João de Meira estava
profundamente ligado às Festas dos Estudantes de Guimarães a S. Nicolau.
Enquanto estudante participou nas festas, enquanto poeta escreveu os pregões de
1903, 1904 e 1905, enquanto investigador, foi um estudioso da história da festa.
Além do mais, terá sido ele quem a baptizou, no pregão de 1904, de festa nicolina.
Além dos pregões, é autor de
outros textos poéticos dedicados às Nicolinas, como aquele que se segue:
Contraste (1)
Para as senhoras de Guimarães
Diz o bom espanhol Ribadaneyra
Que Nicolau foi bispo antigamente,
Quando Roma oprimia a terra inteira,
Numa triste cidade do Oriente;
Que passou uma vida bem singela
Tendo a virtude por divisa e mote,
Atirando o seu oiro, pela janela,
Às virgens pobres que não tinham dote;
Escondendo de todos, cuidadoso,
As dádivas imensas que fazia,
Que até o mesmo pobre venturoso
Quem lhe dera ventura não sabia…
Como somos diversos do santinho
Nós que agora dizemos festejai-o!
Como foge do seu este caminho,
Que nós hoje trilhámos com regalo!
Nicolino, alta noite, às escondidas
Presentes de valor distribuía,
E nós as nossas dádivas perdidas
Vimos trazê-las pela luz do dia.
Ele, pois que o movia a Caridade,
Somente contemplava as pobrezinhas,
E nós, pelas ruas da cidade,
Somos volúveis como ventoinhas.
Às senhoras ideais de loira trança,
De ondeante perfil, de graça alada
E um tão meigo sorriso de criança
Que recordam figuras de balada,
Às moreninhas de cabelo preto
E olhar mais negro do que a mesma
treva,
Que nos seduz como o que é justo e
recto
E como o que é doçura nos enleva,
Às ruivas de madeixas cor do fogo
E olhar azul como um tranquilo mar,
Às de trança castanha, aonde logo
Se conhece a modéstia a trasbordar,
A todas entregamos a maçã
Que rubra como é bem simboliza
Um pedaço arrancado ao coração,
E sobre o qual o sangue inda desliza.
Se Nicolau viesse neste dia
Cuidava-nos uns doidos sem juízo,
E ao ver as maçãs recordaria
A primeira traição do Paraíso,
Perdoa Nicolau, ò doce encanto
Se como tu nós nunca procedemos!...
Fizeste ofertas porque foste santo,
E nós, porque o não somos, as fazemos.
J. de Meira.
(1) A poesia que
segue, composta para umas festas de Guimarães, só em Guimarães pode ter
compreendida, e eu tê-la-ia deixado na folha volante em que foi espalhada se
não quisesse corrigi-la de uns tristes erros com que saiu por desgraça minha e
dela...
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