Pregões a S. Nicolau (15): 1845



S. Nicolau, da cidade belga que tem o seu nome (Sint-Niklaas)
O pregão do ano de 1845 foi escrito por João Machado de Melo, futuro visconde de Pindela. Por entre variantes que glosavam o modelo habitual do bando escolástico, anuncia-se a festa do dia seguinte, que traria novidades (Vereis jovens dançar dança à chinesa / Com garbo, com asseio e gentileza: / Vereis uns cavalgar corcéis formosos, / Fazer outros, com ditos mui chistosos, / Que o velho mais ginja e rabugento / Mostrará o maior contentamento; / Finalmente vereis sábia Minerva / Nas festas tomar parte sem reserva.)
A festa iria ter mascaradas, um carro de Minerva e uma dança chinesa. No entanto, no dia 6 de Dezembro nada mais houve além das mascaradas. Nesse dia, a chuva caiu torrencial sobre Guimarães.O que estava programado para este dia seria adiado para dia 9 de Dezembro, tendo-lhe então sido acrescentada uma outra folia, na forma de uma dança de pescadores.
O pregão foi recitado por Inácio Luís Pereira do Lago, que regressava à função que já tinha desempenhado em 1842 e 1844.

Bando escolástico -1845

Guimarães, Guimarães, pátria adorada,
Nos fastos de Ulisseia decantada,
Que viste o grande Afonso em ti nascer,
Esse herói, que depois se fez temer
Dos filhos do Alcorão, do Muçulmano,
Fazendo o que não fez herói humano;
Exulta, ò Guimarães, raiou o dia
Em que és todo prazer, todo alegria,
Dia de Nicolau, que nos segura,
Que volveu para nós toda a ventura.
Tudo, tudo amanhã será festejo,
Qual ainda não viu o Douro, o Tejo,
Vereis jovens dançar dança à chinesa
Com garbo, com asseio e gentileza:
Vereis uns cavalgar corcéis formosos,
Fazer outros, com ditos mui chistosos,
Que o velho mais ginja e rabugento
Mostrará o maior contentamento;
Finalmente vereis sábia Minerva
Nas festas tomar parte sem reserva.
E tu, ò preguiçoso, ò passeante,
Quererás ombrear com o estudante,
Sem as noites passar sobre um Virgílio,
Tito Lívio, Horácio, ou Ovídio,
E sem esfolhear (dever mofino)
Volumosa Prosódia, ou Calepino?
Julgarás ter direito ao folguedo,
Que só de tarde lida é prémio ledo?
Um conselho te dou: mete-te em casa,
E para tempo passar assa na brasa
Castanhas, que não é tão mau recreio,
Bebendo-lhe também a rego cheio;
Quando não, entre apupos e alarido
No tanque do Toural vais ser metido.
E vós, ò belas, que num só sorriso
As delícias mostrais do paraíso,
Vós, esmalte sem par da natureza,
Rivais da mãe de amor na gentileza,
Que dos olhos lançais áureos farpões,
Que vem todos cravar nos corações,
Aparecei amanhã para que o estudante
Possa livre avistar a sua amante;
Então linda maçã da cor da rosa
Ele te irá depor na mão nervosa,
E se um riso voar aos lábios vossos
Felizes tornareis os dias nossos.
À criada de sala aperaltada,
Em segredo de amor experimentada,
Só isto lhe dareis para que ela
Se possa debruçar numa janela.
À besuntada e imunda cozinheira,
Deixai-a espreitar lá da trapeira,
Embora no avental esconda a mão,
Que para bem se lavar não há sabão.
Todas elas terão sua oferta
Conforme o sentimento, que desperta.
Castanhas se darão às muito feias
E nozes às que forem centopeias.
E vós, filhos de Minerva airosa,
Da pátria a flor esperançosa,
Rufai Nesse tambor, toque o zabumba
Eco forte, que o monte, o vale retumba,
Que vá o som, levado por Éolo,
A festa anunciar de pólo a pólo.
FIM

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