do seu filho do
título de Imperador do Brasil, andava entre a Europa e os Açores, a reunir
apoios para organizar o exército com que iria resgatar a coroa de Portugal para
a sua filha, D. Maria I, o pregão é, mais uma vez, um texto escrito por um indefectível
de D. Miguel (um Deus nos enviou um rei mais justo / já assombrado respeita o
mundo inteiro / mimoso dom dos céus, Miguel primeiro). O estudante também estaria, segundo o
autor do pregão, do lado do usurpador: arma-se por seu rei, é
voluntário.
O bando
escolástico de 1834 foi escrito pelo Padre Francisco José Vieira de Faria e recitado
por António Joaquim de Almeida Gouveia. Pelo estilo e pelo conteúdo, é parente
dos pregões de 1828 e 1829, sendo provável que o Padre Francisco Faria, também conhecido por Padre Francisco da Bornaria, também
tenha sido o seu autor.
Este pregão
segue um modelo que se vai consolidando. Nos seus 84 versos não faltam as
referências a Lísia, ao caixeiro, aos banhos forçados no tanque do chafariz do
Toural. Mais uma vez, a distribuição do produto da renda de Urgezes seguiria o critério da
graciosidade das beneficiadas: a maçã será prémio da beleza ou simpatia; as nozes
serão, por compaixão, para as feias; as castanhas, serão guardadas
para as velhas gaiteiras, arrebitadas.
Bando escolástico – 1831
Já retumbam
os ecos de alegria,
Tornou Lísia
a ver a luz do dia.
Ò sacro
Nicolau, intercedendo,
Fizeste
dissipar negrume horrendo.
Por vós do
sólio seu, imenso, augusto,
Um Deus nos
enviou um rei mais justo.
Já
assombrado respeita o mundo inteiro
Mimoso dom
dos céus, Miguel primeiro.
Que nome!
Eis glória nunca ouvida,
Por vós
ainda é pouco dar a vida.
Eis de vós e
do altar sustem a sorte
Heróis que
sabem triunfar da morte;
E fique a
eternizar vossa memória
Da fama a
chama, e o clarão da história.
Ímpios, que
ser haveis orgulhosos,
Já na ruína
das nações ser venturosos,
Pasmai de
ver a lusa juventude
Sólida
ciência unir com a virtude.
Quem pode
hoje ombrear com o estudante
Do oráculo
da luz tão radiante?
E sem faltar
ao ministério literário
Arma-se por
seu rei, é voluntário.
Grosseira,
ignorante, vil canalha,
Pensáveis
conosco ter igualha?
Se contigo
antipatizo, audaz caixeiro,
Não cuides
esquecer-me no tinteiro.
Quero por
compaixão desenganar-te:
Sem do sábio
Pereira dar a Arte,
Ao som da
estrondosa palmatória,
Deste dia
não há jus à glória.
Se algum Milord de descarado papo,
Deixando da
semana o velho trapo,
Desses que
estrelas vêem ao meio-dia,
Só para no
dia santo ter folia,
Em paga de
meter de taralhão
Na malha
cair, na nossa mão,
No tanque do
Toural tem fresco banho
Para lhe
refrescar calor tamanho.
Respeitar-nos
pois sempre é mais seguro.
Na renda
seja tudo do mais puro.
Não pense o
tal calouro que nos manga;
Vê-lo-eis
abaixar a nariganga,
O bandulho
tremer, bater o queixo.
Se pró fim,
lindas madamas, eu vos deixo
Vós sois desta
função remate e coroa;
Função, que
das funções abate a proa;
Mas posso
dispensar despesa vossa
Se o afecto
for todo em honra nossa.
Pouparei-vos
janelas damascadas
Pois
convosco serão mais bem ornadas.
Por pintadas
e brilhantes luminárias
Volvam dos
olhos as meninas várias.
Por foguetes
de lágrimas ou respostas
Travaremos
conversas bem dispostas.
Por fingidas
águas de repuxo
Aparecei
todas de apurado luxo.
Se entre
espinhos mais brilha a linda rosa
Entre as
feias brilhará a mais formosa.
E como os
gostos sejam relativos
Vós, feias,
também tendes atractivos.
Pôde o rosto
ser lavrado, e a cor baga,
E a boca
suavizar ternura e graça.
A maçã,
mimosa prenda deste dia,
Será prémio
da beleza ou simpatia.
Por
compaixão as feias terão nozes
Se às nossas
responderem suas vozes.
Às velhas
gaiteiras, arrebitadas,
Atirem-se-lhes
castanhas às manadas.
O chiste com
que a mãe mais se regala
É ver que
para a filha é dia de gala.
E não há
migalhinha mais do goto
Dum pai, que
outrora foi garoto.
Casquilhos,
sentido... olá... cautela!
Amanhã nem
deitar olhos paar a janela.
Regosijos,
festejos e agrados,
São o fim
dos estudantes mascarados.
E quem da
proposta paz quebrar os laços
Num instante
é feito em pedaços.
Mãos, que só
mereceis colher flores,
Rufai com
alegria nos tambores,
Para que dê
eco em todo o mundo
Este o mais
fausto dia, o mais jucundo,
Elevando da
glória ao alto cume
O modelo dos
reis, o pai, o nume.
FIM
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